A crise nos municípios 27/03/2009
- O Estado de S.Paulo
O presidente Lula pouco mais poderá fazer pelos prefeitos do que, como prometeu em Salvador na terça-feira, "olhar com carinho" para o problema financeiro que eles estão enfrentando por causa da redução dos valores que recebem da União por meio do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Esse fundo é formado por parte da arrecadação do Imposto de Renda (IR) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), que também estão caindo. Da mesma forma, cai a receita do ICMS, recolhido pelos Estados, que transferem para as prefeituras parte do que arrecadam. A crise não poupa nenhum nível de governo.
Já se acumulam, nos gabinetes de prefeitos, governadores e do presidente, problemas causados pela queda da receita. No caso dos municípios, os números impressionam. Com a queda da arrecadação do IPI e do IR nos dez primeiros dias do mês, o segundo repasse de março do FPM para as prefeituras foi de R$ 250 milhões, 19,3% menos do que o valor inicialmente previsto, de R$ 310 milhões.
A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) calcula que, entre o fim de dezembro e 20 de março, o valor repassado pelo governo federal para os municípios foi 7,5% menor do que o previsto. Em valores corrigidos, nos três primeiros meses de 2008 as prefeituras receberam R$ 13,6 bilhões; em 2009, até o fim de março, os repasses deverão totalizar R$ 11,9 bilhões, ou 12,5% menos.
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Também diminuiu o repasse do ICMS pelos Estados e cai a arrecadação do principal tributo municipal, o Imposto Sobre Serviços. "Os repasses do FPM vinham aumentando havia seis anos e despencaram, surpreendendo os prefeitos, que contavam com outro perfil da arrecadação e têm compromissos altos para honrar", disse ao Estado o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski.
Como os governos federal e estaduais, também as prefeituras precisam ajustar seus orçamentos. Mas, para muitas delas, a queda de receita está sendo muito rápida. Em ato de protesto contra a redução das transferências do FPM, várias prefeituras do Paraná fecharam suas portas, mantendo em operação apenas os serviços essenciais. É um sinal claro de que os prefeitos já mal se lembram da grande festa política organizada pelo governo em Brasília no início de fevereiro, para anunciar o que chamou de "pacote de bondades" para as prefeituras, mas cujo objetivo era mesmo criar um palanque para a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, que Lula quer transformar em candidata do PT a sua sucessão.
Para algumas prefeituras, fechar as portas é um ato simbólico de protesto. Para outras, entretanto, pode tornar-se uma necessidade. O problema é mais grave nos municípios menores, que mais dependem das transferências da União e dos Estados. Um estudo do BNDES, com base em dados de 2006, mostra que as prefeituras dos municípios com menos de 20 mil habitantes arrecadam diretamente apenas 5,4% das receitas que compõem seu orçamento. Todo o resto, ou praticamente 95%, é transferência, sendo 40,3% do FPM. Outras transferências federais são feitas para programas de saúde e educação e há também as transferências voluntárias.
Os prefeitos querem compensações pelas perdas, diz o presidente da Associação dos Municípios do Paraná, Moacyr Elias Fadel Júnior. No entanto, por mais "carinho" que o presidente da República dedique à reivindicação, é difícil descobrir meios pelos os quais o governo federal poderá oferecer as compensações pedidas. Tudo o que transferir adicionalmente para as prefeituras terá de resultar de cortes de outras despesas. O governo Lula, às voltas com seus próprios problemas fiscais, cortará gastos próprios para beneficiar prefeituras?
O ministro das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, reconhece a procedência do pedido e admite que, para aliviar a situação dos municípios, o governo poderá liberar as emendas ao Orçamento da União feitas pelos congressistas e que foram congeladas. Mas essas verbas são carimbadas, isto é, têm destinação própria e compulsória, e não resolverão o problema de caixa dos prefeitos.
A crise atinge a arrecadação tributária dos três níveis de governo e a hora é de contenção de gastos.