Carga mais pesada 04/10/2011
- O Estado de S.Paulo
O aumento da carga tributária brasileira, de 33,14% do PIB em 2009 para 33,56% em 2010, uma variação de 0,42 ponto porcentual, talvez não tenha sido grande o bastante para impressionar parte dos contribuintes. Afinal, poderão argumentar os mais condescendentes com a voracidade do Fisco, o resultado de 2010 ainda é inferior ao recorde de 35,8% do PIB registrado em 2008, quando a carga aumentou 1,08 ponto porcentual sobre o resultado de 2007. Eles poderão lembrar também que, em 2009, como reflexo da crise global, algumas das atividades mais tributadas foram as que apresentaram pior desempenho, daí resultando a redução da carga de impostos naquele ano e sua "normal" recuperação em 2010, quando a economia brasileira teve um desempenho excepcional.
É preciso destacar, no entanto, que o cálculo da carga tributária em 2010, divulgado na semana atrasada pela Receita Federal do Brasil, reafirma o enorme peso dos tributos sobre a atividade econômica no País e mostra o reforço de duas características nocivas do atual sistema de impostos: o crescimento da arrecadação sempre mais rápido do que o da produção em condições econômicas normais e a concentração de recursos no governo central, em detrimento dos Estados e municípios.
Aos tributos contabilizados no estudo da Receita Federal sobre a carga tributária no País, os economistas José Roberto Afonso e Kleber Castro acrescentam outras receitas extraídas compulsoriamente da sociedade pelos três níveis de governo, como os royalties e as contribuições econômicas. Desse modo, chegam a números diferentes - e certamente maiores - daqueles apresentados pela Receita, mas que, igualmente, confirmam algumas das características mais nocivas do atual regime de impostos.
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Nos cálculos dos dois economistas, a carga tributária global alcançou aproximadamente R$ 1,3 trilhão, ou 35,16% do PIB no ano passado. Isso significou um custo médio por habitante de R$ 6.957,30. Na prática, cada brasileiro precisou trabalhar cerca de 130 dias do ano exclusivamente para o governo.
O estudo dos economistas também mostra que aumentou a fatia do governo central no bolo tributário. Do total arrecadado, a União foi responsável por pouco mais de R$ 876 bilhões, o que correspondeu a 67,9%, ou mais de dois terços, da arrecadação total. Os Estados arrecadaram 26,1% do total e os municípios, os restantes 6,0%. De 2009 para 2010, houve uma pequena redução nas fatias dos Estados e dos municípios e, consequentemente, um aumento na da União.
Como há transferências de recursos da União para os Estados e municípios, por meio dos respectivos fundos de participação e da distribuição de royalties, e também dos Estados para os municípios, sobretudo das cotas-parte do ICMS, a participação de cada nível de governo na receita líquida é diferente da fatia que cabe a cada um na receita bruta. Diminuem as fatias da União e dos Estados e cresce a dos municípios. Mas, mesmo assim, o que se constata é que, entre 2009 e 2010, cresceu a fatia da União (de 56,18% para 57,00% do total), o que resultou na redução das parcelas que ficaram com os Estados (de 25,29% para 24,75% do total) e dos municípios (de 18,53% para 18,25%).
A crescente concentração de receitas na União, tanto bruta como líquida, explica parte das também crescentes pressões de governadores e prefeitos sobre o governo federal por mais recursos e por facilidades na rolagem das dívidas renegociadas com a União e na contratação de novos empréstimos.
Não se justificam, porém, as pressões para a criação de um tributo para financiar o setor de saúde. Embora a União se aproprie de fatias crescentes do bolo tributário, o aumento da carga tributária produz receitas maiores para os três níveis de governos e o aumento da arrecadação como porcentagem do PIB, que deve se repetir em 2011, tem sido mais do que suficiente para produzir os superávits fiscais. E, se bem administrado, é bastante também para financiar as indispensáveis ações do governo na área social.