FEBEAJU 16/10/2013
- Blog de Reinaldo Azevedo - Veja.com
Um surto populista, como nunca antes na história destepaiz, toma o Poder Judiciário, embalado pelo chamado clamor das ruas.
Se não existem mais leis e direitos assegurados, então tudo é permitido, e que o diabo se encarregue de nós, que Deus tem mais o que fazer.
Se o mérito das decisões é absurda, a sua justificativa chega a ser estupefaciente.
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A última contribuição ao Febeaju (Festival de Besteiras que Assola o Judiciário) -- com a licença de Stanislaw Ponte Preta -- foi dada pelo ministro Luiz Fux, do STF, nesta terça.
Ele concedeu uma liminar suspendendo a decisão do Tribunal de Justiça do Rio, que havia autorizado o corte dos dias parados dos professores em greve na rede estadual.
Marcou uma audiência de conciliação em seu gabinete no dia 22.
O ministro escreveu uma pequena pérola da agressão ao bom senso e aos valores fundamentais de uma sociedade livre. Leiam:
“Quando examinada sob o quadro fático subjacente, a decisão reclamada, autorizativa do governo fluminense a cortar o ponto e efetuar os descontos dos profissionais da educação estadual, desestimula e desencoraja, ainda que de forma oblíqua, a livre manifestação do direito de greve pelos servidores, verdadeiro garantia fundamental. Com efeito, não foi outro o objetivo do aresto reclamado que não o de inviabilizar o exercício dessa liberdade básica do cidadão, compelindo os integrantes do movimento a voltarem às suas tarefas diuturnas”
Como, excelência?
Vamos ver por onde começo a desarmar a coleção de bobagens.
Em primeiro lugar, não cabe ao Estado nem encorajar nem desencorajar “a livre manifestação do direito de greve”, seja lá o que isso queria dizer, redigido como está.
A função do Estado, como ente, não é fazer nem uma coisa nem outra, mas, no que concerne à educação, garantir uma escola de qualidade aos estudantes, o que só se realiza com o professor em sala de aula.
Ainda assim, o profissional tem o direito de entrar em greve, desde que arque com as consequências do seu ato.
No caso, são consequências de caráter administrativo.
Os professores, que se saiba, reivindicam ganhar mais pelo trabalho que fazem.
Exigir o pagamento pelo trabalho que não fazem não é nem luta política nem luta sindical.
Trata-se apenas de enxergar o Estado como um mero cartório de despachos de seus interesses -- no caso, da categoria.
“Greve não são férias”, já repetia um sindicalista de renome chamado Luiz Inácio Lula da Silva.
Há mais, muito mais.
Apenas uma minoria dos professores da rede estadual está em greve. A maioria exerceu o seu direito de não aderir ao movimento.
O que o ministro Luiz Fux está fazendo é garantir de maneira cartorial o sucesso da paralisação.
A ser assim, greves não precisam mais contar com a adesão da categoria, e parar ou não parar passam a significar a mesma coisa.
Pergunto: e os milhares que não aderiram ao movimento?
Devem, então, por uma questão e coerência, cruzar também os braços, já que a diferença entre trabalhar e não trabalhar passa a ser nenhuma?
O corte dos dias parados não é uma decisão política, mas administrativa.
Trata-se de um absoluto despropósito, muito típico de quem está procurando afinar a Justiça não com o que os fundamentos da lei e do estado de direito, mas com o alarido das ruas.
No mundo de Fux, então, greves poderão, doravante, ser decretadas ao sabor da vontade das lideranças de extrema esquerda que dominam os sindicatos de funcionalismo sem nem mesmo precisar consultar a categoria.
O “grevista” pode ficar em casa, de papo para o ar, à espera do contracheque.
A violência de volta às ruas
Nesta terça, as ruas do Rio e de São Paulo foram, mais uma vez, palco da violência de bandidos mascarados.
Há dias, a Polícia de São Paulo prendeu um casal de namorados e os enquadrou numa porção de crimes, apelando inclusive à Lei de Segurança Nacional, que continua em vigor.
Afirmar que se trata de um despropósito porque uma lei da ditadura está abaixo de qualquer consideração: é delinquência intelectual e política.
A ser assim, deixemos, então, de cumprir todas as leis aprovadas no Brasil em períodos ditatoriais -- quase todo o Código Penal, por exemplo, que é do Estado Novo.
A polícia prendeu o tal casal -- Humberto Caporalli, de 24 anos, e a namorada dele, a estudante Luana Bernardo Lopes, de 19 --, e a Justiça mandou soltar, apesar do conjunto de evidências que há contra os dois.
A decisão foi do juiz Marcos Vieira de Morais, do Departamento de Inquéritos Policiais (Dipo).
Ainda que ele tenha achado, sei lá, incorreto ou excessivo o enquadramento na Lei de Segurança Nacional, o casal também foi acusado de dano qualificado, incitação ao crime, formação de quadrilha ou bando e posse ou porte ilegal de armas de uso restrito.
Nada disso convenceu o doutor.
Os dois estão nas ruas.
Esse foi apena o caso mais notório.
A Justiça não quer saber de manter presos os mascarados. Estão sendo soltos às pencas.
USP
Os comandados do PSOL, do PSTU e de outras minorias extremistas invadiram a Reitoria da USP com marreta e pé de cabra.
Foram eles, note-se, que lideraram os protestos desta terça em São Paulo, que degeneraram, como sempre, em violência e depredação.
O comando da universidade fez o óbvio: entrou com um pedido de reintegração de posse.
Foi negado duas vezes.
O juiz Adriano Marcos Laroca, da 12ª Vara da Fazenda Pública, afirmou:
“A ocupação de bem público (no caso de uso especial, poderia ser de uso comum, por exemplo, uma praça ou rua), como forma de luta democrática, para deixar de ter legitimidade, precisa causar mais ônus do que benefícios à universidade e, em última instancia, à sociedade. Outrossim, frise-se que nenhuma luta social que não cause qualquer transtorno, alteração da normalidade, não tem força de pressão e, portanto, sequer poderia se caracterizar como tal.”
Concedamos que toda luta causa algum transtorno…
Ocupar o coração de uma instituição da base da violência, da porrada, impedindo o seu funcionamento passa a ser um ato legítimo por isso?
O juiz Laroca não quis nem saber.
E ainda deu um pito na Reitoria.
Escarnecendo do bom senso, a Justiça de São Paulo deu nesta terça um prazo de, ATENÇÃO!, 60 dias para que os invasores deixem o prédio.
Câmara dos Vereadores do Rio
Fux não quer desconto dos dias parados dos grevistas da rede estadual do Rio, e a juíza Roseli Nalin, do Tribunal de Justiça (TJ) do Rio, concedeu liminar suspendendo a sessão da Câmara dos Vereadores que aprovou o plano de cargos e salários dos docentes da rede municipal.
Ela atendeu ao pedido de 9 vereadores, que alegaram que os professores foram proibidos de acompanhar a sessão, o que se caracterizaria como um cerceamento do debate e do direito da minoria…
É um escracho.
Os sindicalistas só não puderam acompanhar a sessão porque, na verdade, queriam impedir que ela acontecesse.
De resto, o Poder Legislativo é exercido por representantes ELEITOS pelo povo.
As corporações de ofício não precisam ocupar as galerias para que um vereador, um deputado estadual ou um parlamentar federal tenham legitimidade.
Vejam que fabuloso!
A juíza Roseli decidiu suspender uma sessão da Câmara porque, sei lá como dizer, “o povo” não estava presente.
Em agosto, uma colega sua, Margaret de Olivaes Valle dos Santos, da 6ª Vara de Fazenda Pública do TJ, negou uma liminar de reintegração de posse do prédio, que fora ocupado por membros do PSOL, que exigiam que um vereador seu fosse relator da CPI dos Transportes.
E se esse mesmo adorável “povo” decidir invadir os tribunais da Justiça brasileira, partindo do pressuposto de que, afinal, também os juízes agem por delegação.
A Justiça, tanto quanto o Legislativo e o Executivo, é só uma representação do povo.
Os magistrados estão lá porque não é possível a cada cidadão fazer Justiça por conta própria e com as próprias mãos.
Juízes, na história da humanidade, precedem os políticos na tarefa da representação.
Ora, assim como as pessoas demonstram um certo enfaro com os membros do Legislativo, podem descobrir que boa parte da impunidade é mesmo fabricada, infelizmente, nos tribunais.
Também no caso de ocupação de palácios da Justiça, negar-se-iam liminares de reintegrações de posse?