Sinais de fumaça na floresta 24/03/2011
- Sérgio Malbergier*
Os sinais de fumaça que sobem dos enormes canteiros de obras das enormes hidrelétricas em construção na Amazônia alertam para uma enorme transformação em curso no país do nunca antes: a retomada da exploração hidrelétrica amazônica.
Estima-se que o potencial energético daquela região ainda a explorar equivalha a sete usinas das Três Gargantas, na China, a maior do mundo.
O novo Brasil não pode prescindir dessa energia, presume-se, pois está investindo R$ 40 bilhões apenas nas duas usinas em Rondônia, no rio Madeira: Santo Antônio e Jirau.
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Esse movimento, que mal começou, mudará a região amazônica, e é notável como foi fácil tomar essa decisão. Sim, os ambientalistas protestaram, protestam e protestarão, mas a Amazônia é tão distante em todos os sentidos da imensa maioria dos brasileiros que quase ninguém se importa de verdade. E essa energia é necessária e bem-vinda.
No teatro de operações do rio Madeira, pertinho de Porto Velho, estão alojados cerca de 40 mil trabalhadores de Jirau e Santo Antônio. Sim, 40 mil. O começo das obras das hidrelétricas inundou a região com empregos e dinheiro. A economia de Rondônia vem crescendo a mais de 20% ao ano (o dobro da China), e os preços dispararam.
Os trabalhadores de Jirau rebelaram-se na semana passada e tocaram fogo nas casas e ônibus do canteiro de obras para pedir, entre outras coisas, aumento de salários diante da inflação corrosiva, planos de saúde melhores e mais respeito dos seguranças, acusados de abusos e truculência.
Em Três Gargantas, na China, não teve nada disso, pois é no país nominalmente comunista que mais se oprime o proletariado. No nosso capitalismo "nouveaux", democrático, includente, os operários não querem só comida, mas felicidade.
Por aqui, as duas grandes centrais sindicais do país, ambas governistas, Força Sindical e CUT, trocam acusações sobre a violência e tentam conquistar os trabalhadores. A CUT, que domina sindicato local, interveio para acalmar os trabalhadores nessa que é uma das maiores obras do PAC, o programa de obras de infraestrutura do governo.
Até um acordo com as construtoras, o clima seguirá tenso na região. Uma tensão reveladora: os choques do novo Brasil com o velho Brasil nem sempre serão pacíficos e harmoniosos. Ainda bem. Serão choques de realidade contra o neoufanismo nacional. Estamos precisando.
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Sérgio Malbergier é jornalista da Folha de São Paulo