Licença demorada e cara 30/03/2012
- O Estado de S.Paulo
Não se conhecem valores precisos, mas certamente é alto o preço que, sem saber, o brasileiro paga pelo atraso nas obras de infraestrutura em razão da demora na concessão do licenciamento ambiental indispensável para sua execução. Em outubro do ano passado, o Ministério do Meio Ambiente publicou várias portarias que simplificam e aceleram o andamento dos processos de licenciamento dessas obras, mas os problemas acumulados pelos atrasos anteriores continuam a afetar muitos projetos, encarecendo-os.
Entre a decisão de iniciar uma obra no setor elétrico e a obtenção da licença prévia (a primeira de três exigidas até o início de operação do empreendimento) decorre em média um período de 958 dias - mais do triplo do prazo máximo de 285 dias estipulado para o órgão ambiental autorizar ou não o projeto -, de acordo com estudo do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE) que o Estado (18/3) noticiou. A emissão da licença de operação, a última das três exigidas, demora em média 2.355 dias, ou seis anos e meio.
Em todo o mundo, a realização de grandes projetos empresariais, de infraestrutura ou de outra natureza está condicionada à observância de regras ambientais cada vez mais rigorosas. A realização da Rio + 20 em junho, com a participação de centenas de líderes mundiais, deverá estimular as ações nesse sentido, pois seu tema principal será o desenvolvimento sustentável, que busca não comprometer o patrimônio ambiental das futuras gerações.
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No Brasil, no setor de energia, no entanto, surgiram muitos obstáculos à tarefa de compatibilizar o desenvolvimento com preservação ambiental. "Virou um processo muito complexo, com uma legislação cheia de furos e vazios", disse ao Estado o consultor Abel Holtz, que elaborou o estudo Agenda Ambiental junto com Adriano Pires.
Mais de 70% dos 428 projetos licitados ou autorizados entre 2008 e 2010 na área de energia não começaram a ser executados, de acordo com estimativa de Holtz, e um dos principais motivos é a questão ambiental. Alguns investidores já desistiram do projeto e solicitaram às autoridades a devolução da concessão que receberam.
Em certos casos, o atraso da concessão se deve aos próprios interessados, por causa da baixa qualidade dos documentos (Estudos de Impacto Ambiental e Relatórios de Impacto Ambiental) por eles apresentados aos órgãos oficiais. Em geral, porém, a demora se deve às dificuldades que surgem ao longo de um processo burocratizado e lento pela falta de qualificação do pessoal incumbido de analisar os casos, escassez de técnicos, influência de fatores políticos ou ideológicos no exame dos relatórios ambientais, superposição de funções entre órgãos públicos e até a judicialização do processo, pelo Ministério Público.
Dependendo da natureza do projeto e da localização do empreendimento, o licenciamento pode depender da avaliação de cinco órgãos do governo federal (fora as instituições estaduais e municipais). Se o projeto estiver em área indígena, o aval da Funai é indispensável. Em áreas habitadas por quilombolas, o processo terá de passar pela Fundação Cultural Palmares. Na parte arqueológica, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) terá de ser consultado. Nas áreas de doenças endêmicas, é indispensável ouvir o Ministério da Saúde. Em qualquer dos casos, a autorização final sempre será do Ibama.
A autorização pode vir acompanhada de condicionantes, ou seja, das compensações ambientais ou sociais impostas pelo órgão ambiental. Tudo isso eleva o custo do projeto. "Os custos da incerteza regulatória aumentam o orçamento dos programas socioambientais, representando quase 30% de todo o valor do empreendimento. E o orçamento final pode chegar a 50% acima dos valores iniciais previstos nos estudos de viabilidade", diz o estudo da CBIE.
Além de onerar o projeto, impondo custos adicionais aos consumidores, que pagarão a conta, o atraso do licenciamento ambiental trava o crescimento do País.