A improvável reforma política 16/04/2011
- O Estado de S.Paulo
Na quarta-feira, a comissão de senadores encarregada de apresentar propostas para a reforma política entregou ao presidente da Casa, José Sarney, dentro do prazo estipulado de 45 dias, o resultado de seu trabalho. Os deputados, que também formaram uma comissão especial com o mesmo objetivo, têm prazo até setembro para apresentar suas sugestões. A partir daí o Congresso Nacional terá condições de discutir e votar todas as matérias relacionadas com a reforma. Pouca gente acredita que haja tempo suficiente para que todas as novidades sejam aprovadas pelos congressistas ainda este ano, para que possam valer já para as eleições municipais do ano que vem. Na melhor das hipóteses entrarão em vigor em 2012 algumas medidas de menor impacto, que suscitam menos divergências, pois a tendência é de que as questões mais polêmicas acabem sendo empurradas com a barriga. Mas, desde já, o que se sabe é que senadores e deputados aprovarão apenas as reformas que atenderem aos seus interesses eleitorais. Não se pode esperar muito mais de um Parlamento comandado pelo coronelismo e dominado por uma base de apoio ao governo determinada a, não importa a que preço, consolidar e perpetuar sua hegemonia.
Dos 15 itens aprovados pelos senadores, 7 tratam de regras gerais do processo eleitoral. Outros 4 tratam da alteração das regras para as eleições de deputados federais e estaduais ou distritais e vereadores. Como era de esperar, estão entre estas últimas a reforma na qual o PT tem maior interesse: a adoção do sistema proporcional com lista fechada. Isto significa que seria mantido o sistema pelo qual as bancadas parlamentares são compostas proporcionalmente à quantidade de votos que o partido obtiver em cada eleição, mas o eleitor não poderia mais votar em nomes, em candidatos específicos. Cada partido apresentaria uma lista de candidatos na ordem em que deveriam ser eleitos. Se obtivesse votação suficiente para eleger, por exemplo, dez candidatos, estariam eleitos os dez primeiros nomes da lista.
O casuísmo dessa novidade salta aos olhos. Ela atende aos interesses do PT, que tem a maior bancada na Câmara e lidera, sempre priorizando suas próprias conveniências, a aliança partidária que constitui uma base solidamente hegemônica de apoio ao governo. A manutenção dessa hegemonia é vital para o projeto político a longo prazo dos petistas, que alguns analistas consideram semelhante ao do Partido Revolucionário Institucional mexicano, que perdurou 70 anos graças a um sistema político-eleitoral aparentemente democrático que foi definido pelo escritor peruano Mario Vargas Llosa como uma "ditadura perfeita".
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Um dos argumentos usados pelos petistas na defesa do novo sistema proporcional é o de que a lista fechada acaba com o personalismo nas eleições parlamentares, valorizando as legendas partidárias e seus programas. O ex-presidente Fernando Henrique, em recente artigo sobre o papel das oposições no Brasil, fulminou esse argumento ao perguntar se alguém tem alguma dúvida de que as listas do PT serão apresentadas como "a lista do Lula".
A julgar pelo modo como transcorreram os trabalhos na Comissão de Reforma Política do Senado, apesar de a reforma política ser considerada uma necessidade inadiável pela unanimidade dos políticos, não há consenso sobre nenhuma questão específica, o que sugere que a discussão sobre o assunto ainda vai longe. O presidente da comissão, senador Francisco Dornelles (PP-RJ), não deixou dúvidas sobre as divergências no pronunciamento que fez ao entregar o relatório dos trabalhos ao presidente da Casa: "Não há um único senador da comissão que concorde com todas as propostas aprovadas. Talvez exista aquele que discorde de todas, mas todas elas foram acolhidas pela maioria".
De acordo com o que foi determinado por Sarney na ocasião, até 20 de maio todas as sugestões da comissão deverão ser transformadas em projetos de lei ou em projetos de emendas à Constituição. Restará, então, saber o que terão os deputados a dizer sobre o assunto.