Lula está preocupado com CPI e câmbio 24/05/2009
- Kennedy Alencar
Após viagem de mais de uma semana ao exterior, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou ao país e encontrou dois belos abacaxis para descascar: o real valorizado em relação ao dólar que dificulta exportações e a guerra entre PMDB e PT no Senado que pode atrapalhar os planos de controlar a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Petrobras.
Quem falou com o presidente ouviu que ele está preocupado com os dois abacaxis. Obviamente, o câmbio é um problema maior, por ser mais difícil de solucionar. Mas Lula não pode bobear com a CPI. O governo já experimentou o gosto de ver desandar uma investigação congressual que pensava controlar. Em final de mandato e numa hora de crise econômica, é coisa complicada.
Vamos por partes
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O Ministério da Fazenda e o Banco Central voltaram a se estranhar. O ministro Guido Mantega (Fazenda) disse com todas as letras que o câmbio era "preocupante" e que seria precisa reduzir juros. Foi ao ponto.
O Brasil ainda tem uma taxa básica de juros sideral se comparada à dos demais países. São 10,25% ao ano. Para o investidor estrangeiro, vale a pena trocar dólares por reais, aplicar no país e ganhar uns belos trocados. Como diz o economista Delfim Netto, o Brasil é o último peru com farofa no mundo.
O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e seus companheiros de instituição já ensaiam o discurso de que a culpa pelo câmbio valorizado não é só dos juros. Verdade. Mas o peso dos juros é, hoje, o fator predominante. Nosso BC já deu mostras seguidas de conservadorismo, não deverá perder dinheiro quem continuar acreditando nisso.
Lula vai arbitrar uma nova briga na equipe econômica. Ao mesmo tempo, cobrará da Fazenda medidas de incentivo ao setor exportador e de incremento do consumo. O real valorizado prejudica as exportações. O governo deverá adotar medidas pontuais para alguns setores, como a indústria de calçados, de tecidos e de frigoríficos. Deverá ser uma combinação de mais linhas de financiamento dos bancos oficiais com alguma redução de tributos.
Em relação ao consumo, Lula continua apostando no mercado interno como meio para minimizar os efeitos da crise econômica. Quer ver se encontra um jeito de o brasileiro consumir uma parte dos produtos que seria vendida ao exterior.
Renan x Mercadante
O principal problema do governo no Senado não é a CPI da Petrobras. É o desentendimento no Senado entre o PT e o PMDB, os dois maiores partidos que sustentam a administração Lula. O líderes Renan Calheiros (PMDB-AL) e Aloizio Mercadante (PT-SP) se odeiam.
Renan está magoado. Acredita que foi abandonado pelo PT e não digeriu ainda os petardos que levou quando o petista Tião Viana (AC) lançou sua candidatura à presidência do Senado. Viana e o PT foram derrotados por Renan e o PMDB, que elegeram José Sarney (AP) para o comando da Casa. Mas a batalha ressuscitou lembranças do episódio que levou Renan a renunciar à presidência do Senado em 2007.
O PMDB do Senado quer voltar a ter interlocução privilegiada com Lula. Quer negociar os planos eleitorais de seus caciques para 2010. Cobra do PT espaço em alianças futuras nos Estados.
No início da semana, o presidente vai se reunir com peemedebistas. Buscará apaziguar ânimos e garantir apoios futuros. Se tiver sucesso, crescerá a chance de o governo controlar a CPI da Petrobras.
Boxe federal
As CPIs sempre dão chance à oposição de desgastar o governo. Não é incorreta classificá-las de instrumentos de oposição. Como não é ilegítimo o governo tentar minimizar a CPI da Petrobras. Afinal, luta política é algo natural.
Mas as CPIs também podem ser instrumentos eficientes de investigação, de combate à corrupção. O país ganhou com muitas delas. Logo, governo e oposição cumprem cada um o seu papel.
Para o governo, CPI é sempre ruim. Algum controle é possível, como o governo mostrou nas CPIs dos cartões corporativos e na dos grampos. No entanto, nem sempre se segue o roteiro à risca.
Na CPI da Petrobras, o governo vê a chance de acuar politicamente a oposição, relembrando o carimbo de que o PSDB é defensor da privatização de modo geral e insinuando que desejaria vender a Petrobras em particular se tivesse apoio político para tanto.
É ruim uma CPI na qual a oposição já entra se defendendo. Nas dos cartões corporativos, havia um dossiê antitucano elaborado na Casa Civil a jogar o governo para o canto do ringue. Agora, o governo tem um discurso que talvez não seja suficiente para nocautear o PSDB, mas que talvez possa fazer a luta terminada empatada por pontos.