O loteamento dos Correios 01/09/2010
- O Estado de S.Paulo
Excetuados os episódios iniciais do "mensalão", o fisiologismo nos Correios nunca foi tão evidente como agora. O aparelhamento dos Correios resultou na queda do padrão dos serviços postais e na desordem administrativa da empresa.
A situação chegou ao limite do suportável - até para o governo - em julho deste ano, depois que a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) criou um site que se propunha a ensinar a candidatos como fazer campanha eleitoral.
O governo resolveu então demitir o presidente da empresa, Carlos Henrique Custódio. Para substituí-lo foi nomeado David José de Matos, ex-funcionário da Eletrobrás.
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Em junho, fora dispensado o diretor de Operações, Marco Antonio Oliveira, permanecendo vago o cargo até a nomeação para o posto de Eduardo Artur Rodrigues Silva, conhecido como "coronel Artur", ao que parece apoiado pelo advogado Roberto Teixeira, compadre do presidente Lula.
Como o coronel era presidente da Master Top Linhas Aéreas (MAT), cuja certificação fora suspensa pela Agência Nacional de Aviação Civil, foi preciso esperar que essa penalidade fosse anulada, o que ocorreu na véspera da nomeação. Mas era conveniente também que o novo diretor de Operações dos Correios tivesse um verniz do PMDB, já que o Ministério das Comunicações pertence à cota do partido. Divulgou-se então que ele era apadrinhado pelo senador Leomar Quintanilha (PMDB-TO). Não consta que tenha sido considerado conflito de interesses o fato de a MAT ter sido recentemente contratada pela ECT para transporte de mala postal, como vencedora de uma licitação de R$ 44,9 milhões. Isso foi resolvido em família, sendo a presidência da empresa transferida na undécima hora para uma filha de Artur. Assim, em 2 de agosto, o coronel tomou posse na diretoria dos Correios, tornando-se, simultaneamente, contratado e contratante de serviços postais.
O senador Quintanilha nega a indicação, o PMDB também não a perfilha, a empresa de advocacia de que Teixeira é sócio diz nada ter a ver com o caso e o ministro das Comunicações, José Artur Filardi, diz não ter tido conhecimento prévio da ligação de Artur com o setor aéreo, prometendo uma investigação. Antes bem apadrinhado, o coronel ficou "pagão".
As licitações nos Correios têm obedecido a um padrão, do qual não fugiu a que premiou a MAT. Veja-se, por exemplo, como têm sido complexas as licitações para a renovação de contratos entre os Correios e as lojas franqueadas. A ECT tem 1.415 franquias, que representam 15% dos seus postos de atendimento e respondem por 40% de sua receita. Por decisão judicial, foi fixada a data de 10 de novembro de 2010 para serem realizadas licitações, o que só abrangerá 187 lojas. As demais preferiram recorrer à Justiça, sob a alegação de que os novos contratos não ofereciam remuneração adequada.
Os problemas não param aí. Um concurso para 5.565 vagas, marcado para setembro, foi adiado para o fim de novembro, devendo ser feitas admissões em 2011. Para suprir a falta de pessoal, serão recrutados, segundo Matos, 4 mil funcionários "provisórios". A saída aventada é a adoção de plano de contingência, que poderá custar R$ 550 milhões.
Com os serviços postais à beira do colapso, teme-se que as provas para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), marcado para 6 e 7 de novembro, não possam ser distribuídas em tempo hábil.
Não há melhor exemplo dos efeitos desastrosos do loteamento de cargos no governo federal do que a crise dos Correios. Há evidente necessidade de uma reforma, que não pode ser conduzida com a distribuição de cargos com endereço certo. Não faltam os que advogam a privatização da ECT, mas, como isto dificilmente ocorrerá, a empresa precisa ser modernizada, sob critérios rigorosamente técnicos, para justificar a sua permanência como empresa pública. Se os Correios continuarem sendo tratados como cabide de empregos políticos, só se pode esperar que a ineficiência se agrave, os serviços se deteriorem e os déficits operacionais sejam ainda mais elevados.