Vendas casadas e tarifas 17/05/2012
- O Estado de S.Paulo
O vice-presidente de varejo, distribuição e operações do Banco do Brasil (BB), Dan Conrado, admitiu que para ter direito a juros mais baixos, como o de 3,94% ao mês no cheque especial, os clientes têm de aceitar a cesta de tarifas do programa "Bompratodos". Embora o BB afirme que a cesta é opcional, a operação em tudo se assemelha à venda casada. Como tal foi denunciada pela associação de consumidores Pro Teste.
Entre os primeiros trimestres de 2011 e 2012, a receita de tarifas dos quatro maiores bancos de capital aberto (Banco do Brasil, Itaú-Unibanco, Bradesco e Santander) aumentou 17%, segundo reportagem do jornal Valor. O crescimento dessa receita superou o registrado nos dois anos anteriores, de 13% e 14%, respectivamente. "Minha percepção é de que eles (os bancos) vão calibrar mais nas tarifas, salvo em administração de fundos", declarou o analista João Augusto Frota Salles, da consultoria Lopes Filho, do Rio. No Itaú-Unibanco, a concessão de empréstimos com juros mais módicos depende da adesão a pacotes de 26% a 52% mais caros, segundo o jornal.
As tarifas cobradas dos depositantes são uma das mais importantes receitas dos bancos, já divulgadas nos principais sites do setor. O Banco Central (BC) publica os dados desde 2002 e a Federação Brasileira das Associações de Bancos (Febraban), desde 2007.
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A relação entre as receitas de serviços e as despesas com pessoal caiu de 138%, em 2009, para 135%, em 2011, mas voltou a elevar-se (a 142%), no último trimestre. Os bancos não estão proibidos de aumentar tarifas, mas, ao fazê-lo em seguida à ofensiva contra os juros, retiraram com uma das mãos o que deram com a outra. Tentaram recuperar, via tarifas, uma parte da receita perdida com o rebaixamento das taxas de juros.
Para assegurar a prestação de serviços básicos sem custos, o BC definiu, em 2008, uma nomenclatura de serviços e proibiu a prestação onerosa de atividades "essenciais", como o fornecimento de cartão de débito, quatro saques mensais no caixa da agência ou em caixa eletrônico; duas transferências mensais de recursos entre contas da mesma instituição; dois extratos por mês; uso do internet banking; compensação de cheques; e fornecimento de até 10 folhas de cheques por mês. Há dois anos, as regras foram alteradas para evitar artifícios.
"O pacote é por adesão, ele não é imposto a ninguém", disse o vice-presidente do BB. "Cada cliente vai analisar sua situação e ver se é bom para ele ou não." O pacote de serviços do BB tem um custo mais elevado (R$ 58,00 mensais, acima da média de tarifas cobradas dos clientes).
Na semana passada, o Banco do Brasil rebateu a acusação da associação de defesa do consumidor ProTeste, que havia acusado o banco de restringir parte dos benefícios anunciados a clientes que aderissem ao "Bompratodos". Em nota, o BB disse que "não pratica venda casada, já que não condiciona o fornecimento de qualquer produto ou serviço à aquisição de outro produto ou serviço, como estabelecido no Código de Defesa do Consumidor". O texto acrescenta que "oferecer condições diferenciadas conforme o grau de relacionamento do cliente é uma prática comercial que não fere preceitos legais". Mas o Pro Teste informou ter enviado ofício ao BC questionando a nota do banco.
A política de vendas casadas é, de fato, mais usual do que o desejado, provocando conflitos entre empresas e consumidores, por exemplo, na prestação de serviços de telecomunicações. No passado, era comum que os tomadores de crédito fossem "convidados" pelos gerentes a adquirir ações dos bancos.
A prática da venda casada é inadmissível numa instituição financeira, hoje. Para que a ofensiva contra os juros tenha um mínimo de êxito, ela não deve ser "compensada" com o aumento de tarifas, sob o risco de se tornar inócua. Ainda mais grave é quando isso se verifica na maior instituição federal, responsável, ao lado da Caixa Econômica Federal, pela execução da política de corte dos custos bancários.