Tributos pouco transparentes 15/05/2010
- O Estado de S.Paulo
Nos Estados Unidos e na União Europeia, os tributos que incidem sobre o consumo estão discriminados nas notas de venda, para que o cliente saiba o que pagou à loja e o que pagou ao Fisco. Mas no Brasil, que tem uma das maiores cargas tributárias do mundo, quem compra não sabe quanto vai para o vendedor e quanto para o governo, como mostrou pesquisa feita pelo Instituto Ipsos, encomendada pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
Das mil pessoas ouvidas na pesquisa, 84% sabiam que pagam tributos ao fazer a compra (mas não quanto), 12% acreditavam não pagar tributos e 4% não sabiam responder ou não responderam.
Não está em discussão, é claro, a necessidade de pagar tributos. Não há outra maneira de o Estado oferecer aos cidadãos serviços essenciais como justiça, segurança pública, saúde, educação, transportes públicos e previdência. Mas saber que a tributação sobre a cesta básica é da ordem de 15%, que as contas de luz e de telefone não subsidiadas são oneradas, respectivamente, com 39,25% e 28,66% de tributos indiretos, o açúcar, com 16,23%, o sabão em pó, com 32,25%, e uma máquina de lavar roupa, com 55%, deveria ser direito básico do consumidor.
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Num país onde a carga tributária é da ordem de 36% do Produto Interno Bruto (PIB), conhecer a parcela do preço que o vendedor aufere e a que segue para o caixa dos governos permitiria avaliar melhor a relação custo-benefício dos serviços públicos. "O contribuinte brasileiro não recebe a contrapartida em serviços públicos de qualidade, em educação, saúde e segurança", afirma o especialista em contas públicas Amir Khair, ex-secretário de Finanças da Prefeitura de São Paulo na gestão Luiza Erundina.
No Brasil, o principal tributo indireto é o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), cujas alíquotas oscilam entre 17% e 30%, e que se destina a financiar os Estados e, subsidiariamente, os municípios, que recebem a cota-parte do tributo. Mas há outros tributos indiretos, aplicados pela União, como a Contribuição para a Seguridade Social (Cofins), cuja alíquota nominal é de 7,6% sobre o faturamento das empresas.
As alíquotas do ICMS são as mais altas e, ainda assim, os Estados descobriram como aumentá-las. É o caso do ICMS que incide sobre o consumo de energia elétrica: a alíquota nominal é de 25%, mas os Estados aplicam uma alíquota real de 33,3% sobre as contas. Um consumidor que gaste R$ 100,00 em eletricidade deveria pagar R$ 25,00 a título de ICMS. Mas os Estados argumentam que como o ICMS é cobrado "por dentro" e não "por fora", disso resulta uma tributação maior. É uma forma de engodo, nota o matemático José Dutra Vieira Sobrinho, explicando que dizer que o valor do imposto integra a sua própria base de cálculo é o mesmo que dizer que a alíquota do ICMS incide sobre o próprio ICMS - "um absurdo sem paralelo no mundo civilizado".
Não havendo distinção entre preço e tributo, a carga tributária é pouco visível para o consumidor. "Não podemos culpar o cidadão de ignorância nem de falta de atenção", notou o diretor de pesquisas e estudos econômicos da Fiesp, Paulo Francini. Um dos maiores especialistas em tributação no País, o consultor Clóvis Panzarini observa que "o controle dos gastos e desperdícios do governo, pela sociedade, fica mais difícil quando os contribuintes não têm a percepção de que são eles que pagam cada centavo das despesas públicas".
Tanto a Receita Federal do Brasil como as Secretarias Estaduais da Fazenda têm aperfeiçoado as estruturas de cobrança de tributos e conseguido reduzir a evasão fiscal. Nada há de errado nisso e, em alguns Estados e municípios, o aumento da arrecadação se traduz em melhores serviços públicos. Mas para aqueles que administram mal o dinheiro dos contribuintes, a explicitação da carga tributária pode ser muito inconveniente num ano eleitoral.
Não há dificuldades técnicas para explicitar a tributação do consumo, mas cabe ao Congresso transformar essa exigência da cidadania em lei.