Mais dos mais ricos 24/04/2012
- Celso Ming - O Estado de S.Paulo
Toda crise financeira apresenta à sociedade uma enorme conta a pagar. E o primeiro impulso é sempre cobrar mais dos mais ricos. O problema é que não é fácil colocar em prática um projeto que, muitas vezes, traz mais prejuízos do que benefícios.
O argumento de que é preciso reduzir a desigualdade de renda por meio de tributação mais justa retorna sempre ao debate público, especialmente em temporadas eleitorais, quando o objetivo de uma corrente é caracterizar o adversário como “o candidato dos ricos”.
Nessas duas semanas, por exemplo, planos de cobrar ainda mais dos mais ricos sofreram duas derrotas, uma em cada lado do Atlântico.
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Dia 17, foi rejeitado no Senado dos Estados Unidos encaminhamento de projeto de lei defendido pelo presidente Barack Obama que impõe alíquota de 30% no Imposto de Renda cobrado dos contribuintes que obtêm o equivalente ou mais de US$ 1 milhão de renda anual. E na França, diante da forte probabilidade de vitória no segundo turno do socialista François Hollande, que também quer cobrar mais impostos dos endinheirados, há notória fuga de capitais para países vizinhos – efeito que o próprio Hollande provavelmente não quisesse provocar.
A proposta do presidente Obama está sendo chamada de Regra Buffett, em alusão ao bilionário americano Warren Buffett – o primeiro a defender a cobrança de mais impostos sobre os super-ricos. Ele argumentou publicamente que sua própria secretária vem sendo mais esfolada pelo Fisco americano do que ele próprio.
Na França, François Hollande apresentou como proposta de governo a taxação em 75% das rendas anuais superiores a 1 milhão de euros. Bastou que as pesquisas o apontassem como favorito para que se verificassem as tais transferências de capitais para a Bélgica, Suíça, Londres e Luxemburgo.
Em geral, projetos desse tipo produzem mais complicações do que resultados práticos. Se a Regra Buffett fosse aprovada, o Tesouro americano não arrecadaria mais do que US$ 47 bilhões por ano. E, no entanto, o rombo orçamentário da União previsto para este ano fiscal é de US$ 1,3 trilhão para uma dívida pública de US$ 16,7 trilhões. Dentro do Partido Democrata, do presidente Obama, há dúvidas de que esses US$ 47 bilhões adicionais valham o preço do desgaste político.
Na França, os cálculos são de que a mordida na renda dos riscos não atingiria mais do que 3 mil pessoas e só aumentaria em 300 milhões de euros as receitas anuais da França – uma gota d’água no atual déficit de 100 bilhões de euros anuais do seu orçamento e de sua dívida pública, hoje de 1,6 trilhão de euros.
Um dos principais assessores de Hollande chegou a reconhecer à agência Reuters que a alíquota de 75% do Imposto de Renda sobre os mais ricos teria mais efeito simbólico do que prático.
Dada a evasão fiscal em curso somada à que provavelmente ocorrerá se o vencedor for Hollande, essa novidade geraria mais estragos do que benefícios para a economia da França.
Pelo seu baixo retorno e pelo seu potencial criador de atritos políticos também vem sendo abandonada em todo o mundo (mais ainda não no Brasil) a ideia de criar uma taxação especial sobre as grandes fortunas.
Razões do abalo
Foram dois os fatores responsáveis por derrubar a confiança dos mercados: (1) a vitória do candidato socialista François Hollande no primeiro turno das eleições para a presidência da França; e (2) o fracasso das negociações do primeiro-ministro da Holanda, Mark Rutte, na tentativa de garantir cortes no orçamento, o que o levou a entregar seu cargo à rainha Beatriz.