A inflação preocupa 24/02/2011
- O Estado de S.Paulo
A inflação acumulada nos últimos 12 meses superou 6%, aproximando-se do teto de 6,5% fixado para 2011 pela política de metas inflacionárias. Num país que, até a metade da década passada, se acostumou a conviver com inflações muito mais altas, sempre haverá quem não se preocupe com o índice atual. Além disso, pode-se argumentar que essa variação foi aferida por um índice intermediário, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) referente ao período encerrado no dia 15, e nem sequer reflete a inflação de fevereiro. Infelizmente, porém, a situação é mais séria.
Quando se observa que o IPCA-15 antecipa a inflação do mês e quando se recorda que, por causa da experiência inflacionária relativamente recente, persiste na mente de muitos fornecedores de bens e serviços o temor de que a situação possa escapar ao controle e, por isso, eles se previnem elevando os preços, a conclusão inevitável é de que o quadro é preocupante.
É provável que, por efeito estatístico, em algum momento do terceiro trimestre, a inflação de 12 meses superará o teto das metas, ficando perto de 7%. Isso ocorrerá porque, com o correr dos meses, serão eliminados da conta os resultados muito baixos do IPCA registrados em meados de 2010 e introduzidos os referentes aos meses correntes, bem mais altos.
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Se, até lá, o quadro econômico estiver mais claro e se as autoridades tiverem feito o que precisa ser feito desde já e continuarem atentas às pressões remanescentes, esse pico poderá ser encarado com naturalidade, sem realimentar as expectativas pessimistas e sem provocar alta generalizada dos preços. Para isso, o governo precisa manter uma rigorosa política fiscal, fundada na firme disposição de cortar com profundidade suas despesas, e o Banco Central precisa transmitir confiança aos agentes econômicos, com o uso adequado dos juros e dos controles sobre a oferta de crédito.
O IPCA-15 mostrou alta média de 0,97%, a maior da série histórica calculada pelo IBGE para o mês de fevereiro. Alguns sinais positivos apontam para a redução do IPCA do mês, entre os quais a desaceleração da alta dos preços dos alimentos, que foram a principal fonte de pressão inflacionária dos últimos meses. Caíram os preços de itens importantes na mesa dos brasileiros, como carne, feijão carioca, batata inglesa e frango. Também aliviará as pressões futuras a inclusão, no IPCA-15, de itens que tiveram forte impacto na primeira metade do mês, mas não mais influenciarão o índice daqui para a frente, como as tarifas dos ônibus.
Mas, mesmo que a inflação de fevereiro fique abaixo da alta do IPCA-15, isso não significará, necessariamente, uma melhora do quadro. Ele pode até mesmo piorar. Ao contrário do que se observou nos últimos meses, quando a alta foi concentrada nos alimentos, por causa da elevação dos preços internacionais dos produtos agrícolas, agora os aumentos se espalham. Mantém-se a forte tendência, observada desde o fim de 2010, de disseminação de altas para grupos cada vez mais amplos de preços. Dos nove itens que compõem o IPCA, cinco registraram aumentos nas últimas medições.
A crise nos países árabes já fez subir a cotação do petróleo. A Petrobrás tem evitado repassar imediatamente para os preços internos o efeito da alta da cotação internacional do óleo. Mas, quanto mais persistir a crise nesses países, mais o petróleo continuará caro, o que, em algum momento, poderá afetar a inflação brasileira.
Os próximos dias serão cruciais para reduzir as ansiedades causadas pela inflação. Na quarta-feira, o Copom definirá o nível do juro básico que vigorará até a segunda metade de abril. É possível que, até lá, o governo já tenha conseguido encontrar os R$ 50 bilhões que prometeu cortar nos gastos previstos no Orçamento de 2011, o que poderá aliviar um pouco as pressões sobre a política monetária. Além disso, o IBGE divulgará os dados sobre o desempenho da economia no último trimestre de 2010. Se ficar claro que o governo age corretamente e houve uma desaceleração notável na atividade econômica, as tensões diminuirão.