A questão indígena 05/06/2013
- O Estado de S.Paulo
O conflito provocado pelos índios terena com a invasão da Fazenda Buriti, no município sul-mato-grossense de Sidrolândia - que no dia 31 provocou a morte de um dos invasores em circunstâncias ainda não devidamente esclarecidas -, começa a alastrar-se por todo o País e tende a agravar-se de maneira imprevisível. Já são mais de 60 as propriedades rurais ocupadas.
Estimulado pela repercussão do episódio, um grupo de 20 índios caingangue ocupou na segunda-feira a sede do Partido dos Trabalhadores (PT) em Curitiba, exigindo serem recebidos em Brasília para tratar da demarcação de terras no Paraná. Houve manifestações de protestos de indígenas também em Seara (SC) e em Paranaguá (PR).
Nada disso é novidade. Os indígenas repetem a radicalização, na forma da criação de fatos consumados, invariavelmente ao arrepio da lei, que o Movimento dos Sem-Terra praticou durante todo o governo Lula, sob o olhar complacente e, frequentemente, o estímulo do então chefe do governo. Os lamentáveis episódios de agora, portanto, são fruto do populismo irresponsável que há mais de 12 anos desmoraliza as instituições democráticas, disseminando a crença de que a lei - ora, a lei - só deve ser respeitada quando convém a um difuso "interesse social" habilmente manipulado pelos poderosos de turno.
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A triste realidade ilustrada pela disputa por uma terra que uma hesitante Justiça não consegue decidir a quem pertence é o resultado da incapacidade ou falta de coragem do Executivo de conduzir politicamente o conflito, de modo a criar as bases técnicas e legais de um entendimento que possibilite a acomodação dos interesses em choque - de um lado, os da população indígena, e de outro, o dos produtores rurais.
No centro do conflito, a Fundação Nacional do Índio (Funai), perdida entre a antropologia e a ideologia, tem seu trabalho contestado pelos produtores rurais e as associações que os representam, e defendido pelos "progressistas", pela CNBB e pela Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo. Percebendo a vulnerabilidade do órgão responsável pela coordenação da política indigenista, o governo defende agora a ampliação do elenco dos responsáveis pela formulação dessa política - e recebe críticas de quem não quer que as coisas mudem.
"As soluções existem, falta decisão política", é a opinião insuspeita do senador petista Delcídio Amaral, que tem participado de reuniões sobre o assunto no Palácio do Planalto e garante que "não foi por falta de aviso" que se criou o atual impasse a partir da ocupação da Fazenda Buriti.
A opinião do senador petista é compartilhada pelo presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso do Sul, Eduardo Riedel, para quem a ausência de vontade política do governo federal "é determinante" para a falta de uma solução para o conflito. Por sua vez, a Confederação Nacional da Agricultura e Agropecuária (CNA) entende que "é mais do que hora de o governo federal suspender o processo de demarcação de terras indígenas, conduzido de modo arbitrário, e frequentemente ilegal, pela Funai, e aguardar que o STF estabeleça em definitivo o regime jurídico de demarcações de terras indígenas no País".
A evidenciar a incapacidade do governo de tratar competentemente a questão indigenista está o fato de que o conflito de Sidrolândia se arrasta há 13 anos, ao longo dos quais, pela ausência de referências sólidas do ponto de vista histórico, antropológico e legal, se alternaram decisões judiciais contraditórias. E é nesse vácuo que a radicalização prospera, de lado a lado, deixando atônita, no meio do tiroteio, a ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, que parece hesitar entre duas prioridades: o cumprimento de seu dever como articuladora política e a viabilização de sua candidatura ao governo do Paraná.
Menos mal que, desde a posse, a presidente Dilma tem evitado escrupulosamente repetir o exemplo de seu antecessor em manifestações públicas de apoio às tropelias de movimentos ditos sociais.