Por pressão das empresas e das centrais sindicais, o Ministério do Trabalho e Emprego adiou pela terceira vez a entrada em vigor do novo relógio de registro de ponto eletrônico. A medida foi imposta em agosto de 2009 pela Portaria 1.510, sob a alegação de que aumentaria a segurança na aferição do registro da jornada de trabalho nas empresas com mais de dez empregados, evitando com isso fraudes no pagamento de horas extras e nos descontos de faltas e atrasos. A portaria não abrange as empresas que têm registro manual ou mecânico, mas apenas as que utilizam o ponto eletrônico - cerca de 700 mil, segundo as estimativas oficiais.
Elas foram obrigadas a adquirir relógios de ponto capazes de emitir comprovantes em todas as entradas e saídas dos trabalhadores, inclusive na hora do almoço - e que podem servir de prova documental em futuros processos judiciais. A Portaria 1.510/09 também exige que os equipamentos contenham memória para o registro de toda a movimentação dos empregados, sem qualquer possibilidade de alteração, e que contenham dispositivos que permitam o acesso eletrônico às informações, por parte dos fiscais do trabalho.
As novas regras foram recebidas com duras críticas tanto de seus supostos beneficiários - os empregados - quanto dos empregadores. Os empresários da indústria e comércio alegaram que a eficácia da Portaria 1.510/09 é discutível, em termos de aumento do controle da jornada do trabalho. Eles também lembraram que a aquisição das novas máquinas - cujo preço varia de R$ 2,5 mil a R$ 6 mil - acarretaria custos adicionais para as empresas, que já enfrentam outros grandes obstáculos para aumentar sua eficiência e produtividade. Algumas entidades de classe afirmaram ainda que os únicos beneficiários da portaria baixada pelo ministro Carlos Lupi foram os fabricantes de equipamentos de registro de ponto - que, evidentemente, tiveram uma explosão de vendas - e as poucas empresas que comercializam software específico para controle do ponto eletrônico.
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As centrais trabalhistas endossaram as críticas dos patrões. Elas disseram que o sistema de catracas em vigor é um mecanismo de controle eficiente e advertiram para os problemas que as novas regras poderiam criar nas grandes empresas - como filas nas trocas de turno e horários de almoço, causando incômodos para os trabalhadores. Líderes sindicais também lembraram que, pela Portaria 1.510/09, o empregado teria de guardar pelo menos quatro comprovantes diariamente (entrada, saída para almoço, retorno do almoço e saída) - isso se não fizer horas extras. Considerando-se a média de 23 dias úteis, seriam 92 comprovantes por mês - e mais de mil por ano.
Enquanto algumas empresas recorreram ao Poder Judiciário, questionando a legalidade da Portaria 1.510/09, outras acharam mais barato voltar a usar o registro de ponto mecânico, em plena era da informática. Diante da saraivada de críticas e do risco de derrotas nos tribunais, Lupi adiou por três vezes a entrada em vigor do novo relógio de registro de ponto eletrônico. E, no último adiamento, na semana passada, o ministro permitiu às empresas e aos sindicatos negociar a instalação de mecanismos alternativos para o controle de jornadas de trabalho.
Ou seja, depois de ter imposto uma medida burocrática, cara e desnecessária a cerca de 700 mil empresas, obrigando-as a adquirir novos relógios para controle eletrônico de ponto, o ministro do Trabalho deu o dito por não dito. Ao flexibilizar dessa maneira o alcance da Portaria 1.510/09, ele está buscando uma saída para neutralizar as contundentes críticas que vem sofrendo de entidades empresariais e de centrais sindicais.
Mesmo após seu recuo, empresas e empregadores continuaram pedindo a revogação sumária da Portaria 1.510/09. Este episódio faz lembrar uma medida imposta em 1999, obrigando todo veículo a ter um kit de primeiros socorros. Por ser absurda, a medida acabou sendo suspensa - mas gerou vultosos lucros para os fabricantes de gaze e esparadrapo.