O lado ¨chato¨ de Ingrid Betancourt 04/07/2008
- Gilles Lapouge - O Estado de S.Paulo
A França, mais do que qualquer outro país, empenhou-se para livrar Ingrid Betancourt do calvário. Essa era uma ¨causa sagrada¨ para os dirigentes e a população francesa. A ¨divina surpresa¨ da noite de quarta-feira foi recebida com entusiasmo.
A chegada da família Betancourt ao Palácio do Eliseu, onde Sarkozy mostrava sua imensa satisfação, abraçando todo mundo incessantemente, provocou uma torrente de lágrimas. Sarkozy estava radiante. Felicitou Alvaro Uribe. ¨Ao presidente Uribe, eu digo ¨bravo!¨ do fundo do coração¨. No entanto, os dois países jamais seguiram a mesma estratégia: a França privilegiava a diplomacia enquanto que Alvaro Uribe preferia o recurso militar.
Para Alvaro Uribe, o próprio principio das conversações com as Farc já era uma renúncia. Por isso, as famílias dos reféns, especialmente a de Ingrid, suplicavam para ele não implicar o exército, temendo que as Farc pudessem se vingar com um banho de sangue.
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O presidente colombiano era mal visto em Paris, alguém mais interessado em triunfos guerreiros e não com preocupações humanitárias. Era considerado um político cínico, cruel, indiferente, a soldo dos americanos. E se ressaltava as suas relações com os grupos paramilitares de extrema-direita, tão pouco recomendáveis quanto as Farc, e que levaram à prisão 30 parlamentares da maioria colombiana suspeitos de manter relações com as milícias.
Amor e ódio
A família de Ingrid, tanto seu primeiro marido, o diplomata francês Fabrice Delloye, como seus pais, execravam Uribe. Yolanda Pulecio chegou a declarar: ¨Eu o odeio...tenho mais confiança nas Farc do que no presidente colombiano¨. A outra via, privilegiada pela França, depois por Chávez e alguns outros, não conseguiu se opor à façanha de Uribe. Paris, no entanto, não poupou esforços.
E isso bem antes de Sarkozy, que fez mais estardalhaço do que nenhum outro, mas seguiu a orientação da diplomacia francesa. Jacques Chirac já tinha aberto o caminho, sobretudo um político próximo do ex-presidente, Dominique de Villepin, que foi mais tarde primeiro-ministro.
Dominique de Villepin era um diplomata, e foi nessa condição que conheceu Ingrid. E essa amizade ocasionou um episódio burlesco: em julho de 2003, Villepin, então ministro das relações exteriores, teve uma idéia: um avião militar francês repleto de soldados, diplomatas, medicamentos e médicos aterrissaria em Manaus; o plano era retirar Ingrid da selva e traze-la triunfalmente a Paris.
Apoio
Inclusive a ex-senadora e ex-candidata a presidente Ingrid Betancourt, declarou-se ontem a favor de o presidente Álvaro Uribe ter a chance de disputar uma terceira eleição. Num dia em que as atenções do país e do mundo estiveram concentradas na mais famosa refém da Colômbia, Ingrid fez também um apelo aos presidentes da Venezuela, Hugo Chávez, e do Equador, Rafael Correa, para que ajudem Uribe a obter a libertação dos 26 reféns ainda sob poder da guerrilha.
¨Terceira reeleição? Por que não?¨, perguntou Ingrid, durante entrevista coletiva na embaixada da França em Bogotá. ¨Parece-me interessante. Não quer dizer que eu vá votar em Uribe. Pode surgir um candidato com mais sensibilidade social, para mim um tema essencial.¨
Ingrid, que viveu até 1989 na França, cujo parlamentarismo permite aos presidentes reeleger-se indefinidamente, arrematou: ¨Gosto da reeleição, de os países terem a possibilidade de eleger um rumo e segui-lo por vários anos.¨ Ingrid, que na véspera havia dito que poderia ¨servir a Colômbia¨ como presidente, afirmou que não sabe se sairá candidata.