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O OUTRO LADO DA NOTÍCIA

Reservas e gastança
22/11/2011 - O Estado de S.Paulo

Para manter reservas de US$ 350 bilhões, o governo já gasta o equivalente ao superávit primário, o dinheiro destinado ao pagamento de juros da dívida pública. Ao chamar a atenção para esse dado, economistas do banco Crédit Suisse realimentam um velho debate: vale a pena acumular reservas tão volumosas e a um custo tão alto? Críticas à política oficial já eram publicadas quando o estoque de moeda estrangeira ainda estava em torno de US$ 200 bilhões. O governo respondia alegando razões de segurança e comparando a posição brasileira com a da China e outros emergentes, detentores de volumes muito maiores de reservas.

A questão é mais complicada do que pode parecer inicialmente. De fato, gasta-se muito para manter um grande volume de ativos monetários aceitos na maior parte dos mercados, como dólares, euros e ouro. Mas o custo de não dispor desses ativos pode ser muito maior, num momento de crise externa. Além disso, é preciso discutir por que o custo dessa política é tão alto para o contribuinte brasileiro.

Para começar, ninguém pode dizer com segurança qual o volume ideal de reservas. Para responder a essa questão, especialistas levam em conta vários números - meses de importação, dívida externa de curto prazo e a proporção entre a moeda estrangeira e os meios de pagamentos. Não há resposta segura. Num quadro de muita insegurança, o país precisará de reservas não só para pagar as importações e o serviço da dívida, mas também para financiar as exportações e para atender à demanda especulativa de moeda estrangeira. O Brasil e outros países latino-americanos já enfrentaram essa experiência várias vezes. Em 2008, quando a crise se espalhou pelo mundo rico e os financiamentos secaram, o Brasil estava preparado para a emergência.


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Em 15 de setembro, quando quebrou o banco Lehmann Brothers, o País dispunha de US$ 207,6 bilhões. O Banco Central (BC) pôs no mercado o necessário para enfrentar a emergência. Em um mês foram consumidos US$ 4,5 bilhões, mas no fim do ano o total havia voltado a US$ 206,8 bilhões. Também a especulação contra o real foi detida em pouco tempo e sem muita dificuldade.

A experiência da crise de 2008 é um excelente argumento a favor do governo. Se o País estivesse menos municiado para enfrentar os problemas, o estrago teria sido muito maior, tanto pela escassez de financiamentos quanto pela especulação cambial. As empresas teriam sofrido um abalo muito mais forte e, além disso, a inflação teria recrudescido.

O Brasil tem mais que o volume de reservas indicado como desejável pelos critérios habituais de medida, como cobertura de importações e serviço da dívida de curto prazo. Mas esses critérios pouco valem diante de grandes ondas de instabilidade. Além disso, o estoque brasileiro de reservas é relativamente modesto, quando se leva em conta o tamanho do Produto Interno Bruto (PIB). A relação reservas/PIB equivalia a 13,8% do PIB no fim do ano passado, segundo o relatório do Crédit Suisse. A média latino-americana era de 15,1%. A média da Rússia e das economias emergentes da Ásia era muito maior, 56,4%.

O custo de manutenção é um problema real, mas é explicável não pelo volume de reservas, e, sim, pelo nível de juros do Brasil. Quando compra dólares no mercado, o BC emite reais. O efeito inflacionário da emissão é neutralizado com a venda de títulos do Tesouro. Para encontrar tomadores para esses papéis o governo paga juros bem maiores que a remuneração obtida com a aplicação dos dólares em títulos no exterior (só se pode aplicar esse dinheiro em ativos com a máxima segurança e, portanto, com rendimento baixo).

O problema seria muito menor se os juros brasileiros fossem mais próximos daqueles em vigor em outros países. O BC começou a baixar os juros e novos cortes poderão ocorrer nos próximos meses. Mas essa política tem limites e seria enorme irresponsabilidade conduzi-la de forma voluntarista. O principal fator determinante do custo do crédito, no Brasil, ainda é o desajuste das contas públicas, decorrente do excesso de gastos. O problema não está no volume de dólares, mas na gastança federal. Criticar a política de reservas é mirar o alvo errado.

  

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