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O OUTRO LADO DA NOTÍCIA

A "caixinha" turística
10/01/2010 - O Estado de S.Paulo

Emendas parlamentares individuais estão servindo para que dinheiro público seja aplicado em eventos turísticos de variada espécie numa escala nunca vista. Desde 2005, os valores já aumentaram mais de dez vezes, passando de R$ 162,4 milhões para R$ 1,71 bilhão, que é o que está previsto no Orçamento de 2010. Só de 2009 para 2010, o aumento foi de 56%. Ao que parece, por causa da repercussão do escândalo das ambulâncias, a distribuição desses veículos às prefeituras - fosse com fins demagógicos, fosse para engordar os "caixas 2" das campanhas eleitorais - passou a ser substituída pela distribuição de verbas destinadas para o turismo.

E é fácil explicar essa nova preferência dos parlamentares em canalizar as verbas das suas emendas para o patrocínio de shows e festas em seus redutos políticos em vez de, como antes, canalizá-las para a saúde (que desceu, nesse ranking, do 1º para o 4º lugar) ou para educação, saneamento básico, estradas, habitação, necessidades reais da população. É que o dinheiro do orçamento para shows e festas é de liberação rápida (em média dois meses), pois independe de licitação pública. Também é de controle muito difícil, pois não há padronização de custos nesses eventos, os artistas cobram cachês muito diferenciados e há um amplo leque de gastos em cada produção e em cada "palco-palanque".

Para um técnico da Comissão Mista de Orçamento - conforme matéria do Estado de segunda-feira - o turismo virou uma espécie de "rubrica guarda-chuva" a partir de uma portaria do Ministério listando as obras e atividades que podem ser financiadas. Além de uma relação que inclui a construção de museus e teatros, pórticos, teleféricos, mirantes, praças e parques de exposições, rodeios ecológicos ou temáticos, etc., foi autorizado o patrocínio de festas e eventos. E os recursos, que até 2006 se destinavam apenas a cidades turísticas, cadastradas no Ministério, passaram a ir para qualquer uma - e é claro que para a captação de votos o retorno eleitoral desse gasto é mais rápido.


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Disse o secretário executivo da Controladoria-Geral da União (CGU), Luiz Navarro, que o aumento de recursos para a promoção de eventos "avulta aos olhos" e que, desde 2008, tem sido alvo de preocupação do Ministério do Planejamento e do próprio Ministério do Turismo. "Um evento é muito atrativo do ponto de vista político, é simpático ao eleitor. Mas o risco, em ano de eleição, é o uso dessas festas como propaganda antecipada com dinheiro público, sem falar da possibilidade de desvio de recursos para o caixa 2", acrescentou. A CGU já identificou casos de superfaturamento, de desvios de verba e até de festas "fantasmas", sob investigação da Polícia Federal e do Ministério Público. E, mesmo com o cuidado de se exigir comprovação do uso das verbas, através de fotografias dos shows, cópias dos anúncios dos eventos ou de matérias sobre eles publicadas na imprensa, tem havido até casos de fraudes com fotomontagens de eventos que não aconteceram.

Anuncia-se agora que o Ministério do Turismo e a CGU elaboram um pacote para restringir a liberação de verbas nessa área e para evitar o uso eleitoral dos eventos. Uma das ideias é estender aos convênios firmados com entidades sem fins lucrativos e municípios as mesmas exigências incluídas nos acordos realizados com os Estados em ano eleitoral: o Ministério só liberaria recursos para convênios firmados antes de julho e os eventos não poderão ocorrer depois desse prazo. Curioso é pensar que os efeitos eleitoreiros das festas e shows não ultrapassem mais de dois meses (agosto e setembro), já que as eleições são no início de outubro. Além disso, o que será feito para coibir eventos "fantasmas"?

O governo se preocupa, agora, com uma farra de emendas parlamentares individuais canalizadas para eventos ditos turísticos, parecendo esquecer que esse facilitário de repasses de verbas acompanhou o fortalecimento político do Ministério, nas gestões Walfrido Mares Guia (PTB) e Marta Suplicy (PT). Antes tarde do que nunca. Mas, diante das fortes suspeitas de superfaturamento, de desvios e até de fraudes primárias, com as emendas do Orçamento, é preciso que a opinião pública saiba quais são os parlamentares que estão patrocinando mais essa farra imoral com o dinheiro de todos.

  

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