O Brasil precisará investir muito mais nos próximos anos, para elevar seu potencial de crescimento, mas o ministro da Fazenda, Guido Mantega, defende a redução dos financiamentos concedidos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), principal fornecedor de crédito de longo prazo.
O ministro falou em corte de até 20% no valor das operações, no próximo ano. Sem detalhar números, o presidente da instituição, Luciano Coutinho, prometeu para breve o anúncio de uma "nova política operacional".
Essa nova política buscará, "de forma cautelosa", mudar a composição e o custo dos empréstimos. A ideia, segundo explicou, é combinar um volume menor de dinheiro a juros mais favoráveis (TJLP) com recursos de mercado.
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Será possível conciliar os dois objetivos -- limitar a atuação do BNDES e estimular o investimento na capacidade produtiva?
Governo e setor privado têm investido em máquinas, equipamentos, infraestrutura e obras civis um volume de recursos na faixa de 18% a 19% do Produto Interno Bruto (PIB). É preciso, segundo estimativa corrente em Brasília e nos mercados, elevar essa proporção para 24%, para garantir um crescimento econômico mais próximo de 5% ao ano. Mesmo essa taxa seria modesta, pelos padrões internacionais, mas o País só deverá alcançá-la, segundo o ministro da Fazenda, em cerca de 10 anos.
A importância do assunto é enorme, mas a discussão, tudo indica, vai por um caminho pouco produtivo. O ministro da Fazenda está obviamente preocupado com as contas públicas. O Tesouro deve reforçar o BNDES com mais R$ 24 bilhões neste fim de ano. Já havia contribuído com cerca de R$ 300 bilhões desde 2009. Desse total, R$ 15 bilhões, liberados neste ano, foram para aumento de capital. O resto foi empréstimo a custo subsidiado.
Essa ajuda tem representado um peso enorme para o Tesouro, mas esse detalhe contábil, embora muito importante, é somente parte do problema. Falta examinar com realismo outro aspecto dessas operações: o dinheiro foi aplicado da melhor forma? As grandes empresas beneficiadas, a começar pela Petrobrás, poderiam ter levantado recursos de outra forma? Os critérios de seleção de clientes foram sempre defensáveis?
Empresas grandes levaram 62% dos R$ 194,45 bilhões de empréstimos concedidos nos 12 meses até outubro. Médias grandes ficaram com 5%. Sobraram 35% para micro, pequenas e médias companhias, embora os financiamentos desembolsados para esse grupo correspondessem a 97% das operações.
O assunto fica um pouco mais claro quando se examinam as atividades financiadas. Em 12 meses, a maior fatia dos empréstimos, de 33%, foi para projetos de infraestrutura. Isso parece muito bom, porque esses investimentos devem contribuir para a redução de um dos maiores entraves ao crescimento econômico. Mas será razoável o BNDES entrar com a maior parte do capital necessário a esses empreendimentos?
Houve recursos de sobra no mercado internacional, nos últimos anos, mas os grandes projetos brasileiros parecem ter sido pouco atraentes. Teria o governo cometido algum erro na formulação e na oferta dos projetos? Sem dúvida, e isso foi reconhecido, pelo menos em parte, com a reformulação dos critérios de concessões.
Além disso - apenas para continuar no capítulo do favorecimento às maiores companhias -, o banco se notabilizou, nos últimos anos, pela política de escolha de campeãs nacionais. Algumas dessas empresas, favorecidas tanto por empréstimos quanto por investimentos do BNDESPar, se tornaram insolventes em pouco tempo. Mesmo sem esse tropeço, seria muito difícil encontrar algum valor estratégico nos critérios adotados pelos dirigentes do BNDES e apoiados pela presidente Dilma Rousseff e seus ministros.
É preciso, sim, reexaminar a participação do Tesouro nos créditos do BNDES e a política de subsídios. Mas é indispensável, antes de mais nada, repensar a estratégia de crescimento, o papel do banco estatal e as formas de atração de capital privado para os grandes projetos. Bom senso e credibilidade podem ser grandes chamarizes.