Relação entre Lula e Chávez beneficia comércio, mas referendo pode atrapalhar 15/02/2009
- José Henrique Lopes e Bruno Fuschini - Ansa
O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, passará neste domingo por uma prova de popularidade. O referendo de hoje pode acabar com o limite de reeleição e, na prática, estender de maneira indeterminada o governo de Chávez. O continuismo terá efeitos nas relações comerciais entre Brasil e Caracas, mas ainda não há consenso sobre como a mudança pode pesar sobre negócios e investimentos de empresas brasileiras na Venezuela.
O presidente da Federação de Câmaras de Comércio e Indústria Venezuela-Brasil, José Francisco Marcondes, ressalta o forte aumento experimentado pelo intercâmbio comercial entre os dois países nos últimos cinco anos, de 543%, e argumenta que, além de ser uma consequência do bom relacionamento entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Chávez, a crescente integração é um processo irreversível.
"É inegável que a boa relação entre os presidentes e os países afeta positivamente a balança [comercial], mas este é um processo que vem de anos anteriores, e é uma tendência dentro do processo de integração da América do Sul. Eu vejo a integração como um fato necessário e irreversível", diz.
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Já o professor Sergio Gil Marques dos Santos, do Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais da Universidade de São Paulo, considera que a continuidade de Chávez no poder e a centralização da gestão econômica do país em suas mãos podem deteriorar o ambiente para negócios na Venezuela.
"É perigoso para qualquer empresário que vá aportar um investimento grande a inexistência de regras claras, quando tudo depende apenas do humor do presidente. E ainda mais de um presidente que esteja repleto de poder", argumenta.
O especialista destaca as nacionalizações e confiscos de bens que Chávez já promoveu contra algumas empresas, e lembra que há o risco de que futuramente estas práticas se voltem contra o Brasil. Para ele, antes de decidir colocar dinheiro na Venezuela, o empresário precisa ter certeza de que está lidando com "um ambiente que oferece estabilidade econômica e segurança para investimentos".
Outro fator que pode complicar, na sua opinião, é a crise financeira, que atinge em cheio o país por meio da queda nos preços do petróleo.
Crescimento
Marcondes, por outro lado, descarta que este seja um entrave para as relações econômicas entre Brasil e Venezuela. Para este ano, ele prevê um incremento de 30% no intercâmbio comercial. "Não se trata de uma questão retórica. Nós temos projetos, dados e informações que nos levam a estes números de crescimento. Em 2011, podemos chegar a US$ 10 bilhões de comércio, transformando a relação Brasil Venezuela em uma das mais importantes na América do Sul", explica.
O presidente da Federação admite que, apesar de intensas, as trocas entre os dois países são desequilibradas, com forte superávit para o lado brasileiro.
Em 2008, segundo dados da entidade, o fluxo comercial entre os dois países chegou a US$ 5,68 bilhões, aumento de 12,21% em relação ao ano anterior. Deste total, no entanto, o Brasil exportou US$ 5,15 bilhões e importou apenas US$ 538,5 milhões, gerando um superávit de US$ 4,61 bilhões, o segundo maior do Brasil dentre os mercados com os quais faz negócios.
Para diminuir a diferença, Marcondes indica que os presidentes Lula e Chávez negociam acordos para que o Brasil passe a comprar mais da Venezuela. "Não há nenhum sentido em perpetuar uma relação desequilibrada. O equilíbrio vai surgir na medida em que haja uma integração maior entre empresas e cadeias produtivas", afirma.
Além disso, explica, outros dois fatores que podem auxiliar no balanceamento são a incorporação da Venezuela ao Mercosul, atualmente discutida pelo Senado brasileiro, e o aumento da cooperação na área de infraestrutura. Como exemplo, Marcondes cita o caso da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, uma parceria entre a estatal venezuelana PDVSA e a Petrobras.