Para sustentar a admissibilidade dos embargos infringentes no processo do mensalão, muito se tem invocado a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (o Pacto de São José da Costa Rica), que, em seu art. 8º, h, assegura aos acusados “o direito de recorrer da sentença a juiz ou tribunal superior.”
Trata-se do direito ao duplo grau de jurisdição.
Tem-se sustentado que os embargos infringentes devem ser admitidos como forma de concretizar-se aquela garantia processual dos acusados.
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Ocorre que os embargos infringentes nada têm a ver com a garantia consagrada pelo Pacto de San José.
Como a decisão embargada foi proferida pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal, é impossível o cabimento de qualquer recurso “para juiz ou tribunal superior”, pela simples e boa razão de não existir, em nossa estrutura judiciária, nenhum órgão acima do STF.
Se não forem considerados derrogados pela Lei nº 8.038/90, tais embargos infringentes (previstos no art. 333, I, parágrafo único do Regimento Interno do STF) serão julgados pelo próprio pleno do Supremo Tribunal Federal, ou seja, o mesmo grau de jurisdição que proferiu a decisão embargada.
Tratar-se-ia, portanto, de simples pedido de reconsideração, um anacronismo que não guarda nenhuma relação com o princípio do duplo grau.
Mas não é só. Para que tais embargos traduzissem a garantia do duplo grau, seria necessário fossem eles cabíveis sem nenhuma espécie de limitação, bastando a simples condenação.
Não é o que ocorre, no entanto, uma vez que, nos termos do regimento interno do STF, seu cabimento é condicionado à existência de quatro votos divergentes e sua abrangência é limitada ao ponto em que configurado o dissenso.
Nas questões em que tiver havido unanimidade ou em que os votos divergentes não cheguem a quatro não são cabíveis os embargos.
Vê-se, portanto, que os embargos infringentes não constituem meio de assegurar-se o duplo grau de jurisdição: em primeiro lugar porque não são julgados por tribunal superior ao que proferiu a decisão embargada; em segundo lugar porque seu cabimento é bastante limitado, na medida em que se exige que a decisão haja sido tomada por apertada maioria, excluindo, portanto, as questões decididas por unanimidade ou por maioria mais confortável.
Vale acrescentar, ainda, que, em se tratando de decisão proferida em única instância pelo pleno da mais alta corte do país, a finalidade buscada pela garantia do duplo grau de jurisdição encontra-se perfeitamente satisfeita.
O que objetiva o Pacto de San José, ao consagrar o direito ao duplo grau de jurisdição, é garantir aos acusados o direito de terem as sentenças que os condenem revistas por magistrados mais experientes, como são os integrantes das cortes superiores.
Ora, no Brasil, o grau mais elevado que se pode alcançar na revisão de uma sentença é, obviamente, o Supremo Tribunal Federal.
Dessa forma, a competência originária da nossa Suprema Corte nos processos criminais, por prerrogativa de função (impropriamente conhecida como foro privilegiado), satisfaz, plenamente, o objetivo perseguido pelo Pacto de San José.