Viva a mandioca! – a verdadeira face do Brasil 23/04/2010
- Joselito Motta*
Temos bons motivos para comemorar em 22 de abril os 510 anos de vida deste País. Na sua chegada ao Brasil, em 1553, o Padre José de Anchieta viu a importância da mandioca e logo a batizou de pão da terra ou pão dos trópicos.
Quando Pero Vaz de Caminha escreveu a primeira carta ao Rei de Portugal, comunicou-lhe que a raiz brasileira já existia e fazia sucesso entre os indígenas. Ao referir-se aos nativos disse: “São tão rijos, tão nédios que não o somos tanto, com tanto trigo e legumes que comemos”. “Eles não comem senão doutra coisa a não ser dum inhame que brota da terra”, completou.
Era a mandioca, “o pão do Brasil”, o aipim, a macaxeira, desconhecida do colonizador europeu que sabia de algo semelhante, o inhame, proveniente das colônias da África portuguesa.
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O deputado Fernando Melo (PT-AC) está apresentando na Câmara um projeto de lei que cria o Dia Nacional da Mandioca, a ser lembrado a cada ano, na mesma data do Descobrimento do Brasil. Isso anima a todos os que se dedicam ao resgate dessa cultura em lugares onde ela “adormeceu” ou foi atropelada por grãos de exportação.
Atualmente, a mandioca (Manihot esculenta Crants) está presente no dia-a-dia de 80 países e representa uma das principais explorações agrícolas do mundo. Colhem-se 170 milhões de toneladas/ano. Entre as tuberosas, ela perde apenas para a batata. A África é o maior produtor mundial com 53,32%, seguido pela Ásia (28,08%), Américas (18,49%) e Oceania (0,11%).
Estudos em sítios arqueológicos auxiliados pelo uso do carbono 14 indicam nosso País como o centro de origem e dispersão da espécie. Sua importância alimentar é base de sustentação para mais de 600 milhões de pessoas no mundo.
O Brasil produz em torno de 27 milhões de toneladas de raiz provenientes na quase totalidade de mais de 14 milhões de agricultores familiares. A condição de maior produtor mundial que possuía em anos passados foi ultrapassada pela Nigéria na África e mais recentemente pela Tailândia, caindo para o posto de terceiro lugar.
Além do projeto do deputado, o site da www.malaguetacomunicacao.com.br, em Brasília, teve a feliz idéia de colocar a mandioca em evidência na Copa de 2014. O “País do futebol” teria assim a oportunidade de mostrar outras manifestações da cultura brasileira. Afinal de contas, temos muito mais do que belas mulatas, dribles performáticos, caipirinha e feijoada.
Para além do estereótipo, o maior evento esportivo do planeta pode ser uma oportunidade de apresentar um time de comidas e ingredientes regionais que compõem a gastronomia nacional. E, como toda equipe precisa de um mascote, a brasileiríssima mandioca seria uma representante de peso da cultura nacional.
O pessoal da Malagueta pensou num símbolo, o Mandioquinha. Com ele, fugimos dos clássicos segurando a bola ou com a bola no pé. A ilustração é dos gêmeos desenhistas paulistanos Fábio Moon e Gabriel Ba. Fábio sugeriu fazê-lo e matando a bola no peito, bem dinâmico e dramático. “Ele é meio escurinho, mulatinho, pretinho, com sobrancelha grossa e alguns cabelinhos na cabeça. Feinho e meio medonho, mas carismático. E sempre com um sorriso no rosto”, explicou o desenhista.
Mandioquinha é um personagem novo e fala um pouco mais do Brasil e do povo brasileiro. O mascote pode até não “pegar”, mas a proposta é criativa e se alinha à onda crescente de valorização da mandioca.
Dela fazemos também farinha de tapioca, sagu, tapioca pipoca, tapioca recheada, pão de queijo, beijus tradicionais e coloridos preparados com frutas e hortaliças.
Pratos quentes e frios, doces e salgados são exemplos da vasta culinária regional espalhada Brasil afora, como iguarias que evidenciam a presença da Raiz do Brasil.
Agregamos ainda outro valor de alta importância alimentar: o fato de a mandioca não conter glúten, tornando os seus derivados adequados aos portadores da doença celíaca. (Continua).
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*Joselito Motta é pesquisador da Embrapa Mandioca e Fruticultura Tropical em Cruz das Almas, no Recôncavo Baiano