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O OUTRO LADO DA NOTÍCIA

Um bando de incapazes capazes de tudo
02/06/2013 - Blog de Augusto Nunes n- Veja.com

Incumbida de identificar os responsáveis pelo sábado espantoso, a Polícia Federal já desperdiçou duas semanas com investigações tão necessárias quanto o Ministério da Pesca.

Alguns agentes gastaram tempo e verbas na perseguição à maquiavélica empresa de telemarketing que nunca existiu.

Outros seguem interrogando beneficiários do Bolsa-Família: querem saber por que sacaram antes da hora, mais precisamente no dia 18, o dinheiro depositado pela Caixa antes da hora – e colocado à disposição da freguesia pelo menos desde o dia 17.


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É como perguntar a uma vítima da seca por que bebeu mais cedo a água do carro-pipa que chegou mais cedo.

Escalado para impedir o esclarecimento do episódio, José Eduardo Cardozo tem interpretado com muita aplicação o papel de Inspetor Clouseau que fala dilmês.

“Não é um delito fácil de ser investigado por força da atuação difusa em todo o território nacional”, pontificou na primeira cena.

Na segunda, ficou alguns segundos em silêncio de sábio chinês antes de deslumbrar os jornalistas com a mistura de concisão e sagacidade: “Nenhuma hipótese pode ser descartada”.

Na terceira cena, Cardozo esvaziou o estoque de advérbios para emitir um parecer de sherloque doidão: “Evidentemente houve uma ação de muita sintonia em vários pontos do território nacional, o que pode ensejar a avaliação de que alguém quis fazer isso deliberadamente, planejadamente, articuladamente”.

Numa única frase, quatro palavras terminadas em “mente”. Quatro rimas pobres para gente que mente.

Se o governo efetivamente pretendesse desvendar a gestação da corrida aos guichês de pagamento da mesada, é na Caixa que a Polícia Federal estaria em ação.

Se os homens da lei quiserem de fato enquadrar vilões, é lá que estão homiziados.

A operação que terminou com um tiro no pé foi concebida e executada pelos diretores da instituição, todos nomeados ou mantidos no cargo por Dilma Rousseff.

Os companheiros da Caixa teriam evitado a onda de saques e sobressaltos se tivessem guardado uma gota do oceano de publicidade enganosa para comunicar aos interessados que a distribuição dos donativos fora antecipada.

Por motivos ainda ignorados, optaram pelo adjutório secreto.

Na sexta-feira, alguns clientes do Bolsa-Família descobriram que o dinheiro chegara antes da data aprazada.

Transmitiram a boa notícia a parentes, amigos e vizinhos, que passaram adiante a informação.

A coisa ganhou volume e o estouro da boiada aconteceu no dia seguinte.

Como o governo lulopetista jamais perde uma chance de acrescentar outro capítulo ao espetáculo do cinismo encenado há mais de dez anos, o Brasil que pensa foi afrontado durante cinco dias pelo recomeço da Ópera dos Malandros.

A procissão de mentiras foi aberta pelo presidente da Caixa, Jorge Hereda.

Caprichando na pose de pronto-socorro dos aflitos, ele jurou que tivera de montar um esquema de emergência para distribuir pelos postos de pagamento, ainda no sábado, os R$ 2 bilhões de maio.

“É algo absurdamente desumano”, encolerizou-se a presidente. “O autor desse boato é criminoso”.

Lula enxergou por trás de tudo a mão de “gente do mal”.

O ex-jornalista Rui Falcão ficou à beira do chilique com o “terrorismo eleitoral”.

A tuiteira Maria do Rosário acusou a “central de boatos da oposição” de espalhar rumores dando conta do fim iminente do maior programa oficial de compra de votos do mundo.

A verdade só escapou de mais assassinatos porque a Folha de S. Paulo provou que a liberação dos recursos do Bolsa-Família fora autorizada antes do sábado.

Desmascarada a farsa, Jorge Hereda apelidou a delinquência de “erro” e transferiu a culpa para um subordinado que teria decidido mudar a data do pagamento sem consultar o chefe.

Mesmo na mixórdia em que a Caixa se transformou desde que se subordinou a interesses político-partidários, ninguém ousaria montar uma operação bilionária sem o aval do presidente – que não se atreveria a endossá-la sem o amém da presidente.

Apesar disso, ou por isso mesmo, Dilma fez questão de comunicar à nação que nenhum dos envolvidos na história muito mal contada ficará desempregado.

“A diretoria é formada por técnicos íntegros e comprometidos com as diretrizes da CEF, com seus clientes e com os beneficiários de programas tão importantes para o Brasil como o Bolsa Família e o Minha Casa, Minha Vida”, avisou a nota oficial divulgada pelo Planalto.

Baiano de Salvador, o arquiteto e urbanista Jorge Hereda tem tanta intimidade com assuntos bancários quanto Lula com o plural.

Coerentemente, a equipe de “técnicos íntegros” que comanda produz proezas como a que inspirou a nota do jornalista Carlos Brickmann: No tumulto do Bolsa-Família, a Caixa descobriu que 692 mil famílias têm dois cadastros e recebem dois auxílios (talvez seja por isso que, como disseram à TV, haja quem compre jeans de R$ 300 para a filha e pingue mensalmente algum na poupança).

Custo do pagamento ilegal? R$ 100 milhões por mês.

“Nos governos do PT há os incapazes e os capazes de tudo”, afirmou o deputado Duarte Nogueira, presidente do PSDB paulista.

“Maria do Rosário talvez seja os dois tipos: uma incapaz capaz de tudo”.

O dirigente tucano teria formulado um diagnóstico irretocável se examinasse mais atentamente a fauna no poder.

Alguma degeneração genética provocou a fusão das duas categorias. Hoje só há marias-do-rosário. Todos são ineptos sem pudores nem limites.

A Polícia Federal pode dispensar-se de continuar investigando o que houve no sábado delirante. Foi só mais uma realização dos incapazes capazes de tudo.


  

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