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O OUTRO LADO DA NOTÍCIA

O alcance da Lei da Ficha Limpa
26/03/2011 - O Estado de S.Paulo

Apesar da euforia dos políticos eleitos no pleito de 2010, mas cuja diplomação foi negada pela Justiça Eleitoral com base na Lei da Ficha Limpa, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que a considerou aplicável apenas a partir das eleições de 2012 não permite que assumam seus mandatos imediatamente. Como a legislação processual privilegia o princípio da individualização dos litígios, seguindo a tradição liberal do direito brasileiro, cada um dos recursos de candidatos barrados pela Lei da Ficha Limpa terá de ser julgado individualmente pelo STF.

Por isso, a decisão tomada pela Corte na última quarta-feira, com base no voto desempate do ministro Luiz Fux, vale somente para a parte interessada no processo julgado naquela sessão. Trata-se do candidato a deputado à Assembleia Legislativa de Minas Gerais, Leonídio Bouças. Considerado ficha-suja pela Justiça Eleitoral, por ter sido condenado por improbidade administrativa, ele obteve 41,8 mil votos nas eleições de 3 de outubro.

Os 29 candidatos que também recorreram ao STF, questionando a data de entrada em vigor da Lei da Ficha Limpa e contestando a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de negar sua diplomação, com base nesse texto legal, terão assim de aguardar a vez do julgamento de suas ações. Isso também vale para os candidatos que aguardam julgamento de recursos na última instância da Justiça Eleitoral.


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Graças ao precedente aberto pelo STF, todos já sabem de antemão que irão assumir seus mandatos. Mas, como afirmou o presidente do TSE, Ricardo Lewandowski, a data da posse de cada um deles vai depender da inclusão de seus processos nas pautas de votação do TSE e do Supremo. ¨E esse é um processo que demorará um certo tempo, pois o julgamento não é imediato¨, diz o ministro. Ele também deixou claro que os políticos barrados pela Lei da Ficha Limpa que não entraram com recurso no STF, após o pleito de outubro, não mais poderão fazê-lo.

Os problemas da Lei da Ficha Limpa não se esgotam nas discussões sobre o alcance da decisão tomada pelo STF na quarta-feira nem sobre seu impacto na mudança na distribuição das cadeiras no Congresso e nas Assembleias Legislativas. Eles vão muito além, pois esse texto legal - fruto de um bem-intencionado projeto de iniciativa popular, que recebeu 1,6 milhão de assinaturas - tem redação confusa, peca por falta de precisão conceitual e carece de rigor jurídico.

Por isso, embora o Supremo tenha reconhecido que a Lei da Ficha Limpa é constitucional, a ponto do ministro Luiz Fux tê-la classificado como ¨lei do futuro¨, nada impede que políticos, partidos e até entidades de classe questionem cada uma de suas alíneas e parágrafos, antes das eleições de 2012.

¨A lei vai ser fatiada como salame, o que poderá levá-la a ser ainda mais esvaziada¨, afirma Lewandowski, antevendo as discussões jurídicas no STF. Alguns ministros, por exemplo, consideram exagerada a inelegibilidade por 8 anos, prevista pela da Ficha Limpa. Outros ministros alegam que a Justiça Eleitoral só pode negar registro a candidatos condenados pela ultima instância do Judiciário - e não por tribunais de segunda instância, como prevê a Lei da Ficha Limpa. Segundo esses ministros, a lei colide com o princípio da presunção de inocência, segundo o qual ninguém pode ser considerado culpado até o final do processo. E há, ainda, quem questione a retroatividade da lei - no caso, o conceito de ¨vida pregressa¨, que é fundamental para o efeito moralizador da lei. ¨Se você puder apanhar fatos da vida passada para atribuir efeitos futuros, talvez não haja mais limites¨, diz o ministro Gilmar Mendes.

Diante da importância da Ficha Limpa para a moralização da vida pública e do risco de que seja inteiramente esvaziada por uma profusão de ações judiciais contra pontos específicos, a Ordem dos Advogados do Brasil anunciou que irá entrar com uma ação direta de constitucionalidade - o que permitirá ao STF escoimar todas as inconstitucionalidades da Lei de uma só vez e estabelecer o definitivo alcance de suas regras e punições.

  

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