O Mercosul fica para depois 17/08/2013
- O Estado de S.Paulo
Ao tomar posse como presidente do Paraguai, Horacio Cartes teve o cuidado, em seu discurso, de não citar o Mercosul. Embora formalmente possa retornar ao bloco econômico do qual foi suspenso em meio à crise que derrubou o presidente Fernando Lugo, em junho de 2012, o Paraguai não parece ter muita pressa - nem muito interesse - em voltar.
Depois do impeachment de Lugo, o Congresso paraguaio foi acusado pelas presidentes do Brasil, Dilma Rousseff, e da Argentina, Cristina Kirchner, de ter patrocinado uma ruptura democrática - embora o afastamento de Lugo tenha respeitado a lei. Ato contínuo, o Mercosul puniu o Paraguai, alegando violação das cláusulas democráticas do bloco.
Tanto Dilma quanto Cristina tinham todo o interesse em colocar o Paraguai para escanteio, porque o Congresso do país vinha resistindo à entrada da Venezuela no Mercosul. Sem o obstáculo paraguaio, a Venezuela não só se tornou membro pleno do bloco, como hoje o preside, em escancarado desafio a um dos sócios-fundadores.
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Com a posse de Cartes, a suspensão do Paraguai tecnicamente acabou, mas os paraguaios alegam que é difícil voltar ao bloco, em primeiro lugar porque seu Congresso formalizou seu repúdio à presença da Venezuela. Como as decisões do Mercosul têm de ser tomadas frequentemente pelo voto unânime, tal situação criou um impasse óbvio, adicionando dificuldades a um bloco econômico marcado pelas indefinições.
O presidente Cartes afirmou, diante de Dilma e Cristina, que o Paraguai "participa e participará" dos organismos regionais e internacionais. Disse também que pretende trabalhar para não "agravar as diferenças conjunturais". Para o chanceler Antonio Patriota, tais afirmações são "pistas" de que o novo governo paraguaio está disposto a negociar sua volta ao Mercosul.
Na realidade, porém, o discurso indica uma disposição bem diversa. Cartes enfatizou que quer manter "cordiais e fecundas relações bilaterais", sugerindo que o Paraguai tentará resolver suas pendências apenas com quem lhe interessar. Ao não convidar o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, para sua posse, Cartes deixou claro que não tem, por ora, nenhuma intenção de se aproximar dos venezuelanos.
Além disso, o discurso de Cartes indica que o Paraguai está muito à vontade em sua condição de país livre para negociar acordos comerciais com quem bem entender, sem as eventuais amarras do Mercosul. O primeiro passo para isso foi sua incorporação, como observador, à Aliança do Pacífico, bloco formado por Colômbia, Chile, México e Peru. Enquanto o Mercosul patina sem rumo e aceita sócios que consideram o livre mercado um palavrão imperialista, a Aliança do Pacífico é uma entidade dinâmica, que já atraiu diversos países europeus e anunciou a redução em 90% das tarifas de importação entre seus sócios. Além disso, em 2011, os países da Aliança exportaram 10% a mais do que os do Mercosul. Preterido por Brasil e Argentina para dar lugar à Venezuela e sua desastrosa revolução bolivariana, o Paraguai não teve muita dúvida de que lado ficar.
Do ponto de vista paraguaio, portanto, não há muita razão para apressar seu retorno ao Mercosul, principalmente porque o Paraguai não precisa do bloco. A economia do país deverá crescer cerca de 12% neste ano, o melhor desempenho do continente. Suas exportações subiram 40% nos primeiros quatro meses de 2013 na comparação com o mesmo período do ano passado.
O Paraguai superou a Argentina em exportação de carne, graças à diversificação dos negócios, e está entre os maiores produtores e exportadores de soja do mundo. Ademais, o país vai inaugurar uma linha de transmissão que lhe permitirá usar mais energia de Itaipu - o que poderá, no futuro, atrair indústrias que hoje estão no Brasil, pois a tarifa paraguaia é mais baixa.
É por essas tantas razões que o novo chanceler paraguaio, Eladio Loizaga, ao falar de suas prioridades, não se preocupou em medir as palavras: "O Mercosul ficará para depois".