Lula pode retornar em 2014? "Sem dúvida", diz Dilma 21/02/2010
- Josias de Souza - Folha Online
- "Lula chegou a um ponto que futuro dele é o que ele quiser"
- "Não fui condenada por ação armada, porque não pratiquei"
- "Dizem: ‘Fiz o Bolsa Família antes’. Ah é? Para quantos?"
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- "Você acha que, como ministra da Casa Civil, sou poste?"
- "Não queremos cercear ou controlar conteúdo dos jornais"
Convertida em presidenciável oficial do PT, Dilma Rousseff tornou-se a personagem da semana. Caminhara à sombra de Lula. Agora, no dizer do próprio presidente, terá de descer ao gramado da sucessão “com as próprias pernas”.
Para onde caminharia o Brasil caso Dilma fosse eleita em outubro?, eis a pergunta que o eleitor começa a fazer aos seus botões. Em busca da resposta, os repórteres Eumano Silva, Guilherme Evelin e Helio Gurovitz foram à presença de Dilma.
Entrevistaram-na por quase duas horas na última quinta (18). O resultado foi às páginas da revista Época. Pressionando aqui, você chega à íntegra.
Neste sábado (20), ao discursar no Congresso petista que consagrou a candidatura de Dilma, Lula disse que, eleita, sua pupila não exercerá um “mandato tampão”. Deseja para ela dois mandatos.
No curso de sua entrevista, a candidata foi instada a comentar o papel que teria Lula num hipotético governo Dilma. “Acho que o Lula seria um dos melhores conselheiros que alguém poderia ter”.
Trabalha com a hipótese de que Lula possa disputar a presidência em 2014? “Sem sombra de dúvida, ele pode”. Para ela, “Lula chegou a um ponto de liderança pessoal, política, nacional e internacional, que o futuro dele é o que ele quiser”.
Vão abaixo outros trechos da entrevista:
1. Dotes pessoais: “Uma das coisas que me credenciam para ser presidente é que conheço hoje o governo brasileiro de forma bastante circunstanciada, precisa”.
2. Teoria do poste: “Você acha que, como ministra-chefe da Casa Civil, eu sou um poste? Duvido que os grandes experientes em gestão tenham o nível de experiência que eu tenho. Duvido”.
3. Estado na economia: “Somos contra a privatização de patrimônio público ou de estatais como Petrobras, Furnas, Chesf, Eletrobrás, Banco do Brasil, a Caixa”.
4. Estado X iniciativa privada: “Nos anos 50, o Estado empresário tinha lá sua função. Não tinha todas as empresas estruturadas. Como alguém em sã consciência, em pleno século 21, em 2010, pode falar que o Estado brasileiro vai ser empresário? Isso é um equívoco monstruoso”.
5. Privatizações da era FHC: “Não chegou a ser tão danoso como foi para países vizinhos, porque não conseguiram fazer tudo. Mas pegaram a Petrobras e começaram a tentar reduzi-la a uma dimensão menor. [...] Achamos estranha aquela história do nome Petrobrax. Era uma tentativa de abrir o capital mais do que devia. [...] As intenções são muito claras!”
6. Venda da Vale e das teles: “Com as teles, acho que foi diferente. Em relação à Vale, vamos ter de fazer exigências a respeito do uso da riqueza natural. Isso não significa reestatizar. Ela pode ser privada, desde que submetida a controles”.
7. Bolsa Família: “[...] Quando chamam o Bolsa Família de ‘bolsa-esmola’, é porque veem a política social como uma coisa ultrapassada. [...] Não dá para falar: ‘Eu fiz o Bolsa Família antes’. Ah é? Fez para quantos?”
8. Gostou de ser chamada de "companheira de armas" por José Dirceu? “Ele estava fazendo para mim um cumprimento. [...] Havia várias características nas diferentes organizações de esquerda. A minha fazia certa crítica às ações armadas, principalmente assaltos a banco. [...] Não fui condenada por ação armada, porque não a pratiquei”.
9. Combate à ditadura: “Minha geração experimentou a pior cara da ditadura [...]. Então, alguém que acreditava que seria possível a democracia naquele período era ingênuo. [...] Esse processo vai levar à minha prisão, em 1970. [...] Quando você está na cadeia e vê tortura, morte e o diabo, o valor da democracia e o direito de expressão e de discordar começam a ser cada vez mais um valor intrínseco”.
10. Revisão da Lei da Anistia: “Essa é uma questão que está no STF. O que o Supremo decidir tem de ser acatado por todos. Agora, uma coisa é uma atividade de violência de pequenos grupos [...]. Outra coisa, muito diferente, é a violência do Estado, porque é desproporcional. [...] Fui condenada e cumpri pena maior do que minha condenação. Ninguém me ressarciu de nada”.
11. Venezuela e imprensa: “[...] Não queremos cercear, controlar o conteúdo de jornais ou fazer nada similar. Mas não nos relacionamos com países exportando nosso modelo para ninguém [...]. A Venezuela é uma realidade, nós somos outra. Temos uma relação com a Venezuela [...]. Temos também uma relação com o presidente Álvaro Uribe [Clômbia], que está pedindo o terceiro mandato – e não tenho visto por aqui ninguém questionando o terceiro mandato dele”.
12. Irã e a bomba: “Depois da Guerra do Iraque, temo muito essa história de que o Irã está fazendo isso ou aquilo. Se você não der uma abertura para o diálogo com o Irã, você vai isolá-lo. [...] Não deu muito certo a política de invadir o Iraque e do Afeganistão, deu?”
13. Aborto: “Sou a favor de que haja uma política que trate o aborto como uma questão de saúde pública”.
14. Drogas: “Não podemos tratar da questão da droga no Brasil só com descriminalização. Estou muito preocupada com o crack. [...]A questão da droga no século 21 é muito diferente daquele tempo de Woodstock, que tinha um componente libertário. [...] A não ser que a gente tenha um avanço muito grande no controle social da droga, fazer um processo de descriminalização é um tiro no pé”.