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O OUTRO LADO DA NOTÍCIA

"Turbinação" consentida
10/03/2010 - O Estado de S.Paulo

Diante das evidências de utilização da máquina governamental para "turbinar" candidaturas, antes do período que a lei estipula para as campanhas eleitorais, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Carlos Ayres Britto, reconhece a anomalia que, estranhamente, a Corte que preside não se mostra disposta a coibir.

Em entrevista ao Estado de S.Paulo de domingo, indagado sobre qual o limite para um gestor público impulsionar uma candidatura, observou o ministro que, "à luz da legislação, este não é o momento de se impulsionar candidatura. Não é o momento de o chefe do Poder Executivo apoiar explicitamente, turbinar ou elogiar explicitamente uma candidatura. A legislação não permite isso. A lei estabelece um prazo para propaganda (6 de julho). Não se pode fazer propaganda antecipada".

Quando indagado a quem se referia, o presidente do TSE -- que deixará o posto daqui a dois meses -- respondeu que se referia a quem detém o controle da máquina administrativa. E afiançou que a base de inspiração da proibição de propaganda antecipada é uma só: não perturbar o funcionamento da máquina administrativa, não misturar a máquina com propaganda eleitoral, não confundir ação de governo com proselitismo eleitoral.


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Para o ministro essa perturbação viola, inevitavelmente, o princípio da impessoalidade. E, quando se viola o princípio da impessoalidade, que é constitucional, ficam desequilibradas as forças dos pré-candidatos.

O raciocínio do ministro é perfeito, mas com ele se chocam, inexplicavelmente, os argumentos de outros ministros do TSE, que mais de uma vez derrubaram representação dos partidos de oposição contra Lula por propaganda eleitoral antecipada -- no caso, em favor da sua candidata, Dilma Rousseff.

Na sessão plenária realizada no dia 14 de maio de 2009, o TSE considerou, por unanimidade de votos, improcedente a representação movida pelo DEM e pelo PSDB contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, por propaganda eleitoral antecipada.

Os ministros entenderam que não ficou caracterizada a propaganda eleitoral extemporânea, por parte do presidente e da ministra, em evento que reuniu prefeitos em Brasília nos dias 10 e 11 de fevereiro de 2009. Posteriormente o TSE derrubou outra representação, do DEM, PSDB e PPS, tendo por base cerimônias de inaugurações no interior de Minas.

Mais uma vez a oposição alegou que o objetivo notório do presidente e da ministra-candidata não era fiscalizar o andamento de obras ou a execução de programas de governo, visto que para isso não seria preciso montar-se verdadeiro comício.

Para os partidos oposicionistas, Lula e Dilma vêm percorrendo o País com intenções eleitoreiras, "utilizando-se do poder político que detêm e dos recursos públicos que gerenciam para a dispendiosa e bem montada estratégia de, antecipadamente, lançar a ministra Dilma Rousseff com vantagem no certame eleitoral deste ano".

E os três partidos enfatizam: "A exposição, diuturna e ostensiva do nome da pré-candidata Dilma Rousseff ao eleitorado, bem como a sua vinculação à continuidade de programas, obras e ações do governo, caracterizam a chamada propaganda eleitoral subliminar."

Na ocasião o TSE não enxergou qualquer indício de propaganda eleitoral nos verdadeiros comícios -- termo empregado até mesmo pelo presidente em uma dessas "inaugurações" -- montados para "inspecionar e fiscalizar" as obras do governo pelo Brasil afora.

É até curioso o fato de o ministro relator, nessa representação, ater-se ao fato de que esse trabalho, digamos, conjunto, do presidente e de sua chefe da Casa Civil, não ter ocorrido dentro do período de três meses que antecedem às eleições -- quando se tornam ilegais inaugurações do gênero.

Ora, justamente por estarmos ainda longe desse período é que se torna clara a antecipação da campanha. A situação de pré-candidato (ou pré-candidata) parece isentar candidatos e partidos de qualquer responsabilidade pelo descumprimento das restrições impostas pela legislação eleitoral, seja no tocante a campanhas eleitorais fora do tempo, seja no emprego de máquinas da administração pública para sustentá-las.

Bom seria, então, que a Justiça Eleitoral seguisse o pensamento do ministro que a comanda -- e que em breve deixará de fazê-lo.

  

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