Referendo não resolve problemas do país, dizem analistas 11/08/2008
- Márcia Carmo - BBC
O referendo revogatório na Bolívia e a aparente ratificação do presidente, Evo Morales, não resolvem os problemas que dividem o país, sugerem analistas ouvidos pela BBC Brasil.
Os resultados preliminares indicam que Morales obteve amplo apoio na região andina, mas o mesmo não aconteceu no leste do país.
De acordo com o analista político Gonzalo Chávez, professor da Universidade Católica Boliviana, com sede em La Paz, a votação confirmou, uma vez mais, a divisão política e social na Bolívia.
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¨O país está dividido entre os que querem inclusão social e os que querem autonomia. É preciso encontrar um denominador comum, com inclusão e autonomia¨, disse Chávez, por telefone, à BBCBrasil.
¨Agora os políticos é que devem se entender. Os bolivianos já deram seu voto e mais de uma vez¨.
Para ele, o primeiro passo para o entendimento deveria ser um ¨pacto fiscal¨ com a melhor distribuição dos recursos gerados pelos hidrocarbonetos – a Bolívia possui a segunda maior reserva de gás da América Latina, mas é um dos países mais pobres da região.
Já para o analista político José Luis Galvez, do Instituto Equipos Mori, o referendo ¨não resolve os problemas do país¨ e é ¨difícil¨ imaginar o diálogo entre governo e oposição.
Recursos
A disputa política envolve espaço por poder de decisão e os recursos gerados por este setor. Os prefeitos (equivalentes a governadores) da oposição anunciaram, domingo, que vão manter a greve de fome, iniciada na semana passada.
O protesto é para que o governo restitua às prefeituras 30% de um imposto petroleiro cortado para financiar um benefício mensal de US$28 (R$45) aos maiores de 60 anos.
Por sua vez, no estatuto de autonomia política e financeira aprovado em Santa Cruz, a previsão é de que a região passe a administrar os recursos gerados pelos hidrocarbonetos.
Neste ano, os departamentos de Santa Cruz, Tarija, Beni e Pando – região conhecida como ¨meia lua¨ - votaram pela autonomia política e financeira do governo central.
Santa Cruz, rica em soja e petróleo, e Tarija, rica em gás, são as principais geradoras de renda do país. Por isso, os prefeitos argumentam que deveriam ter direito a mais recursos.
No referendo de domingo, os quatro prefeitos opositores da ¨meia lua¨ teriam sido ratificados nos postos, segundo pesquisas de opinião.
Morales
O governo central argumenta que a riqueza é ¨de todos os bolivianos¨ e o gás, costuma dizer Morales, deve contribuir para reduzir a pobreza. Os maiores índices de pobreza estão na região onde vive a maioria indígena que o apóia.
O líder boliviano também planeja que seu governo tenha maior ingerência sobre os recursos petroleiros, como prevê a nova constituição – que ainda precisa ser ratificada.
No domingo, Morales disse que adotará medidas para implementar a nova carta magna – um dos motivos de discórdia entre governo e oposição.
¨Morales vai tentar fazer isso e vai gerar ainda mais confusão¨, disse Gonzalo Chávez.
¨Ele estará defendendo a constituição por um lado e os prefeitos da oposição defendendo a autonomia por outro¨, afirmou.
Os prefeitos da ¨meia lua¨ reiteraram, domingo, após a votação, que Morales teria sido ¨revogado¨ nessa região. Esse cenário de disputas torna o diálogo pouco provável, reiterou Galvez, do instituto Equipos Mori.
¨O cenário do diálogo e da reconciliação é um desejo de todos, mas esse é o cenário menos provável¨, disse. ¨A polarização é tão grande que é difícil imaginar esse diálogo¨.
Desde que Morales assumiu o poder, em 2006, os bolivianos votaram para eleger os constituintes em todo país e a região da ¨meia lua¨ realizou eleições pela autonomia.