Três dias depois de o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, assinar a Portaria 434, de 13/11, definindo as regras da licitação da Usina de Belo Monte, no Pará, o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, e o secretário executivo do MME, Márcio Zimmermann, advertiram que, se a data da realização do certame não fosse confirmada imediatamente, a licitação só poderá ocorrer no ano que vem. O governo não quer lançar o edital de venda antes de expedida a licença do Ibama. E o adiamento se explica pelo risco de que a licença demore para sair.
Com capacidade de 11,2 mil MW, Belo Monte é o segundo maior projeto hidrelétrico do País, menor apenas que o de Itaipu. Sua construção é necessária para atender à demanda de energia esperada na próxima década.
A proximidade do leilão de Belo Monte - que estava previsto para 21 de dezembro - acirrou os ânimos de ambientalistas e grupos indígenas contrários ao licenciamento, mostrou reportagem de Renée Pereira, no Estado de 15/11.
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"Não vamos desistir agora dos nossos direitos", afirmou o cacique José Carlos Arara, da tribo arara, preparando-se para pedir ajuda ao cantor Sting, que é contra o projeto.
As dificuldades de licenciamento ambiental não se limitam a Belo Monte e afetarão o leilão de energia marcado para 18 de dezembro. Nele deveria ser oferecida a energia de sete hidrelétricas, com capacidade de geração de 905 MW, mas apenas a energia de duas será ofertada.
Até há pouco, ante a situação favorável dos reservatórios das usinas hidrelétricas e a redução da demanda decorrente da recessão, o setor energético vivia um momento de otimismo. Mas o céu de brigadeiro se desfez com o apagão da transmissão da energia de Itaipu, que afetou 18 Estados.
Itaipu não foi um caso isolado, mostrou reportagem de Nicola Pamplona, no Estado de 15/11. Houve 62 blecautes neste ano, contra 48, em 2008, segundo dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). Com o aumento da temperatura, o Rio de Janeiro vem sofrendo uma onda de apagões localizados, nas áreas das distribuidoras Light e Ampla. Situação semelhante tem ocorrido em bairros da cidade de São Paulo e cidades vizinhas, atendidas pela Eletropaulo.
Não foram feitos os investimentos previstos nos contratos de concessão, acreditam especialistas. E, com a falta de regras claras para a renovação das concessões que vencerão em meados da próxima década, as geradoras e distribuidoras já enfrentam dificuldades para tomar recursos de longo prazo para investir, por intermédio dos chamados project finance, que são pagos com a receita obtida na operação.
Ao mesmo tempo, o governo federal não libera os recursos de que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) necessita para fiscalizar o setor e antecipar-se a riscos de colapso. Entre 2003 e 2008, segundo dados da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres, a Aneel arrecadou R$ 1,66 bilhão com a Taxa de Fiscalização dos Serviços de Energia Elétrica, mas o governo federal só repassou 45% à agência (R$ 748 milhões). Nos quadros da Aneel há apenas 76 fiscais concursados, que dependem da ajuda dos órgãos estaduais de fiscalização. De um total de 826 fiscalizações feitas pela Aneel em 2008, apenas 60 foram nos sistemas de transmissão de energia. O dinheiro não repassado à agência reguladora alimenta o superávit primário da União, também declinante.
E há outros problemas que ameaçam o setor energético: por exemplo, entre 2009 e 2013, avalia o analista Márcio Prado, do Santander, 62% do aumento da oferta de energia virá de usinas térmicas, a óleo combustível e carvão, mais poluentes e de custo mais alto. Até a entrada em operação das usinas do Rio Madeira, a energia tende a custar mais e aumentará a dependência de energia alternativa.
Ao contrário do que alardeia a propaganda oficial, a política energética do governo Lula, sob o comando da ministra Dilma Rousseff e seus indicados no MME, na EPE, na Aneel ou na Eletrobrás, não foi capaz de afastar as incertezas.