Para baratear o alimento 19/10/2008
- O Estado de S.Paulo
Se os governos estaduais abrissem mão da cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na venda de alimentos, a população disporia de mais R$ 11 bilhões para injetar na economia, o que estimularia ainda mais a produção e, em algum tempo, resultaria em ganhos adicionais de arrecadação para os Estados. Este é um dos argumentos que a Fiesp arrola para propor a eliminação do ICMS sobre os alimentos. Para fundamentar a proposta, a Fiesp encomendou à Fundação Getúlio Vargas (FGV) Projetos um estudo que compara a tributação dos alimentos no Brasil com a de outros países, com resultados claramente desfavoráveis para nós.
O momento para propor a redução de impostos, porém, parece inadequado. A crise financeira, que provocou a desaceleração da economia global e até a recessão em alguns países industrializados, afetará a arrecadação dos três níveis de governo no Brasil, o que os tornará ainda mais resistentes a qualquer mudança no regime tributário que resulte em diminuição de receita.
Mas o coordenador da FGV Projetos, Fernando Garcia, não acredita que isso venha a impedir a discussão do tema, pois não se pensa na desoneração imediata dos impostos sobre os alimentos, mas numa redução gradual e com mecanismos de compensação para os Estados, que seriam mais afetados do que o governo federal. Para ele, a discussão é oportuna justamente porque a desoneração reduziria a pressão dos alimentos sobre a inflação.
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A tributação tem peso muito grande no preço dos alimentos. O estudo da FGV mostra que, no Brasil, se paga muito mais imposto sobre os alimentos do que nos países ricos. Em média, a carga tributária brasileira é de 16,9% sobre a base de arrecadação dos alimentos, que é seu valor adicionado. Se considerado o preço final dos alimentos pagos pelo consumidor, os impostos representam 12,2%. É um peso exagerado, se comparado com o dos Estados Unidos, de 0,7% do preço final, ou da Europa, de 5,1%.
Como as regras de cobrança do ICMS são estabelecidas pelos Estados, em alguns se paga mais imposto sobre determinado alimento do que em outros. Em média, no Brasil, de cada R$ 10 que o consumidor paga para comprar feijão, R$ 1,20 é de impostos federais, estaduais e municipais. Sem o ICMS, a fatia de impostos se reduzira para R$ 0,50. O estudo calcula que a redução para zero da alíquota do ICMS, se repassada inteiramente para o consumidor, reduziria o preço final em até 7%.
Sem o ICMS sobre alimentos, a arrecadação dos Estados e das prefeituras (que têm direito a parte da receita do ICMS) cairia R$ 11 bilhões por ano. Mas, como observou o coordenador do estudo, ¨a redução de alíquotas elevaria a renda disponível das famílias, o que induz a um maior consumo de alimentos e bebidas e de outros bens e serviços, bem como um aumento da poupança e do investimento¨. Isso faria a economia crescer mais depressa e, de acordo com cálculos da FGV, resultaria num acréscimo do PIB de R$ 250 bilhões em dois anos, com o correspondente aumento da arrecadação fiscal.
A redução dos impostos sobre alimentos contribuiria, ainda, para aliviar um dos aspectos socialmente mais cruéis do sistema tributário brasileiro, que é o fato de as famílias de renda mais baixa pagarem proporcionalmente mais impostos sobre o consumo do que as famílias de renda alta. A tributação sobre alimentos, em particular, é fortemente regressiva, isto é, onera proporcionalmente mais quem ganha menos.
O estudo da FGV constatou que, nas famílias com renda mensal de até R$ 1 mil, os impostos arrecadados sobre os alimentos representam 3,1% de seu consumo total de bens e serviços. Já nas famílias com renda superior a R$ 32 mil, a fatia de impostos sobre alimentos representa apenas 0,9% de seu consumo total.
Com a eliminação do ICMS - que atualmente responde por 43,6% da carga tributária total sobre esse tipo de produto -, a fatia das despesas de consumo das famílias de baixa renda, que representa o pagamento de impostos sobre alimentos, seria reduzida para 1,2%.