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O OUTRO LADO DA NOTÍCIA

O clima ainda em compasso de espera
05/12/2008 - Washington Novaes*

Estas linhas são escritas ainda sob o impacto das notícias sobre o mais grave desastre climático em Santa Catarina, problemas da mesma ordem nos Estados do Espírito Santo e do Rio de Janeiro e com centenas de municípios do Nordeste em estado de emergência por causa da seca - no mesmo momento em que pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais, da Embrapa e da Fiocruz prevêem (Estado, 26/11) que as mudanças no clima nas próximas décadas podem agravar a situação no Semi-Árido, com perdas superiores a 60% nas áreas aptas para a agricultura em vários Estados. E tudo isso acontece no mesmo momento em que 192 países discutem em Poznan, na Polônia, caminhos para novo acordo que permita reduzir no mundo as emissões de gases que intensificam o efeito estufa.

Continua muito difícil. Mesmo dentro do bloco europeu, o mais favorável a compromissos obrigatórios de redução (pelo menos 20% até 2020), a própria Polônia, a Itália e alguns outros países acham difícil assumir compromissos agora, em meio à crise financeira. O Japão só quer assumir compromissos no ano que vem. O presidente do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) e Prêmio Nobel da Paz, Rajendra Pashauri, acha ¨espantoso¨ que os países industrializados em poucas semanas mobilizem trilhões de dólares para salvar instituições financeiras, quando não se consegue reunir algumas dezenas de bilhões de dólares anuais para resolver o problema da fome no mundo ou algumas centenas de bilhões para desenvolver tecnologias que reduzam emissões. Uma das razões está em que todos aguardam que mude o governo norte-americano para definir rumos: só à última hora, na conferência de Copenhague (dezembro de 2009), cada país vai abrir o jogo

Parece temerário. O IPCC considera indispensável baixar as emissões de poluentes em pelo menos 66% até 2050 para evitar que a temperatura suba mais que 2 graus. O relatório sobre efeitos do clima na economia, preparado pelo ex-economista chefe do Banco Mundial sir Nicholas Stern, concorda - e acha que temos menos de uma década para baixar as emissões em 80%, sob pena de enfrentarmos a mais grave recessão econômica da História, que poderá levar à perda de até 20% do produto mundial bruto (mais de US$ 10 trilhões). Diagnóstico divulgado em outubro pela insuspeita Agência Internacional de Energia é ainda mais contundente: não será possível conter a concentração de poluentes na atmosfera em 450 partes por milhão (ppm), será preciso muito esforço para ficar em 550 ppm - e com isso a temperatura planetária subirá pelo menos 3 graus Celsius, com efeitos ainda mais desastrosos. Mas se nada for feito ela poderá subir até 6 graus. Por enquanto, as emissões seguem subindo, por causa do aumento no consumo de energia, que será de 45% até 2030, gerada em 80% pela queima de combustíveis fósseis, principalmente nos países ¨em desenvolvimento¨, que passarão de 51% para 62% do consumo total. Para amenizar esse quadro seria preciso investir pelo menos US$ 4,3 trilhões em tecnologias e outros programas.


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O Brasil foi à Polônia, mais uma vez, sem compromisso de aceitar metas obrigatórias de redução das emissões, embora já esteja entre os cinco maiores emissores, principalmente por causa de mudanças no uso do solo, desmatamentos e queimadas, que respondem por 75% das emissões. Segundo o inventário oficial referente a 1994, nossas emissões totais eram de 1,03 bilhão de toneladas anuais. Novo inventário está prometido para este ano. Mas sir Nicholas Stern, em sua recente visita ao País, afirmou que nossas emissões estão entre 11 e 12 toneladas anuais por pessoa - o que significaria mais de 2 bilhões de toneladas/ano.

Nossa delegação levou a Poznan uma meta interna (não proposta de compromisso) de reduzir as emissões por desmatamento em 40% entre 2006 e 2010, calculados sobre a média do período 1996-2005, que foi de 19,5 mil km2; mais 30% entre 2010 e 2013; e outros 30% entre 2014 e 2017. Para tanto seria preciso baixar o desmatamento para 9,2 mil km2 em 2009 (em 2008 foi de 12 mil km2, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais; e em 20 anos nunca esteve abaixo de 11 mil km2). E se chegaria a 2017 com 5 mil km2 anuais de desmatamento. Até lá, como observou este jornal, teriam desaparecido (cumprida a meta) mais 70 mil km2, equivalentes aos Estados do Rio de Janeiro e Sergipe, juntos. Mas, diz o Ministério do Meio Ambiente, seriam reduzidas em 4,8 bilhões de toneladas as emissões por esse caminho (¨mais do que os países desenvolvidos¨). Em troca, o Brasil se candidataria a contribuições de outros países para um fundo destinado a criar sistemas de monitoramento, fiscalização e repressão do desmatamento ilegal (que está entre 80 e 90% do total).

A proposta do Plano Nacional de Mudanças Climáticas recebeu fortes críticas de cientistas e organizações ambientalistas, que a julgam insuficiente e até ¨uma forma de respaldar e legitimar um fato¨ - o desmatamento (Amigos da Terra); de ¨conviver com a ilegalidade até 2017¨ (Greenpeace); de ser ¨muito insuficiente¨ (Vitae Civilis); de não ter metas para redução do desmatamento no Cerrado (que está perdendo mais de 20 mil km2 por ano). Mas ela tem outros componentes: até 2020 plantar 3,5 milhões de hectares com pinus e eucalipto e 2 milhões de hectares com espécies nativas; trocar em dez anos 10 milhões de geladeiras por outras mais eficientes no consumo de energia; reduzir impostos sobre carros menos poluidores; aumentar o consumo de etanol combustível de 20,2 bilhões de litros anuais para 52 bilhões, em uma década; financiar a compra de equipamentos solares para residências - tudo como metas internas.

Por ora, no plano global vai-se continuar à espera das definições dos países industrializados, até Copenhague. No plano interno também será preciso esperar para ver no que dá.

...

Washington Novaes é jornalista
E-mail: wlrnovaes@uol.com.br


  

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