Lewandowski agora decide apelar até à Revolução Francesa para impedir que STF casse mandatos… Erra no mérito e na história 07/12/2012
- Blog de Reinaldo Azevedo - Veja Online
Vamos tratar um pouco do mundo dos vivos e dos muito vivos. O ministro Ricardo Lewandowski, até a semana passada, vinha fazendo uma sólida carreira no terreno, vamos dizer assim, do jocoso.
Neste semana, ele decidiu ser também perigoso. Daqui a dois anos, Santo Deus!, o filho da amiga de Marisa Letícia vai presidir a corte. Se o Supremo não tomar cuidado, da mente divinal de Lewandowski sairá, o que há de assombrar o mundo pelo inusitado, deputado com direitos políticos cassados.
Nunca antes na história da galáxia se terá visto algo assim.
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Mais ainda: ele sugeriu ontem que, caso não sejam cassados por seus pares (na hipótese de triunfar seu ponto de vista), os ditos-cujos tenham uma licença especial (ou algo assim: ele quer um jeitinho) para participar das sessões legislativas, passando só a noite na prisão.
Entendi: de dia, eles votam leis; à noite, cumprem pena.
Se estiverem com seus mandatos, estarão também com as devidas prerrogativas, como participar de comissões e disputar cargos na Mesa.
João Paulo poderia passar o dia na Comissão de Constituição e Justiça, por exemplo, e, à noite, ser um apenado pela… Justiça!
Se a própria Câmara não tomar cuidado, Lewandowski inventará a figura do deputado-presidiário. Em seguida, será a vez, claro!, de inventar o presidiário-deputado.
Marcola e Fernandinho Beira-Mar já podem ir escolhendo o partido de sua preferência…
Se bem que escutas telefônicas feitas há alguns anos demonstram que o PCC, por exemplo, já fez a sua escolha.
Sim, senhores! O ministro Ricardo Lewandowski insistiu ontem em que a perda dos direitos políticos se distingue da cassação.
Digamos que se distingam como etapas diferentes de uma mesma reação química, compreendem?
Se alguém com direitos políticos suspensos não pode se candidatar porque lhe falta esse atributo que é requisito básico da representação, como pode um já representante ter retirado esse requisito e continuar a representar?
Trata-se de uma aporia evidente. A tese é insana.
“Ah, mas a Constituição delega aos parlamentares a cassação”. Eu insisto: não é assim, não.
Embora o texto constitucional, com efeito, crie confusão, o caminho da solução também está ali. Já expliquei por quê. Combinem-se os artigos 15 e 55, e se verá que bastará à Mesa da Câmara declarar a cassação.
Mais: o Artigo 37 cassa os parlamentares condenados por crimes de improbidade. É o caso.
Contradições absurdas
Posso ter entendido errado, mas acho que percebi certo alinhamento entre a ministra Carmen Lúcia, que preside o TSE, e Ricardo Lewandowski…
Que coisa! Os ministros que votaram a favor da tal Lei da Ficha Limpa decidiram que são inelegíveis pessoas condenadas por um colegiado – serve até conselho profissional, o que é uma barbaridade! –, antes da sentença ter transitado em julgado, quando ainda cabe recurso.
E agora dirão que o tribunal está impedido de cassar o mandato de parlamentares que, caramba!!!, perderam seus direitos políticos???
Ora, sem os ditos-cujos, uma pessoa não pode se candidatar, mas pode ser representante do povo?
Não nos façam, senhoras ministros e senhores ministros, passar essa vergonha no mundo!
“Ah, mas a Câmara pode cassar!” É… Mas também pode não cassar.
E aí? Num outro tema e apelando a outras leis, há o risco de vivermos a situação estapafúrdia do caso do assassino Cesare Battisti, que acabou ficando no Brasil – Tarso Genro talvez achasse que não temos homicidas em número suficiente circulando por aí…
O Supremo decidiu, por maioria, que a concessão de asilo que lhe foi dada era ilegal. Ora, se ilegal, então o asilo não vale; se não vale, então ele teria de ser extraditado.
Mas entrou a cascata de que extradição é prerrogativa do presidente da República. É, MAS ELE TEM DE AGIR SEGUNDO A LEI.
Aconteceu, então, o inusitado: se a Justiça decidiu que o asilo era ilegal, mas se a extradição, mesmo nessa circunstância, é ato soberano do presidente, então temos um presidente acima da lei.
Ora, se o Supremo cassou – e cassou!!! – os direitos políticos dos três deputados (consequência de sua condenação em última instância) e se a Câmara vai conservar o mandato de quem não tem direitos políticos, então teremos uma Câmara acima da lei.
A Revolução Francesa…
Os momentos mais profundos do ministro Ricardo Lewandowski são aqueles em que ele abandona a lei e faz digressões soltas, assim como quem está diante de guarnições de frango com polenta.
Na quarta, ele refletia sobre a pena supostamente longa de alguns réus… Dizia, com ar de desconsolo, que eram excessivas e simplesmente ignorava o fato de que há gente lá que foi condenada por oito crimes, por seis crimes.
A extensão da pena é decorrência do número de transgressões. Se o ministro acha que assim não pode ser, que não se deve atribuir pena a cada crime cometido (segundo a sua natureza), a hora é agora: renuncie ao Supremo, candidate-se a um cargo no Legislativo e vá lutar pelo Código Penal dos seus sonhos.
Nesta quinta, falando sobre a independência dos Poderes e coisa e tal, Lewandowski resolveu fazer uma leitura criativa da Revolução Francesa, afirmando que nem ela cassou mandatos e coisa e tal…
Uau! O Terror francês cassava mandatos junto com a cabeça de seus titulares. E nem o tarado do Robespierre – à diferença de Niemeyer, ele não era só um teórico do assassínio – escapou.
O historiador Lewandowski é uma lástima. Já atribuiu a Fídias o que o escultor jamais dissera. E agora, vemos, inventa uma Revolução Francesa de veludo…
Tese perigosa
Mas não falei ainda – só esbocei em outro post — o melhor do seu pior.
Na quarta, depois de Marco Aurélio ter inventado a sua jabuticaba penal – quase todos os crimes de mensalão estariam em mera continuidade delitiva, inclusive lavagem de dinheiro, o que é um assombro! –, ministros especularam sobre o efeito desastroso que isso poderia ter na primeira instância, por exemplo, muito especialmente, alertou o ministro Gilmar Mendes, nos vários processos derivados do, digamos, processo-mãe.
E aí Lewandowski falou um troço realmente do arco da velha. Segundo disse, o processo do mensalão era tão diferente e se deixava pautar por tantas heterodoxias (isso é falso) que ele achava que o que se decidisse ali pudesse virar jurisprudência!
Custa-me crer que tenha dito isso. Ora, e não viraria por quê?
Isso não depende da opinião que ele tem a respeito. Mas o pior vem agora: fosse como ele diz, aí, sim, observou o jurista Miguel Reale Jr., estaríamos diante de um julgamento de exceção.