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Críticas Construtivas Se todo governante quer, por quê não?!!!

O OUTRO LADO DA NOTÍCIA

Ganhamos e podemos também levar
05/09/2009 - Pedro de Camargo Neto*

O Brasil teve a criatividade, a ousadia e - por que não dizer? - a coragem de contestar em 2002, na Organização Mundial do Comércio (OMC), a política agrícola norte-americana para o algodão. Um dos produtos com maior volume de subsídios, ele é uma caricatura da capacidade de destruição do mercado internacional pelo poder dos recursos orçamentários de um país desenvolvido. O algodão tornou-se o produto símbolo da Rodada Doha com a mobilização de Benin, Burkina Faso, Mali e Chade, que perdem mais do que o Brasil, pois suas economias são dependentes da cotonicultura.

O processo legal durou sete anos na OMC, com seguidas vitórias do Brasil. Apelação após apelação, o País colecionou todas as vitórias jurídicas possíveis. Nesta semana, o Órgão de Solução de Controvérsias da OMC definiu claramente os direitos que o Brasil ganhou dentro das regras multilaterais de comércio.

O processo começou com o objetivo de obrigar os EUA a reduzir seus subsídios, cessando de causar danos à cotonicultura nacional. É dentro dessa mesma ótica que os direitos obtidos pelo Brasil devem ser usados. Infelizmente, as regras da OMC não produzem o resultado direto de obrigar os EUA a alterar a política agrícola para o algodão. O acordo multilateral de comércio oferece ao vencedor o direito de retaliar comercialmente o país que causou os danos.


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Disputa comercial não é guerra. O resultado deve ser visto como natural entre países que têm fortes laços comerciais. Por exemplo, EUA e Canadá são os países com as maiores disputas comerciais. Como o acordo multilateral prevê como solução para as divergências a autorização para retaliar, o Brasil precisará ir em frente, impondo sanções para atingir seu objetivo inicial de forçar os EUA a alterar sua política agrícola.

O Brasil solicitou a autorização para retaliar não somente no âmbito do acordo de comércio de bens, mas também - em novo passo de criatividade, ousadia e, novamente, de coragem - no acordo de propriedade intelectual e no acordo de serviços da OMC.

Retaliar no comércio de bens é prejudicar as exportações de produtos norte-americanos para o Brasil. Será preciso identificar produtos cujo aumento do Imposto de Importação, acima do limite acordado na OMC, somente para a origem norte-americana, não prejudique o consumidor brasileiro. Tarefa longe de trivial, porém possível. O objetivo será conquistar pela força do comércio aliados nos EUA, que levem o governo e o Congresso em Washington a entender a necessidade de colocar a política agrícola do algodão dentro dos limites de subsídios acordados em Genebra.

Retaliar em propriedade intelectual é deixar de pagar direitos nessa área - entre muitas possibilidades, direitos de patentes de produtos farmacêuticos, de softwares de informática ou sobre músicas ou filmes. Retaliar em propriedade intelectual não é pirataria. Muito pelo contrário, fortalece o acordo de propriedade intelectual da OMC, pois caracteriza direitos existentes que, com autorização formal, deixam de ser pagos.

Também aqui o objetivo deve ser angariar apoios em Washington que obriguem às necessárias mudanças na política do algodão. É inaceitável permitir que grupos ligados à cotonicultura pressionem o Congresso, obtendo enormes subsídios que causam sérios prejuízos aos produtores do Brasil. É preciso despertar os interesses norte-americanos em propriedade intelectual. Mais do que despertar, é preciso retirá-los do comodismo. Sempre vigilantes na pressão no combate à pirataria, precisam compreender que subsidiar acima dos limites acordados, causando dano a outros, é pior do que pirataria.

Retaliar em propriedade intelectual favorece o consumidor do Brasil. Por seu caráter inovador, terá forte repercussão política, ajudando no desmonte da política agrícola ultrapassada e nefasta do algodão. Deixar de pagar direitos sobre remédios contra o HIV, com todo o seu conteúdo político, pode ser o necessário e suficiente para obrigar às mudanças.

A decisão da OMC também incluiu o montante autorizado em direitos de retaliação. Considerando o caráter flutuante dos subsídios à produção de algodão, ofereceu uma fórmula que torna o direito de retaliação variável, de acordo com os subsídios anuais. O valor mínimo, resultado dos subsídios em 2006, foi de pouco menos de US$ 300 milhões. Considerando que nos últimos anos os subsídios cresceram muito, estima-se que para 2009 os direitos de retaliação superem os US$ 800 milhões.

A retaliação em propriedade intelectual ou serviços somente foi autorizada para períodos em que os direitos de retaliação forem elevados. Entendeu-se que em anos de menores subsídios e menores direitos de retaliação seria possível aplicar as sanções sem prejudicar a economia nacional, retaliando somente no âmbito do acordo de bens.

Também aqui a decisão da OMC foi inovadora. O grande aumento de subsídios em anos recentes tem sido no programa de auxílio ao crédito de exportação. Julgado ilegal pela OMC, continua a ser amplamente utilizado, até para outros produtos além do algodão. O gatilho da possibilidade de retaliar em propriedade intelectual pode inibir a utilização daquele subsídio já em 2010.

Ganhamos até mais do que se previa em 2002. O essencial agora é usar com a mesma criatividade, ousadia e coragem os direitos adquiridos para atingir o objetivo inicial de obrigar os EUA a reduzir seus subsídios, deixando de causar dano ao produtor e à economia do Brasil.

No esforço de retomar as negociações da Rodada Doha, o Brasil deve informar sobre o início imediato das retaliações, oferecendo um choque reanimador ao moribundo.

...

*Pedro de Camargo Neto, presidente da Associação Brasileira da Indústria Produtora e Exportadora de Carne Suína (Abipecs), foi secretário de Produção e Comercialização do Ministério da Agricultura

  

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