Energia e os desafios do novo titular do MMA 22/05/2008
- Claudio J. D. Sales*
A saída da ministra Marina Silva da liderança do Ministério do Meio Ambiente (MMA) foi lamentada por muitos. À frente de sua pasta, a ministra elaborou planos para a proteção das florestas e dos recursos hídricos, definiu prazos para as etapas de licenciamento ambiental, investiu em treinamento dos servidores e deu transparência aos processos de licenciamento, disponibilizando-os na internet e permitindo seu acompanhamento por qualquer cidadão. São avanços que precisam ser mantidos e aprimorados.
Diante dessa herança positiva, aumenta a responsabilidade do novo ministro do Meio Ambiente perante os desafios que temos para desenvolver a economia do nosso país sem abrir mão do rigor na proteção do meio ambiente e do respeito ao ser humano.
No que tange ao setor elétrico e às necessidades de sua expansão, precisamos fugir da falsa polarização ¨energia versus meio ambiente¨. A produção de energia não pode ser vista como um problema, e sim como solução, social e ambiental. Temos, como dizia a ministra Marina, de buscar o ¨como fazer¨, evitando o ¨fazer a qualquer custo¨.
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Os recursos naturais disponíveis devem ser usados (ou não) pela sociedade com sabedoria. Uma usina de geração de energia elétrica, se construída corretamente, embora provoque impactos no meio ambiente, melhora a qualidade de vida da população do entorno, promove educação ambiental, preserva áreas em parques, aumenta a geração de renda da região e viabiliza estudos arqueológicos e históricos que simplesmente não existiriam sem o financiamento provisionado nesses projetos.
Atualmente, temos três problemas envolvendo o licenciamento ambiental de empreendimentos energéticos: prazos ainda injustificadamente longos, aumento indevido dos custos ambientais e interferências indevidas nos processos.
O início do licenciamento é muito demorado. Citando apenas um entre vários exemplos, a concessão do Termo de Referência (documento que define o que o Estudo de Impacto Ambiental deve conter), que deveria levar 30 dias, levou 394 dias, de acordo com levantamento feito pelo Banco Mundial, em 66 empreendimentos. Ou seja, atraso de um ano.
Outra constatação do estudo que chama a atenção: do prazo médio total de 2.335 dias necessários para pôr uma usina em operação (contados a partir do dia em que o empreendedor protocola o primeiro documento exigido pelo órgão ambiental), 1.235 dias são consumidos até que se emita a licença de instalação que permite o início da construção. O tempo médio para execução das obras foi de 1.100 dias. Em outras palavras, as fases iniciais de licenciamento consomem mais tempo do que a construção em si.
Os custos ambientais, que na década passada representavam 10% do valor de uma usina de geração de energia elétrica, atualmente variam entre 15% e 20%, sendo 2,2% (segundo o mesmo estudo do Banco Mundial) explicados por incertezas regulatórias provocadas por atrasos no licenciamento. Além disso, distorções fazem com que usinas mais caras, porém licenciadas, sejam construídas antes de usinas mais baratas cujas licenças ambientais estão atrasadas. Esta ineficiência, em teoria perfeitamente administrável, tem um resultado perverso: o aumento do preço da energia para o consumidor.
Importante esclarecer que ninguém tem o direito de pressionar o Ministério do Meio Ambiente nem de exigir o ¨sim¨ para as licenças ambientais. Mas, em contrapartida, o Brasil tem todo o direito de exigir, rapidamente, o ¨não¨, que deve ser acompanhado dos motivos que fundamentaram a resposta negativa. As recentes declarações do novo ministro sobre ¨rigor ambiental com rapidez nos processos¨ refletem sensibilidade e eficiência, valores essenciais para um gestor público que, a rigor, será peça-chave em todas as decisões de investimento e expansão que o País demandará, não só no setor elétrico, mas também no de óleo, gás, transportes, etc.
A equipe do Ministério do Meio Ambiente também terá de trabalhar muito para evitar que os custos de geração de energia (incluídos os devidos custos sociais e ambientais, que precisam ser sempre considerados quando se planeja uma usina) não cresçam por incertezas e interferências artificiais.
Uma grande parte das incertezas poderia ser reduzida com a regulamentação do artigo 23 da Constituição federal, que, se levada a efeito, atenuará a atual indefinição sobre competência para o licenciamento (União, Estados ou municípios). Essa indefinição consome muito tempo e conduz à chamada judicialização dos processos, fenômeno que não gera nenhum valor para a sociedade.
Interferências artificiais são aquelas produzidas por profissionais especializados em conflitos, que criam dificuldades para vender facilidades, em busca de vantagens econômicas, políticas ou ideológicas, mas escondidos atrás de bandeiras ¨sociais¨ e ¨ambientais¨. O ministro dará uma contribuição inestimável ao País se trabalhar pelo diálogo direto entre empreendedores, órgãos licenciadores e populações afetadas pela construção de usinas, ignorando os atravessadores que sobrevivem da eternidade do problema (e não de sua solução).
É importante para o Brasil que o novo chefe da pasta do Meio Ambiente recomende à sua equipe maior atenção aos prazos do licenciamento, reforce mecanismos de transparência dos processos, dê prioridade às ações necessárias no Congresso Nacional e elimine os atravessadores, viabilizando, com isso, tarifas de energia mais baixas.
Desejo sucesso à gestão do novo ministro e espero que seu trabalho seja conduzido com base no princípio da convivência harmônica entre desenvolvimento, energia e meio ambiente.
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*Claudio J. D. Sales é presidente do Instituto Acende Brasil, entidade que promove a transparência e a sustentabilidade no setor elétrico brasileiro