A marcha dos furiosos 15/09/2013
- Blog de Reinaldo Azevedo - Veja.com
Tirei o sábado para descansar um tantinho, tomar um pouco de sol, dar uma chance à Vitamina D, curtir a família e os amigos.
Só ao fim da jornada liguei um pouco a TV e havia lá um senhor de que eu nunca ouvira falar tocando guitarra, o que me pareceu ok, embora não entenda zicas do assunto.
Depois pergunto para o Lobão se, na espécie -- como diria Marco Aurélio --, presta ou não.
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Desliguei quando decidiram informar, numa mensagem estampada na tela, que o cara gosta de comer bananas e tem “fetiche por mulheres só com meias”.
Na hora, eu fiquei imaginando o coroa hesitante entre descascar uma banana e, bem…, curtir o seu fetiche.
Definitivamente, pensei, eu poderia fazer algo menos miserável. E então decidi ler o que andava por aí, na área de meu principal interesse: a política.
E aí, sim, conheci o que é miséria moral e existencial. Os furiosos estão inquietos. Os furiosos estão babando.
A tabela do capilé pago pelas estatais e pelo governo federal deve ter tido um reajuste. Essa gente não se indigna de graça; tampouco exacerba o seu ódio sem uma negociação prévia.
O JEG (Jornalismo da Esgotosfera Governista) resolveu, à moda PCC, dar uma “salve” para caçar -- e, se possível, cassar -- o que esses vigaristas chamam de “mídia”.
Acusam-na de estar tentando direcionar o voto de Celso de Mello, o decano do Supremo, que vai decidir se a Justiça no Brasil se mantém em posição vertical ou cai de joelhos diante da impunidade e do crime.
E não custa notar à margem: há uma diferença relevante entre essa gente e Marcola. O chefão da organização criminosa ao menos já leu Nietzsche, não é?, e seus subordinados, como diria Padre Vieira, “roubam debaixo de seu risco”.
Estes outros, do JEG, sem temor nem perigo, traficam adjetivos e encômios para marginais condenados.
Recebem dinheiro que poderia criar escolas, construir creches e abrir estradas para defender larápios, embusteiros e pervertidos.
Marcola está no lugar certo. Essa escória é que está no lugar errado.
O que pretendem com esse escarcéu?
É simples! Se Celso de Mello disser “sim” aos infringentes -- enterrando a Justiça --, essa súcia financiada exaltará a sua coragem.
Os mesmos que o massacraram quando ele denunciou os “marginais do poder”, quando ele apontou que o mensalão foi uma tentativa de golpe, verão nele qualidades verdadeiramente sublimes e superiormente interessantes; um jurista como nunca houve na história destepaiz…
Se, no entanto, ele resolver salvar a Justiça do opróbrio e da desmoralização, dizendo “não” aos infringentes, então o ministro se transformará na Geni.
Será acusado de ter cedido à, como é mesmo?, “pressão da mídia”, da “imprensa golpista”.
Ora, não custa lembrar que Joaquim Barbosa já foi um herói dessa canalha.
Ao tempo em que o ministro andou se confrontando, pelas mais diversas razões, com outros membros da corte que esses vigaristas têm por inimigos, era saudado como a expressão de um novo tempo da Justiça.
Bastou, no entanto, que o ministro passasse a tratar os marginais do mensalão por aquilo que são, então ele virou o negro que ascendeu ao posto não porque tivesse qualidades, mas porque Lula teria sido generoso com ele.
“E você?”
Aí o petralha carente, que teve ontem crise de abstinência porque não escrevi post nenhum, baba no teclado e aperta o “enter”: “E você? Não vai fazer a mesma coisa, só que defendendo o contrário?”
A resposta, obviamente, é “não”. Não se trata de ser mais ou menos legalista; não se trata de ser mais ou menos apegado ao que está escrito; não se trata de ser mais ou menos rigoroso.
Tanto o “sim” como o “não” podem se dizer abrigados pelos códigos escritos.
Por isso mesmo, a resposta de Celso de Mello perde a importância propriamente jurídica para ganhar um sentido que é de natureza -- e a palavra é mesmo esta -- moral.
Tanto uma saída como outra podem apascentar a consciência do operador do direito Celso de Mello -- embora tecnicamente não sejam opções equivalentes, já digo por quê --, mas será o homem Celso de Mello a fazer uma escolha.
Uma delas, insisto, mantém viva a esperança de que se possa, afinal de contas, fazer Justiça. A outra permitirá que o Supremo seja tragado pela voragem de desconfiança nas instituições que tem caracterizado o país nos últimos anos.
Um juiz só pode decidir segundo a lei. Mas, ao fazê-lo, decide também segundo a sua consciência.
Mello, já escrevi aqui, não passará a ser um mau homem se fizer a pior escolha. Mas é inequívoco que a má escolha de um bom homem tornará pior o Brasil e os brasileiros.
E acreditem: os desdobramentos serão especialmente perversos, caso aconteça o pior, por ser Celso de Mello quem é.
De uns quatro ou cinco que hoje integram a corte, não se pode esperar muita coisa, a não ser o pior.
Assim, fosse um deles a dar o voto decisivo, a reação poderia se limitar a um fatalismo frio.
Mas não! O país aprendeu a confiar, por bons motivos, no decano do Supremo.
Note-se que, embora uma escolha ou outra possam reivindicar o estatuto de conforme a lei, não são equivalentes.
Inexistem, à diferença do que afirmou o ministro Roberto Barroso, precedentes. O Supremo jamais estabeleceu juízo de mérito a respeito.
Mas passou por circunstâncias idênticas, de uma lei, na prática, tornar sem efeito dispositivos de seu regimento.
Ainda que o ministro tenha feito considerações laterais a respeito da vigência do Artigo 333 do Regimento, elas não condicionam necessariamente seu voto.
Ademais, o que quer que tenha dito não respondeu, por exemplo, a uma questão essencial proposta pela ministra Carmen Lúcia: imaginem um processo qualquer em que parte dos réus seria processada pelo STF e parte pelo STJ, duas cortes superiores.
Faz sentido que os primeiros tenham direito a embargos infringentes e os outros não? O sistema não é um só?
Não faltam, como aqui se demonstra desde agosto do ano passado, razões técnicas para recusar o expediente.
Mas a decisão será de outra natureza -- e nem a qualifico de política: a escolha será mesmo moral.
“Ah, então Celso de Mello estará sendo imoral se disser ‘sim’ aos embargos infringentes, Reinaldo?”
Não! Mas estará abrindo as portas para que outros o sejam.
E é preciso que se diga isso com todas vogais e as consoantes. De certo modo, repete-se aquela mesma situação em que o Supremo decidiu entre declarar a cassação automática de um parlamentar condenado ou remeter a decisão para o plenário das respectivas Casas.
Uma opção encontrava amparo na lei; a outra também (embora ninguém tenha conseguido explicar se pode ser parlamentar com direitos políticos cassados).
Uma opção deixava clara a incompatibilidade entre a condenação criminal e a representação política; a outra abria a chance de haver um parlamentar presidiário.
Uma opção que contempla essa possibilidade, convenham, opção não é. E, no entanto, se fez a coisa estúpida.
Se as duas saídas se amparavam na letra escrita, só uma delas trazia em si o escândalo.
Não creio que Celso de Mello se deixe influenciar pelo JEG. Ainda que tome a pior decisão, ele o fará por sua conta.
Essa gente promove a gritaria porque é de seu ofício; porque tem de fazer as vontades de quem alimenta o caixa.
Esses patriotas cobram muito caro para elogiar. E ainda mais caro para desqualificar os adversários de seus patrocinadores.
Não por acaso, os mais entusiasmados eram notáveis críticos do petismo até anteontem.