Combate à crise dá visibilidade a Dilma 03/02/2009
- Vera Rosa - O Estado de S.Paulo
Disposta a enfrentar nas ruas o teste da crise econômica para consolidar sua pré-candidatura à Presidência, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, adicionou um ingrediente político à dieta orçamentária da Esplanada. Dez quilos a menos, rosto esculpido pela plástica e esbanjando energia, Dilma já traçou duas estratégias para a entressafra eleitoral. Além de intensificar as viagens para se tornar mais conhecida, ela terá papel de destaque no anúncio dos investimentos que embalarão o pacote do governo para conter a crise.
Sob o pretexto de verificar o andamento das obras previstas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), a ministra aproveitará as excursões pelo Brasil para se aproximar da população, de olho em 2010.
Seguindo recomendação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ela vai "traduzir" o PAC para a vida real: a ideia é explicar na prática que investir em infraestrutura significa distribuir renda e gerar empregos.
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"Mas é só a Dilma que vai viajar? E o Serra?", pergunta, com uma pitada de ironia, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, numa referência ao governador José Serra, pré-candidato do PSDB à sucessão de Lula. Bem-humorado, Bernardo diz que petistas e tucanos vão até se reunir para acertar roteiros diferentes. "Estamos fazendo tratativas com a equipe do Serra para evitar a sobreposição de agendas", brinca ele.
Lula já começou a montar um núcleo de apoio, dentro do PT, para ajudar Dilma a ganhar musculatura política. Escalou para a tarefa os ex-prefeitos Marta Suplicy (São Paulo), João Paulo (Recife) e Fernando Pimentel (Belo Horizonte). Companheiro de Dilma no Comando de Libertação Nacional (Colina), organização de esquerda que desafiou a ditadura, Pimentel é, nesse trio, o mais próximo da ministra.
"O problema da Dilma é que, como ela nunca disputou eleição, não tem jogo de cintura política. E, pior, vai estrear logo no Maracanã", provoca o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), ao afirmar que Serra larga com vantagem sobre a chefe da Casa Civil pelo "recall" (lembrança) das eleições a que concorreu. "Que eu saiba, Serrinha paz e amor ainda não apareceu", devolve Paulo Bernardo. "E, como diria meu amigo petista Vladimir Palmeira, não vamos confundir jogo de cintura com teatro rebolado."
Alvo de fogo amigo no PT por muito tempo, a chefe da Casa Civil também dá sinais de que os tempos, agora, são de reconciliação. Há dois meses, por exemplo, ela contratou o ex-deputado gaúcho Estilac Xavier para chefiar a assessoria especial da Casa Civil. Xavier, seu amigo há três décadas, foi secretário de Obras de Porto Alegre durante oito anos, quatro deles quando o atual ministro da Justiça, Tarso Genro, era prefeito (1993-1996).
Tarso assumiu o papel de porta-voz da insatisfação petista com a escolha de Dilma para disputar a eleição de 2010. Chegou a afirmar que a ministra, ex-militante do PDT de Leonel Brizola, não tinha vínculo com o PT. Mas, preterido por Lula no testamento do Planalto, desistiu do confronto e hoje prepara sua candidatura ao governo do Rio Grande do Sul.
Com ótimo trânsito no PT, Estilac Xavier nega que sua função na Casa Civil tenha o objetivo de aproximar Dilma do partido. "Minha presença aqui não é derivada do trabalho político. Dilma me convidou por minha experiência em gestão pública, e não por outra coisa. É uma função técnica."
O cardápio de temas tratados por Dilma é o mais variado possível: do trem de alta velocidade ao comitê de energia nuclear; do saneamento básico às reservas do pré-sal. Na semana passada, ela precisou pôr fim até a queda-de-braço entre os ministros do Meio Ambiente, Carlos Minc, e da Agricultura, Reinhold Stephanes, que tinha como pano de fundo as mudanças no Código Florestal.
"Essa briga passou dos limites", esbravejou Lula, em conversa com Dilma. "Chame os dois e diga que não quero mais ler estocadas pelos jornais. Se continuar assim, prefiro ler a carta de demissão". Disciplinada, mas cautelosa, a chefe da Casa Civil ainda tentou pôr panos quentes no embate. "Mas posso falar isso mesmo?", indagou. Ele respondeu de pronto, sem pestanejar: "Pode. Assim mesmo."
Por determinação de Lula, a ministra também será, nos próximos dias, a estrela da cerimônia que vai lançar mais um programa de financiamento de casas populares. Destinado principalmente às famílias de baixa renda, o projeto prevê a construção de 1 milhão de moradias até 2010, ano da eleição presidencial. A medida é vista no Planalto como uma espécie de injeção social: estimula a compra de imóveis, faz a economia girar e reduz o desemprego. De quebra, o pacote habitacional conterá agrados à classe média.
FRASES
Paulo Bernardo - ministro do Planejamento:
"Mas é só a Dilma que vai viajar? E o Serra?"
Arthur Virgílio - líder do PSDB no Senado:
"O problema da Dilma é que, como ela nunca disputou eleição, não tem jogo de cintura política. E, pior, vai estrear logo no Maracanã"