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O OUTRO LADO DA NOTÍCIA

A legalização do bingo
18/09/2009 - O Estado de S.Paulo

Graças ao poderoso lobby dos setores interessados em legalizar os jogos de azar no Brasil, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei que regulamenta o funcionamento das casas de bingo no País. A exploração de todos os tipos de jogo de bingo e o funcionamento das máquinas caça-níqueis estão proibidos desde 2004, quando todas as licenças e concessões foram canceladas por Medida Provisória assinada pelo presidente Lula após a divulgação do vídeo em que um então graduado assessor da Casa Civil, Waldomiro Diniz, negociava propina com um empresário da batota.

Já aprovado pelas demais comissões técnicas, o projeto, que agora será levado ao plenário, é o produto da fusão de outras propostas. Originariamente, eram quatro projetos, todos proibindo, com maior ou menor rigor, a prática de jogos de azar. No entanto, sob a justificativa de que "jogo incentiva turismo" e permite um "aumento de R$ 4 bilhões por ano na arrecadação", o relator da matéria, deputado Régis de Oliveira (PSC-SP), apresentou um substitutivo em sentido diametralmente oposto. Ao justificar a iniciativa, ele enfatizou "dados e informações" que lhe foram prestados pelo presidente da Força Sindical e deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), para quem o fechamento das casas de bingo teria significado o fim de cerca de 320 mil postos de trabalho. Pelos exercícios aritméticos feitos pelo deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), que também apoia o substitutivo, o licenciamento de 1,5 mil casas de bingo, com uma média de 80 empregos por unidade, propiciará a criação de 120 mil novos postos de trabalho.

Além de liberar a exploração de qualquer tipo de máquina caça-níquel, como videopôquer e videobingo, o substitutivo abre caminho até para a reabertura de cassinos, que foram fechados há mais de seis décadas pelo então presidente Eurico Gaspar Dutra. Entre platitudes, como o dispositivo que obriga as casas de bingo a contarem com "instalações apropriadas e infraestrutura adequada e certificada pelos órgãos públicos", o texto do deputado Régis de Oliveira contempla medidas insólitas, como a criação de um Cadastro Nacional de Ludopatas, ou seja, de pessoas viciadas em jogo. Esses viciados teriam um limite diário para apostar e a casa de bingo que descumprir a "regra" teria de pagar multa de R$ 50 mil. O substitutivo abre portas tão amplas para a lavagem de dinheiro que os parlamentares que se opõem à legalização do jogo afirmam que sua aprovação poderá legalizar o crime organizado no País. "Por trás da exploração de jogos de azar sempre tem algum tipo de ilicitude", lembra o deputado Antonio Carlos Biscaia (PT-RJ).


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Para tentar aplacar a resistência da opinião pública à liberalização total do jogo no País, os defensores do substitutivo recorreram à surrada estratégia de destinar parte da receita fiscal propiciada pelas casas de bingo a causas nobres - tais como o "sistema de saúde" e "atividades de cultura e esporte". Com o apoio de Paulinho da Força, Faria de Sá e outros parlamentares igualmente interessados nos "efeitos sociais" da liberalização do bingo, Oliveira "garante" que o Fisco será rigoroso. "Além de uma sólida fiscalização, haverá distribuição de recursos ao poder público. Então, o fato de legalizar o bingo não significa dar respaldo algum a qualquer tipo de criminalidade", diz ele.

Seus argumentos foram classificados como "piada" pelo deputado Mendes Thame (PSDB-SP) - um dos poucos a denunciarem os expedientes que a "bancada do jogo" utilizou na CCJ para aprovar o substitutivo de Oliveira. "É inacreditável imaginar que alguém aceite fazer parte do Cadastro Nacional de Ludopatas. Quem estiver nessa lista vai ter uma grande dificuldade para arrumar emprego e contrair empréstimos", diz Thame, depois de afirmar que a legalização do bingo mandará para a lata do lixo todo o esforço da Polícia, do Ministério Público e da Justiça para coibir crimes de lavagem de dinheiro.

A esperança, agora, é que a opinião pública se mobilize para tentar derrubar, na votação do plenário, um dos mais perniciosos projetos que já passaram pela Câmara.

  

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