Numa tentativa de encurralar o governo e assustar a opinião pública, o Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) intensificou nesta semana as transgressões da lei e os tumultos que o caracterizam, ocupando instalações do Ministério do Desenvolvimento Agrário, sedes do Incra em cinco Estados, realizando 38 invasões de terras em 15 Estados e bloqueando rodovias, postos de pedágio e as entradas de acampamentos de assentados. É o "abril vermelho" que se repete, visando claramente a dar uma demonstração de força em uma fase em que o Movimento passa por uma crise interna, com dissidências na cúpula e perda cada vez maior de militantes.
O MST está longe de ter a influência política de que desfrutava no governo Lula, mas ainda conta com a leniência das autoridades. O ministro da Secretaria Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, disse que não haveria diálogo enquanto o Ministério e as sedes do Incra não fossem desocupadas. Prometeu que, consumada a desocupação, "vamos fazer de tudo para atender às reivindicações justas deles".
É simplesmente inadmissível que próprios do Executivo sejam tomados por arruaceiros sem que encontrem a oposição imediata e enérgica das forças policiais, para o restabelecimento da ordem pública. Democracia e liberdade de manifestação não podem, de forma alguma, ser confundidas como incapacidade do governo de defender-se, de modo a permitir que os órgãos públicos funcionem normalmente, sem danos ao patrimônio da União. Não pode o governo ficar na dependência da concessão, pela Justiça, de mandado de reintegração de posse para recuperar prédios públicos. O Estado de Direito também requer que seja obedecido o processo previsto em lei para destinação de terras à reforma agrária.
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Na realidade, se o MST estivesse disposto a negociar poderia tê-lo feito sem promover distúrbios ou invasões. Foi somente depois de ter invadido o Ministério e outros órgãos que o MST pediu audiência à presidente Dilma Rousseff, que não os recebeu e não há motivo para que o faça. A presidente já deixou claro que não considera que a simples distribuição de terras seja a solução para a questão agrária. Seu governo, como ela afirmou, será orientado para dar "condições para o desenvolvimento das populações que acessem essas terras". E a agitação fomentada pelo MST é declaradamente uma represália a um corte de 60% a 70% das verbas do Incra destinadas a desapropriações, feito para conter gastos.
Para João Pedro Stédile, líder do MST, "a presidenta está mal assessorada. Aliás, ela até já percebeu e até trocou o ministro do Desenvolvimento Agrário. Melhorar os assentamentos é uma coisa. Outra é desapropriar para beneficiar as famílias sem terra". O fato é que a ênfase da política agrária era a distribuição de terras, sem uma assistência adequada para melhoria de vida dos assentados para tornar os lotes a eles destinados mais produtivos, não se limitando à agricultura de subsistência.
Como assinalou Xico Graziano, ex-secretário de Agricultura do Estado de São Paulo e ex-presidente do Incra, em artigo publicado neste jornal (17/4), o Brasil é campeão em desapropriação de terras para fins de reforma agrária, mas está nas últimas colocações no mundo em termos de eficácia dessa política. "A qualidade dos assentamentos rurais configura um fracasso de política pública. Fora as exceções de praxe, verdadeiras favelas rurais se espalharam pelo País", acrescentou.
O MST reclama a melhoria dos assentamentos e maior apoio a programas educacionais, mas o foco do "abril vermelho", como em anos anteriores, continua sendo a invasão de fazendas produtivas onde grupos organizados armam suas barracas e consumam o esbulho. Em Sandovalina, no Pontal do Paranapanema, por exemplo, uma fazenda foi ocupada pela 18.ª vez, obrigando os proprietários a recorrer, como de hábito, à Justiça, que deu prazo de 48 horas para os invasores se retirarem. Decisões semelhantes são esperadas em outros Estados.