A questão das MPs 17/04/2011
- O Estado de S.Paulo
Dadas as suas conhecidas pretensões políticas, relativas às eleições presidenciais de 2014, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) escolheu algumas questões institucionais como temas de seus discursos e pareceres, para reforçar sua imagem perante a opinião pública - e as primeiras reações da bancada situacionista mostram que a estratégia por ele adotada pode dar certo.
Nomeado relator de um projeto do senador José Sarney (PMDB-AP) sobre a tramitação de Medidas Provisórias (MPs), Aécio apresentou à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) um substitutivo que acaba com a eficácia imediata desse instrumento legal. Pelas regras em vigor, a MP que não for votada em 120 dias perde a validade. Além disso, após 60 dias, ela tranca a pauta da Casa em que estiver tramitando.
Desde a última legislatura, os senadores se queixam de que a Câmara - por onde se inicia o trâmite - costuma demorar para votar, consumindo quase todo o prazo de tramitação das MPs. Por isso, quando elas chegam ao Senado, os senadores têm de votá-la a toque de caixa, não havendo tempo hábil para discussões e apresentação de substitutivos. Os senadores também acusam os deputados de abusar da prerrogativa de apresentar emendas - penduricalhos ou contrabandos -, introduzindo matérias discrepantes dos temas originais das MPs.
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Para resolver o problema, o presidente do Senado apresentou um projeto que dá 55 dias de prazo de tramitação para cada uma das Casas Legislativas. E, se os senadores apresentarem emendas às MPs, a proposta de Sarney concede mais dez dias para exame final dos deputados. Além disso, o projeto mantém a eficácia imediata da MP.
No parecer que apresentou à CCJ, Aécio propõe que as MPs passem a ter força de lei apenas depois da aprovação da admissibilidade por uma comissão permanente de deputados e senadores. Pela proposta, a comissão teria três dias úteis para tomar a decisão, cabendo recurso ao plenário do Congresso. O substitutivo de Aécio também divide o prazo de tramitação - 60 dias na Câmara e 50 no Senado com 50 dias e mais 10 dias para o exame das emendas pelos deputados. Se não for votada nesse período, a MP perde a validade.
As MPs foram criadas pela Assembleia Constituinte para substituir os antigos decretos-leis do Executivo, que permitiam ao presidente da República legislar, passando por cima do Legislativo. Para enquadrar o Executivo, mas sem deixá-lo sem instrumentos legais para lidar com questões complexas e urgentes, a Assembleia Constituinte permitiu ao presidente da República assinar Medida Provisória nos casos de "relevância e urgência".
A ideia dos constituintes era que as MPs ficassem circunscritas somente a matérias econômicas e financeiras. Mas o instrumento é usado de modo abusivo pelos presidentes da República. Só no último ano de seu mandato, o presidente Lula assinou mais de 40 MPs - várias baixadas sob a justificativa de não deixar "assuntos pendentes" para sua sucessora. Em seu substitutivo, Aécio proíbe expressamente o uso de MPs para criação de cargos, empregos ou funções públicas, para criação de novos ministérios e para fusão ou desmembramento de órgãos públicos.
O substitutivo de Aécio tem por objetivo moralizar o uso das MPs e, como era de esperar, a bancada governista estrilou. "Com essa redação, é preferível extinguir a MP. Oposição que apresenta uma proposta dessa não espera ser governo tão cedo", disse o senador José Pimentel (PT-CE). Aécio classificou a crítica como "reação histriônica" e, para evitar que o debate se tornasse ainda mais acalorado, o líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), pediu vista do parecer.
A tensão dos líderes situacionistas deixou claro que o governo em hipótese alguma aceita a limitação de um instrumento jurídico que lhe permite legislar sobre qualquer matéria. E também mostrou que, se optarem por temas institucionais, os partidos de oposição podem fazer críticas oportunas, sérias e responsáveis.