Apertar os cintos, sim 18/04/2009
- O Estado de S.Paulo
Elogiado nesta página na semana passada por ter dito a governadores e prefeitos reunidos em Montes Claros (MG) que, por causa da queda da arrecadação em todos os níveis de governo, é hora de "apertar os cintos", o presidente Luiz Inácio Lula da Silva parece ter-se arrependido do que disse. Na última terça-feira, durante visita à indústria de papel e celulose Klabin em Telêmaco Borba (PR), afirmou que "não há nenhuma razão para os prefeitos apertarem o cinto".
Agora, para Lula, a quebra da arrecadação tributária não exige mais o controle estrito das despesas, sobretudo os gastos de custeio e pessoal, de modo a preservar a capacidade de investimento do setor público, para melhorar e ampliar os serviços prestados à população. Os prefeitos podem continuar gastando como já faziam.
Afinal, é isso mesmo que o governo do PT faz, pois a falta de realismo é a marca de sua política fiscal. Apesar da crise, gasta-se cada vez mais no sustento da máquina e com o funcionalismo federal. Quando se examinam os números da execução orçamentária da União no primeiro trimestre tem-se a nítida impressão de que a economia brasileira nunca esteve tão bem como agora. Em plena crise, que desde novembro faz cair de maneira ininterrupta, em valores reais, a arrecadação federal, as despesas correntes da União - isto é, os gastos com o custeio da máquina e com o funcionalismo - crescem a um ritmo impressionante.
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Nos três primeiros meses do ano, as despesas correntes aumentaram 23,4% em relação a igual período do ano passado, de acordo com dados do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) publicados na quarta-feira pelo jornal O Globo. As despesas com pessoal foram as que mais cresceram (27%), por causa dos reajustes e benefícios concedidos generosamente pelo governo para diferentes carreiras do funcionalismo. Novos benefícios estão previstos para os próximos anos, ou seja, os gastos com pessoal continuarão a subir e a roubar espaço dos investimentos no Orçamento da União.
Nos três primeiros meses de 2009, os investimentos foram 11,7% maiores do que no período janeiro-março de 2008, mas, se a queda da arrecadação federal se mantiver por um período mais longo, o governo terá de cortá-los, pois não tem como reduzir gastos com pessoal ou com itens obrigatórios, como as aposentadorias do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e as transferências compulsórias para Estados e municípios.
Apesar da quebra da arrecadação - no primeiro trimestre, ela foi 0,6% menor em valores correntes e 6,02% menor em termos reais do que em igual período de 2008 -, o que limita sua capacidade de gastar, e por isso lhe exige mais austeridade na administração financeira, o governo Lula decidiu conceder R$ 1 bilhão aos municípios, a título de compensação pela redução das transferências através do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Com essa ajuda federal, os municípios poderão continuar gastando como se não houvesse crise - aliás, ao dizer que não precisam "apertar os cintos", o presidente os "autorizou" a agir desse modo.
É um modo de administrar que impõe custos pesados aos contribuintes. O mercado de trabalho formal (com carteira assinada) no País registrou uma redução de 57,6 mil empregados nos três primeiros meses do ano, mas o resultado teria sido muito pior se a administração pública, nos três níveis, não tivesse feito contratações. De janeiro a março, o número de novos funcionários públicos no Brasil chegou a praticamente 60 mil. É bom para as estatísticas do mercado de trabalho, mas é ruim para o bolso dos contribuintes, que sofrem os efeitos da crise, mas, ainda assim, terão de pagar os vencimentos dos novos servidores.
Se depender da sugestão de alguns técnicos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) - instituição do governo que já produziu importantes trabalhos para orientar a ação do setor público, mas hoje está sob controle do PT -, quanto mais grave for a crise, mais o emprego público deverá aumentar. Com base na estranha tese de que o emprego público deve servir de instrumento para contrabalançar os efeitos negativos da crise, esses técnicos sugerem a contratação intensa de funcionários. Não se preocuparam em saber de onde virá o dinheiro para isso.