...E Capilé se rende à mídia tradicional 16/08/2013
- Blog de Reinaldo Azevedo - Veja.com
Saca? É Capilé recorrendo à “mídia tradicional” para tentar se explicar, saca? Mas ele não explicou nada, sacou? E disse por que não paga cachê. A lógica me pareceu pré-capitalista. Mas com dinheiro da Petrobras e do Banco do Brasil! Saca? Saca!!!
O senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) resolveu cobrar explicações sobre a grana que estatais como a Petrobras e o Banco do Brasil repassam ao grupo Fora do Eixo (ver post) — grupo, organização, seita, sei lá como chamar… Quem sabe as pessoas consigam entender alguma coisa. Capilé, ele mesmo, não consegue explicar nada.
O chefão do Fora do Eixo, que considera que a “mídia tradicional” vive uma “crise narrativa” — e se entende, então, que a tal Mídia Ninja é que é a alternativa —, teve, vejam só, de recorrer a esse instrumento obsoleto, ultrapassado, parcial, superado para se… explicar. Ele bem que tentou se defender usando a sua própria “rede”, mas não deu certo. A casa — ou as “casas” — do Fora do Eixo caiu!
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As redes sociais começaram a ser inundadas por testemunhos pavorosos. Muito bem! Capilé concedeu uma entrevista à TV Estadão. Se você estava confuso ou não havia entendido direito o que ele falava, a entrevista não vai ajudar muito.
Não é que tenha faltado colaboração. Os entrevistadores foram de uma lhaneza extrema, doces mesmo! Não havia como dispensar mais, como posso chamar?, reverência ao chefão do Fora do Eixo. Se Capilé não conseguiu ser mais claro, é porque isso é mesmo impossível.
Qual a diferença?
Os entrevistadores quiserem saber como é essa coisa de não pagar cachê; indagavam se isso era mesmo verdade. Capilé deu uma resposta fenomenal. Começou dizendo que a distribuição de renda é um problema em todo o Brasil… Ah, bom! E, sim, ele admitiu que as bandas que tocam nos festivais promovidos pelo Fora do Eixo não recebem cachê — uma ou outra talvez. Mas esse gênio da raça e da economia (já criou, à sua maneira, uma universidade e um banco) deixou claro que “festival é para formar público”. Capilé dá a entender que o “pagamento” do artista é a plateia que o Fora do Eixo reuniu para ele. Comporta-se como alguém que pagasse o trabalho de um serviçal com comida e moradia, orgulhoso de ensinar a seu bom escravo um ofício. Ocorre que esses festivais são realizados com dinheiro público — de estatais, de prefeituras ou por intermédio de leis de incentivo, como a Rouanet.
Paciente, amigo de fé, irmão, camarada, o jornalista ainda tenta — “saca?” (Capilé adora um “saca?” — perguntar com jeitinho, cheio de dedos (para não ofender a sensibilidade do pensador) quanto dinheiro entra no Fora do Eixo. Capilé enrola: “3 milhões a 5 milhões… 8 milhões”. Como assim? E ele se esforça: “É que um festival pode custar R$ 10 mil, mas sem se contar o custo do traslado (ele fala “translado”)… Hein?
A embromação
Capilé, assegura, no entanto, que está prestando contas a quem tem de prestar: aos órgãos responsáveis (suponho que se refira aos patrocinadores oficiais). Em seguida, ele sugere que a gente é muito atrasado para entender o seu negócio, “saca?”. Sabem por quê? Ele explica: é que o Fora do Eixo “trabalha com a lógica digital do século 21, que é diferente da lógica analógica”. Ah… Na “lógica digital do século 21, o Banco do Brasil e a Petrobras dão dinheiro para a organização de Capilé, e ninguém tem nada com isso.
Aí foi a jornalista que ainda tentou saber detalhes. Impossível. Capilé é uma Marina Silva de calças; é um pouco mais cru e mal-humorado, mas igualmente dedicado a usar expressões que levam o interlocutor a suspeitar que possa haver naquela embromação algum pensamento profundo. Ao se referir à prestação de contas, falou em “aplicativos facilitadores” e “aplicativos do comum”, que ajudariam os coletivos do Brasil inteiro a trocar experiências. Aí a jornalista imaginou que ele estivesse se referindo a algum programa de computador… Não era bem isso. Os “aplicativos do comum” são “frentes para ajudar na organização”. E a Universidade Fora do Eixo? Ah, essa serve para o “fluxo de metodologias entre os coletivos”. Saca?
Se você não entendeu nada — e se ficar na mesma caso assista à entrevista —, tem duas saídas:
a) ou acha que Capilé enrolou os entrevistadores e tentou enrolar o telespectador;
b) ou se considera um dinossauro da era analógica, incapaz de entender o Schopenhauer da era digital.