Quanto mais cresce a economia, mais depressa sobe a carga tributária brasileira. Essa relação entre aquecimento da economia e aumento do peso dos impostos sobre o que o País produz e consome ficou clara no ano passado, quando a carga tributária alcançou 35,8% do PIB, o nível mais alto da história. De 1995 até agora, apenas em dois anos a carga tributária registrou queda. A última vez que isso ocorreu foi em 2003. Isso quer dizer que, desde o segundo ano do governo Lula, o peso dos tributos sobre a economia vem aumentando de maneira ininterrupta. O aumento acumulado na Era Lula é de 3,8 pontos porcentuais.
A crise financeira mundial está afetando fortemente a economia brasileira. Mas seus efeitos só começaram a ser sentidos no último trimestre do ano passado. Os resultados acumulados nos três primeiros trimestres foram suficientes para assegurar o crescimento de 5,1% do PIB em 2008. Como importantes fontes de arrecadação - especialmente os resultados das empresas e a renda das famílias (sobre os quais incide o Imposto de Renda), o faturamento das empresas (ao qual está vinculada a arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, ICMS, o principal tributo estadual) e a massa salarial (sobre a qual incidem a contribuição previdenciária e outros tributos) - cresceram mais do que o PIB, o resultado foi o aumento ainda maior da arrecadação, do que resultou a elevação da carga tributária.
O ex-diretor do Banco Central e atual economista-chefe do Banco Santander, Alexandre Schwartsman, calcula que, no ano passado, o crescimento do PIB foi de cerca de R$ 140 bilhões. A arrecadação de impostos, por sua vez, aumentou R$ 80 bilhões. Isso quer dizer que "57,1% do crescimento do PIB foi comido pela arrecadação", observou ele ao Estado.
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Note-se que a carga tributária cresceu 1,1 ponto porcentual, atingindo 34,7% do PIB em 2007, no ano em que o governo perdeu a receita da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), extinta pelo Congresso. O aquecimento da atividade econômica, como explicam os técnicos da Receita Federal, responde por uma parte da expansão da carga tributária, mas medidas compensatórias adotadas pelo governo - como o aumento da alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras para diversos tipos de operação e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido das instituições financeiras, de 9% para 15% - tiveram efeito importante no aumento do peso dos impostos sobre a economia no ano passado.
O quadro mudou. Ao contrário do que ocorre nos tempos de bonança, quando cresce mais depressa do que a economia, nos períodos de crise a arrecadação tributária cai mais do que a produção. "Na esfera federal, certamente haverá queda", disse o coordenador-geral de Estudos, Previsão e Análise da Receita Federal, Marcelo Lettieri. Por isso, a Receita prevê que a carga tributária de 2009 será menor do que a de 2008. Os números dos cinco primeiros meses do ano dão respaldo a essa previsão. Por causa da crise e dos incentivos fiscais seletivos concedidos pelo governo, a arrecadação tributária de janeiro a maio deste ano foi 6,3% menor do que a de igual período do ano passado, em valores reais.
A mudança da tendência da arrecadação cria um problema previsível, mas para o qual o governo não se preparou adequadamente. Estimulado pelo ótimo desempenho da arrecadação em 2008, o governo Lula aumentou muitos gastos de maneira permanente, ou seja, não pode mais cortá-los, como seria necessário fazer em razão da queda da receita.
Além de ter concedido descontos tributários - para a compra de automóveis e de produtos eletrodomésticos da linha branca, entre outros benefícios - que totalizam R$ 11 bilhões até agora, o governo manteve o cronograma de reajustes dos vencimentos dos servidores. As despesas com o funcionalismo, por isso, continuam a crescer em ritmo acelerado - nos cinco primeiros meses, totalizaram R$ 60,8 bilhões, 23% mais do que as de igual período do ano passado, em valores nominais. As despesas de custeio, para a manutenção da máquina estatal, cresceram no mesmo ritmo.
Há uma clara deterioração da política fiscal, mas não há nenhum sinal de que o governo se preocupe com isso.