Imigrante do barulho 31/10/2013
- Antero Greco - O Estado de S.Paulo
Diego Costa é um sergipano de 25 anos, que emigrou para a Europa jovenzinho, para tentar a sorte no futebol. Pulou de time para outro, entre Portugal e Espanha, até se encaixar -- e bem -- no Atlético de Madrid, que voltou a ganhar destaque doméstico e internacional. Diego tem marcado um bocado de gols e isso bastou para se criar conflito hispano-brasileiro.
Felipão de repente anunciou que tinha planos para Diego na seleção, meses depois de tê-lo colocado em ação alguns minutos em amistosos com Itália e Rússia. Ao mesmo tempo Vicente Del Bosque acenou com intenção de incluí-lo na equipe campeã do mundo. O rapaz fica na encruzilhada e, afinal, optou pelo apelo dos ibéricos. Com isso, desatou polêmica que embaralha patriotismo, oportunismo, profissionalismo. Sobrou para os dois treinadores, para o jogador e para a Fifa. Já começou a Copa de 2014!
Parto do princípio de que cada um tem o direito de decidir os caminhos a seguir na vida. Escolhas são pessoais e intransferíveis, sejam religiosas, políticas, afetivas, culturais ou de trabalho. Diego Costa construiu carreira fora daqui, na Espanha encontrou o espaço dele e lá fez fama. Por estas bandas, até bem pouco tempo atrás, não passava de ilustre desconhecido para o grande público. E, até certo ponto, ainda o é. Normal, portanto, que prefira atender ao chamado de Del Bosque. Pouco importa se terá sucessão ou não na Roja.
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Houve reações indignadas, a mais comum se refere a suposta atitude de traição à pátria. Tolice. Pátria é onde o sujeito ganha o pão, a terra que o acolhe, o local onde se fixa e cria raízes. Isso já diziam os antigos romanos. Adotar outra cidadania nem sempre significa renegar o país de origem. Pode ser questão de sobrevivência. Ou você acha que muitos imigrantes que conseguem virar cidadãos norte-americanos ou europeus, por exemplo, apagam costumes, tradições e sentimentos que vêm do berço, estão no DNA, por causa de um documento oficial? Querem, no mínimo, tocar a vida em paz, com mesmos direitos e deveres dos nativos. Por que seria diferente com um jogador?
Discute-se a naturalização por conveniência, movida quiçá por estímulo financeiro. Quer dizer, um rapaz é bom de bola e recebe grana para defender determinado país, numa competição. Isso acontece em alguns esportes, como futsal (brasileiros) e tênis de mesa (chineses). Soa como imoralidade. Será? Mas, como detectá-la? Por que não é imoral ao se tratar de cientistas, pesquisadores, professores? Não seria sinal de que, de alguma maneira, barreiras podem cair? Não se sonha com um mundo sem fronteiras? A humanidade como irmandade? Imagine, Lennon...
Alguém diz que a Fifa deveria formular normas firmes e inflexíveis para acabar com a farra das cidadanias de ocasião. Caso contrário, torneios como Mundiais virariam uma bagunça. Fala-se em impedir de um atleta de vestir mais de uma camisa nacional. Ok, isso existe, mas só em torneios oficiais. Não vale para amistosos. Diego Costa, portanto, está livre para jogar pela Espanha sem impedimento, embora a CBF insista em brigar por ele.
Quem pode garantir que um técnico - não me refiro a Felipão - convocaria um jogador que está na mira de nacionalizar-se por outro país só para queimá-lo? Dessa forma, estaria supostamente a enfraquecer um rival? Muitos consideram futebol como guerra, e como tal, vale tudo.
Há sugestão de fixar um tempo para um boleiro ganhar o direito de se naturalizar. E quem pode detectar, com exatidão, o momento em que o sujeito sente desejo de mudar de nacionalidade? É possível passar décadas em um país sem querer abdicar da cidadania. Ou sentir essa vontade muito rapidamente. Se até governos têm dificuldade para lidar com assunto quanto mais a Fifa.
Amigos, o Diego Costa está feliz na Espanha e que continue assim. Se o problema é atacante, que se intensifique a garimpagem com os rapazes brasileiros daqui ou do exterior. E, se nem isso funcional, que Felipão invente esquema alternativo.