Spread alto demais 06/02/2009
- O Estado de S.Paulo
Quando criticados por membros do governo pelo alto custo dos empréstimos no Brasil, dirigentes de bancos particulares costumam argumentar que, se fosse fácil reduzir os juros por decreto ou ato oficial, os bancos federais já teriam feito isso - e desafiam o governo a forçá-los a reduzir seus juros. O governo parece ter aceitado o desafio. Noticia-se que, por determinação do presidente Lula, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal iniciaram estudos urgentes para eliminar "gorduras" e cortar seu spread - a diferença entre o que cobram dos clientes nos empréstimos e o que pagam pelos recursos captados -, de modo a reduzir os juros de seus financiamentos.
O governo quer forçar os bancos privados a também baixar os juros de seus empréstimos. Há, na área econômica do governo, quem defenda até mesmo a publicação regular de uma classificação dos bancos de acordo com o spread que praticam para alertar os usuários - e inibir os bancos que ganham muito mais do que a média do setor.
Apesar das medidas tomadas pelo governo para reduzir os custos bancários, o crédito, além de escasso, está ainda mais caro do que já era. Como mostrou reportagem publicada há dias pelo Estado, os gastos da indústria com o pagamento mensal de juros aumentaram 17% no último trimestre de 2008, na comparação com o custo médio dos nove primeiros meses do ano. Normalmente, os gastos com juros são inferiores à folha mensal de salários (sem os encargos). De janeiro a setembro, para cada R$ 100 da folha, a indústria gastou R$ 95 com juros. Nos três últimos meses do ano, para o mesmo gasto com pessoal, a indústria pagou R$ 111 de juros.
PUBLICIDADE
Uma das causas apontadas pelo Banco Central (BC) para a elevação dos juros ou sua manutenção em níveis altíssimos é o aumento do spread, que propicia o aumento do lucro dos bancos, apesar da crise. Na tentativa de contestar o BC, a Febraban divulgou um estudo técnico cujos resultados, embora divirjam numericamente dos apresentados pelo governo, confirmam que o spread é muito alto e aumentou nos últimos meses, e que medidas de alívio para os bancos tomadas pelo governo não resultaram na queda dos juros para o tomador do empréstimo.
No fim do ano passado, o governo cortou de 3% para 1,5% a alíquota do IOF cobrado nos empréstimos para pessoas físicas, mas, entre novembro e dezembro, o spread nos empréstimos para pessoas físicas passou de 43,1 para 46,1 pontos porcentuais. De acordo com o BC, a redução de impostos fez crescer o lucro dos bancos. O BC lembrou que, quando a tributação subiu, como no início de 2008 - a alíquota do IOF aumentou de 1,5% para 3% e foi criada uma alíquota adicional de 0,38% para compensar o fim da CPMF -, os bancos elevaram imediatamente os juros cobrados de seus clientes. Não mostraram a mesma rapidez quando os impostos diminuíram. Os bancos ganharam também com o alívio da política monetária, diz o BC, pois a redução dos custos de captação observada nos dois últimos meses de 2008 não foi repassada para o público.
A Febraban procurou mostrar que, nos últimos anos, a tendência foi a de queda do spread, mas concordou que houve aumento nos últimos meses. De acordo com os bancos, porém, o aumento não foi do tamanho anunciado pelo BC e se deveu, entre outros fatores, à turbulência do mercado financeiro, que fez crescer o custo de captação de recursos.
A Febraban alega ainda que a inadimplência, um dos cinco componentes do spread, cresceu muito, embora esse crescimento ainda não apareça nas estatísticas. É preciso observar, porém, que o aumento da inadimplência não decorre apenas da crise, que afetou a renda de muitos tomadores de empréstimo. É também consequência da política de crédito menos rigorosa que os bancos adotaram até os efeitos da crise internacional chegarem ao Brasil para expandir suas operações. Exigiram menos garantias de seus clientes e ofereceram-lhes condições muito mais fáceis. O resultado não poderia ser diferente do que se observa hoje - mas disso os bancos não falam.