Dilma resolveu ter outra grande ideia 06/07/2013
- Blog de Reinaldo Azevedo - Veja.com
A presidente Dilma Rousseff precisa estudar o funcionamento da teia de aranha. Se os bichos que caem na armadilha tivessem ciência da coisa, tentariam, com todo cuidado, sem afobação, pata ante pata, livrar-se do enrosco.
O maior inimigo da presa é o próprio desespero. O maior amigo da aranha é o desespero da vítima. Ela se debate sem método e, aí, adeus!
Enrosca-se toda e fica atada. Se a teia não estivesse lá, claro!, o aracnídeo ficaria sem o seu almoço.
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Essa fábula, portanto, tem um componente objetivo. Mas também tem um subjetivo: a única chance da presa era ter método.
Sim, minha alegoria é clara: Dilma, hoje, é a presa; a rede de descontentamentos — muitos deles opostos, mas combinados — é a teia, e a aranha é a realidade, devoradora de reputações.
A presidente não tem nem contra quem vituperar. Não foram, por exemplo, as oposições a lhe aprontar uma armadilha.
Ao contrário. Durante muitos anos, elas driblaram o confronto.
O estopim da crise, como se sabe, está na tentativa do PT de criar o baguncismo em São Paulo, embarcando na tese de meia dúzia de alopradinhos que resolveram implementar o socialismo no Brasil a partir da catraca.
O resto ainda é história a ser devidamente contada, mas o fato é que a bomba foi explodir com maior potencial destrutivo lá no Palácio do Planalto.
Dilma tinha de reagir. Eu mesmo a convidei a tanto aqui.
Em vez da coisa certa, fez a errada. Em vez de tentar se desenroscar pé ante pé, começou a se debater sem método.
Tentou jogar a confusão no colo do Congresso, com a sua aloprada e inconstitucional proposta de Constituinte.
Não deu!
Esperneou um pouco mais e passou a falar em plebiscito, procedendo a uma descabida consulta ao TSE — essa não é uma de suas atribuições —, enviando ao Congresso, imaginem só!, a pauta.
Falhou de novo.
Acuada, amuada, brava porque ninguém a defende, decidiu, então, que é hora de atropelar o Legislativo pra valer.
Nada de suavidade.
Quer agora buscar o calor das ruas.
Nesta sexta, decidiu se reunir com o MST, cuja popularidade, no Brasil, certamente é inferior à sua própria, para pedir mobilização popular.
Também apelou às centrais sindicais, especialmente CUT e Força Sindical.
Todos garantiram que vão ocupar as ruas em favor de um plebiscito.
Não existe milagre nessas coisas. Um plebiscito só pode ser convocado por iniciativa de um terço de uma das Casas do Congresso, e as duas têm de aprovar.
A Justiça Eleitoral só pode dar início às formalidades da consulta quando estiver tudo acertado.
A partir daí, informou, são necessários 70 dias. Dilma e a torcida do Corinthians sabem que não há tempo para isso.
O governo fala, então, em engrossar o movimento em favor de um projeto de lei de iniciativa popular, como defendido por OAB e por um tal Movimento Contra a Corrupção…
Então vamos ver.
Mesmo a consulta popular não é a Casa-da-Mãe-Dilmona…
Está regulamentada pela lei 9.709. O Artigo 13 dessa lei é claro:
“Art. 13. A iniciativa popular consiste na apresentação de projeto de lei à Câmara dos Deputados, subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles.”
É chato ter de convidar a presidente a ler a Constituição, mas algumas das questões que seriam matéria de plebiscito são… CONSTITUCIONAIS. E só podem ser mudadas por EMENDAS.
Ocorre que a tal “iniciativa popular” não pode emendar a Constituição, atribuição exclusiva, também por determinação constitucional, dos senhores deputados e senadores.
A título de exemplo, reproduzo os artigos 45 a 46 da Carta:
Art. 45. A Câmara dos Deputados compõe-se de representantes do povo, eleitos, pelo sistema proporcional, em cada Estado, em cada Território e no Distrito Federal.
§ 1º – O número total de Deputados, bem como a representação por Estado e pelo Distrito Federal, será estabelecido por lei complementar, proporcionalmente à população, procedendo-se aos ajustes necessários, no ano anterior às eleições, para que nenhuma daquelas unidades da Federação tenha menos de oito ou mais de setenta Deputados. (Vide Lei Complementar nº 78, de 1993)
§ 2º – Cada Território elegerá quatro Deputados.
Art. 46. O Senado Federal compõe-se de representantes dos Estados e do Distrito Federal, eleitos segundo o princípio majoritário.
§ 1º – Cada Estado e o Distrito Federal elegerão três Senadores, com mandato de oito anos.
§ 2º – A representação de cada Estado e do Distrito Federal será renovada de quatro em quatro anos, alternadamente, por um e dois terços.
§ 3º – Cada Senador será eleito com dois suplentes.
Voltei
Viram só? O sistema proporcional e a suplência no Senado são matérias constitucionais.
“Ah, mas a proposta poderia ser encampada por alguém, transformar-se em emenda e então…”
Claro que sim! ACONTECE QUE ISSO TEM DE SER NEGOCIADO COM OS RUSSOS, E DONA DILMA ROUSSEFF ACHA QUE CHEGOU A HORA DE ATROPELAR OS RUSSOS, compreenderam?
Não existe um “cérebro” no Congresso que coordene as ações do Poder, mas existe o senso de sobrevivência dos políticos.
Eles sabem que, junto com Dilma, estão na berlinda. E perceberam a natureza do jogo.
Ela tentou se livrar do problema apontando o dedo para o sistema político, tentando jogar a massa contra o Parlamento.
Os políticos sabem que, em momentos como os que vivemos, eles não formam exatamente uma categoria muito popular.
Tanto é assim que Marina Silva ascendeu ainda mais como segunda colocada em pesquisas de opinião, seguida, em certos cenários, por Joaquim Barbosa.
Tradução dessas intenções de voto: ódio à política.
Ocorre que Dilma não está em condições de apontar o dedo para ninguém.
O Congresso, dentro dos limites possíveis, até que se mexeu — votando até mesmo alguns cretinismos e barbaridades.
E o Executivo?
A única ideia de Dilma foi a reforma. O resto é promessa. E está dando tudo errado.
Agora ela resolveu ter a genial ideia de mobilizar os tais “movimentos sociais” contra o Congresso.
O PT já convocou os seus militantes a se juntar aos protestos no dia 11.
Quando os deuses querem destruir alguém, começam por lhe tirar o juízo, reza velho adágio latino. Parece ser o caso.