Um foro anacrônico 10/08/2013
- O Estado de S.Paulo
O Foro de São Paulo, que realizou seu 19.º encontro de 31 de julho a 4 de agosto na capital paulista, é uma organização latino-americana fundada por Luiz Inácio Lula da Silva, por inspiração de Fidel Castro, em 1990, quando o ex-presidente brasileiro ainda era tido como político de esquerda.
De lá para cá muita coisa mudou no panorama continental, inclusive o então incendiário líder sindical que veio a se tornar presidente da República.
Mas o Foro de São Paulo permanece o mesmo, tal e qual, fiel a uma histórica vocação "anti-imperialista" e ao propósito difuso de "promover a integração econômica, política e cultural da região", com base numa retórica populista e no modelo estatizante que hoje impera na maior parte dos países que integram o grupo.
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Não por coincidência, são esses os países, como Venezuela, Equador, Bolívia, Argentina, que, a exemplo do Brasil, exibem o pior desempenho econômico no continente, em contraste com o dos integrantes da Aliança do Pacífico - México, Colômbia, Peru, Chile e, mais recentemente, Costa Rica - que colhem os resultados positivos de suas bem-sucedidas políticas de integração na economia global.
A ideia-força, hoje mais do que nunca anacrônica, que inspirou a criação do Foro de São Paulo, durante uma visita de Fidel Castro a Lula em São Bernardo do Campo 23 anos atrás, era promover o debate, entre as forças de esquerda da América Latina, sobre as consequências políticas da então recente queda do Muro de Berlim e elaborar estratégias para combater o "neoliberalismo" que "ameaçava" dominar a comunidade latino-americana.
E, por causa do ditador cubano, ganhou destaque na pauta de discussões do Foro a luta "anti-imperialista" focada no combate ao embargo econômico imposto pelos Estados Unidos a Cuba.
O marco inicial do movimento foi a "Declaração de São Paulo", aprovada no final do primeiro encontro. É um documento muito significativo, menos pelas boas intenções proclamadas e mais pela constatação, na perspectiva de mais de 20 anos, de que seus objetivos estão muito longe de ser alcançados: "vontade comum de renovar o pensamento de esquerda e o socialismo, de reafirmar seu caráter emancipador, corrigir concepções errôneas, superar toda expressão de burocratismo e toda ausência de uma verdadeira democracia social e de massas".
Cuba, Venezuela, Equador, Bolívia e até mesmo, cada vez mais, a Argentina são hoje exemplos da estratificação de um "pensamento de esquerda" anacrônico.
Todos padecem de um burocratismo do aparelho estatal semelhante ao que levou à falência a União Soviética e seus satélites. E cada um deles amarga a frustração da falta de qualquer perspectiva de conquistar uma "verdadeira democracia social e de massas".
Em 1990, cerca de 50 partidos políticos, organizações não governamentais e frentes de esquerda de vários países latino-americanos e caribenhos atenderam ao convite feito pelo Partido dos Trabalhadores e aderiram à iniciativa. Hoje são mais de 80, de cerca de 20 países.
A partir da virada do século, quando Lula e o PT já estavam empenhados em atualizar o discurso para conquistar o poder no Brasil, a influência de ambos no Foro foi diminuindo na mesma medida em que crescia a do coronel Hugo Chávez e do seu socialismo "bolivariano". Não faltaram, assim, durante o encontro, generosas referências ao "legado político e ideológico do pensamento e da ação do comandante Hugo Chávez".
As intervenções dos principais representantes brasileiros no Foro, Lula e sua pupila Dilma Rousseff, foram dedicadas especialmente à tentativa de reverter a favor do lulopetismo as recentes manifestações populares contra a corrupção e por serviços públicos mais eficientes.
O argumento é singelo: como a vida dos brasileiros melhorou muito nos últimos 10 anos e meio de governo petista, a população, especialmente os jovens, tende naturalmente a pedir mais. E o governo, é claro, está atento ao clamor das ruas. Todo mundo aplaudiu e, após cinco dias de convescote, voltaram todos para casa com a satisfação do dever cumprido.