Bate-boca constrangedor 21/04/2012
- O Estado de S.Paulo
As respostas do ministro Joaquim Barbosa às críticas que lhe foram feitas pelo ministro Cezar Peluso, um dia antes de deixar a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF), lançaram mais luz sobre um cenário que o grande público supunha preservado de lavagens públicas de roupa suja.
A história do STF, que acumula as competências de corte constitucional e de tribunal de última instância, sempre registrou as mais variadas desavenças entre seus integrantes, mas elas eram travadas a portas fechadas ou por floreios retóricos nas sessões plenárias - e não sob a forma de trocas de insultos através da mídia. As críticas de Peluso foram feitas em entrevista concedida ao site Consultor Jurídico, e as respostas de Barbosa, que é o relator do processo do mensalão e assumirá a direção do Supremo em novembro, sucedendo ao ministro Ayres Britto, foram dadas em entrevista ao jornal O Globo de sexta-feira.
Na saraivada de críticas que disparou contra a presidente da República, a corregedora Nacional de Justiça, o senador Dornelles e colegas de corte, Peluso afirmou que Barbosa tem ambições eleitorais, razão pela qual julgaria os processos mais com base em motivações políticas do que jurídicas. Na mesma entrevista, o ex-presidente do Supremo também disse que Barbosa "é dono de temperamento difícil" e o classificou como "inseguro", motivo pelo qual se ofenderia com "qualquer coisa".
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Em resposta, Barbosa chamou Peluso de "ridículo", "brega", "caipira", "corporativo", "desleal", "tirano", "desastroso" e "pequeno". "Uma universidade francesa me convidou a participar de uma banca de doutorado em que se defendera uma excelente tese sobre o STF e seu papel na democracia brasileira. Peluso vetou que me fossem pagas diárias durante os três dias de afastamento, ao passo que me parecia evidente o interesse da Corte em se projetar internacionalmente, pois, afinal, sua obra estava em discussão. Inseguro, eu?", retrucou Barbosa.
Além de comparar seu currículo acadêmico com o de Peluso, o ministro Joaquim Barbosa o acusou de praticar "supreme bullying" contra ele, por conta dos problemas de saúde que o levaram a sofrer uma cirurgia no quadril e a se afastar para tratamento médico, e de plantar fofocas na imprensa sobre suas condições físicas. Afirmou, ainda, que nas sessões plenárias o ex-presidente do Supremo manipulava regras e violava dispositivos regimentais de acordo com seus interesses, com o objetivo de impor sua vontade aos demais ministros nos julgamentos mais importantes.
"As pessoas guardarão na lembrança a imagem de um presidente do STF conservador, imperial, tirânico, que não hesitava em violar as normas quando se tratava de impor à força sua vontade. Dou exemplos. Peluso inúmeras vezes manipulou ou tentou manipular resultados de julgamentos, criando falsas questões processuais simplesmente para tumultuar e não proclamar o resultado que era contrário ao seu pensamento. Lembre-se do impasse nos primeiros julgamentos da Lei da Ficha Limpa, que levou o tribunal a horas de discussões inúteis. Peluso também não hesitou em votar duas vezes num mesmo caso, o que é inconstitucional, ilegal e inaceitável", disse Barbosa, referindo-se ao julgamento que livrou Jader Barbalho da Lei da Ficha Limpa.
Na entrevista ao Consultor Jurídico, Peluso afirmou que uma de suas realizações, em dois anos de gestão, foi ter apaziguado o Supremo e acabado com as tensões e discussões entre os ministros. Barbosa refutou-o, acusando-o de ter "incendiado" não apenas a mais importante Corte do País, mas "o Poder Judiciário inteiro, com sua obsessão corporativista". Barbosa, evidentemente, referia-se ao embate de Peluso contra a corregedora Nacional de Justiça, Eliana Calmon, e ao recurso impetrado pela Associação dos Magistrados Brasileiros com o objetivo de esvaziar as prerrogativas do Conselho Nacional de Justiça. A entidade é chefiada por um desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, onde Peluso atuou por quase duas décadas.
O bate-boca entre Peluso e Barbosa em nada dignifica o Supremo.