O FMI e a escuridão do Brasil 29/08/2013
- O Estado de S.Paulo
Mistério insondável ou segredo? Não há cenário prospectivo da economia brasileira, nem para este ano nem para o próximo, no informe divulgado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), na quarta-feira passada, sobre a recém-concluída coleta de informações sobre a situação e a evolução provável do País.
Quem quiser conhecer as mais amplas e recentes projeções econômicas para Estados Unidos, Alemanha, China, Japão, Geórgia e República Eslovaca - para citar só uns poucos exemplos - poderá consultar os últimos relatórios do Fundo Monetário Internacional sobre as consultas realizadas periodicamente, quase sempre de ano em ano, com fontes oficiais, empresariais e acadêmicas desses países.
Os documentos e mesmo os comunicados breves à imprensa contêm, no mínimo, os números estimados para este ano e para o próximo.
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As estimativas alcançam, em alguns casos, os próximos cinco anos. No caso do Brasil, a série dos números termina, estranhamente, no ano passado.
A nota publicada em julho de 2012 continha, pelo menos, as projeções para o ano. Naquele momento ainda se esperavam, por exemplo, um crescimento econômico de 2,5% e uma inflação de 4,8% - números fornecidos pelo governo, incorporados no relatório e errados.
Neste ano, nem as projeções para 2013 aparecem na tabela divulgada. Não foram citadas sequer as últimas estimativas do FMI: 2,5% de expansão do PIB neste ano e 3,2% no próximo.
O governo terá, por insegurança diante dos maus resultados obtidos até agora, interferido para limitar os detalhes numéricos?
Mesmo com poucos números e com uma tabela encerrada em 2012, a nota evidencia uma avaliação pouco favorável da economia brasileira.
Documentos desse tipo são em geral redigidos em linguagem diplomática, mas sem grandes contorções.
A produção do texto recém-divulgado foi obviamente mais complicada, com muita interferência brasileira.
A análise relevante, em geral crítica, aparece quase sempre depois de alguma referência positiva.
Exemplo de contorção: a economia melhora gradualmente, o investimento começou a recuperar-se e a confiança dos empresários se firmou.
Mas - e aqui entra a parte substantiva - a economia deve estar operando perto do potencial, restrições do lado da oferta limitaram o crescimento no curto prazo e exacerbaram as pressões inflacionárias, com o baixo desemprego também contribuindo para pressões inflacionárias de custo e de demanda.
Qual o potencial de crescimento? Deve estar na faixa de 3% a 3,5%, pelas estimativas do Fundo, porque a projeção para o próximo ano indica 3,2%.
No Brasil, há quem calcule margem ainda menor para uma expansão segura, isto é, sem pressão importante sobre os preços e sem desajustes perigosos nas contas externas.
Sem entrar nesses detalhes, pelo menos no informe inicial para a imprensa, o pessoal do FMI é, no entanto, bastante claro quanto a esse ponto: o Brasil precisa de muito mais investimentos para crescer mais rapidamente.
A piora das contas externas também é mencionada. O câmbio desvalorizou-se, mas o custo da mão de obra em dólares se manteve.
O rápido aumento do salário real e a estagnação dos ganhos de produtividade limitaram o efeito benéfico da depreciação do real sobre a competitividade.
A mensagem é nítida: a deterioração do balanço de pagamentos, especialmente da conta de comércio, é atribuível apenas em parte à fraqueza da demanda externa.
Neste, como em outros pontos importantes, o diagnóstico dos técnicos do Fundo diverge das explicações, ou justificativas, do governo.
Na avaliação da junta de diretores executivos, o crescimento deve estar sendo contido, no curto prazo, pelas limitações internas da oferta (dificuldades de produção) e pelas incertezas quanto à política econômica.
O aperto monetário, segundo essa análise, é bem-vindo e seria conveniente mantê-lo para conter a inflação e ancorar as expectativas.
Cuidar das contas públicas também seria, segundo essa análise, uma boa ideia.