Saiu Mao, entrou o dinheiro 15/04/2011
- Clóvis Rossi*
Imagine a Costa do Sauípe, o Costão do Santinho, Cancún, Acapulco, Miami, Caribe. Some tudo. Multiplique por dois. Pronto, você acaba de ter uma ideia de como é Sanya, no extremo Sul da China, um balneário de 580 mil habitantes que este ano abrigou a cúpula dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, recém-incorporada).
É, digamos assim, a versão Disneyland da nova China. Todas as grandes grifes do mundo hoteleiro têm aqui complexos gigantescos, como convém ao país mais populoso do mundo. Neon para tudo quanto é lado, aquela riqueza emergente que no Brasil é folclorizada, mas aqui é valorizada.
Tão valorizada que o editor-assistente do 'China Daily', um dos incontáveis jornais chapa-branca (não há outra cor na mídia chinesa), escreveu uma coluna para dizer que 'ficar rico rapidamente não é a mensagem certa'.
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Se você é do tempo em que China era associada a Mao Tse-Tung e a um certo jeito espartano de ser (pelo menos para consumo externo), ficará chocado de ver que é necessária essa lição de moral.
Chen Weihua, o colunista, lamenta o culto ao dinheiro, 'que era abominado no país apenas 30 anos atrás', mas que se tornou 'profundamente enraizado em nossa sociedade atual'.
O jornalista não fala apenas com base em impressão pessoal. Cita pesquisa do instituto Ipsos que constatou que os chineses adoram o dinheiro mais que os norte-americanos.
Continua o texto: 'Por anos, os queridinhos da mídia têm sido homens de negócios bem sucedidos que fizeram fortuna rapidamente, apesar do fato de que alguns provavelmente ganharam dinheiro poluindo o ambiente, explorando trabalhadores e até mesmo alegadamente subornando funcionários'.
Lembra bem a propaganda de algumas ONGs contra os chamados 'gatos gordos' do mundo empresarial.
Pena que o colunista tenha omitido que explorar trabalhadores é fácil na China, porque não existe direito de greve.
O culto ao dinheiro só é equiparável ao culto à segurança. É tão pesado que gera incidentes até bizarros.
Antes da chegada da presidente à Sanya, a segurança chinesa quis ocupar cinco dos apartamentos contíguos à suite presidencial no Marriott. A segurança brasileira protestou porque esses quartos são, sempre, reservados para a entourage presidencial (médico, chefe da segurança, do cerimonial, enfim o aparato que acompanha deslocamentos do governante, seja qual for).
Os chineses concordaram mas um ajudante de ordens do general Amaro, novo chefe da segurança, desconfiou e ordenou a seus subordinados uma revista nos quartos. No que estava reservado exatamente para o general, os seguranças deram de cara com um chinês dormindo na cama que seria do general.
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*Clóvis Rossi é repórter especial e membro do Conselho Editorial da Folha de S.Paulo