A hora do mata-mata 16/12/2013
- ANTERO GRECO - O Estado de S.Paulo
Muita gente esperneou quando o Cruzeiro abriu vantagem insuperável, nas primeiras rodadas do returno, e lamentou que não houvesse mais a fase de mata-mata no Campeonato Brasileiro, abandonada desde a edição de 2003. Com o sistema de eliminação direta, explicava, a competição seria atraente, emocionante e imprevisível até o momento final. Em vez disso, se esvaziava com os mineiros a disparar, lá na frente.
Pois, para satisfação dos que sofrem de nostalgia dos confrontos entre forças dissonantes, hoje o tribunal esportivo lhes oferecerá uma breve volta ao passado. Haverá uma sessão em que uma equipe pelo menos sairá perdedora, no vapt-vupt. No tempo normal, sem o recurso dos pênaltis.
Mas, como auditores, advogados e demais integrantes do egrégio colégio não usam calções, meias e chuteiras, a decisão ocorrerá em sala acarpetada e não no tapete verde dos estádios. E, no lugar da bola e dos dribles, entrarão as arengas dos profissionais da toga. Quem tiver argumentação melhor e dominar com maestria os códigos, levará a vaga. Poderá comemorar como se fosse um gol marcado por Fred ou Gilberto, referências de Fluminense e Portuguesa, os duelantes da segunda-feira.
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A briga promete ser equilibrada, desde que não haja prevenção nem preferências para qualquer lado. A Lusa corre o risco de pegar a pena máxima - perda de 4 pontos -, por ter colocado em campo, por risíveis 15 minutos, Héverton, previamente suspenso pelo STJD. Se os julgadores optarem cadafalso, o clube paulista ficará atrás do Flu, na contagem derradeira da classificação, e consequentemente será empurrada para a Segunda Divisão.
Em resumo, será puxado o tapete de quem se desdobrou, na bola, para permanecer na elite nacional. Tapete que será estendido, de bandeja, para quem brilhou em 2012, a ponto de conquistar o título, e acumulou decepções agora, que lhe valeram o descenso, no campo. Porque, por mais que se tente dourar a pílula, com a observação de que se trata de mandar a ordem e os regulamentos, tapetão é a palavra justa e adequada para definir o episódio. Chega de ficarmos cheios de dedo para tergiversar em torno desse atentado.
A Lusa cometeu um deslize - e isso parece claro. O que discuto é o clamor em torno da suposta inevitabilidade de que só se redime com o pagamento da punição extrema. Há atenuantes que podem levar a condenação mais branda, que não redundasse na perda de pontos vitais para a permanência na Primeira Divisão. E, pelo que tenho lido de opinião e estudos de juristas, existe maneira de cumprir a lei e fazer justiça.
Na primeira hora da encrenca, com ela fresquinha e recém-saída do forno, propus a discussão a respeito da possibilidade de se manter a legalidade sem a execução do proposto na frieza do texto da lei. Uma chuva de xingamentos. No transcorrer da semana, mais vozes encamparam a ideia - e, o mais interessante, de gente que lida com a matéria. Não só leigos, como eu.
Ou seja, o STJD tem como dar puxão de orelhas na Lusa, sem necessariamente mandá-la para período no purgatório. A seis meses do Mundial no Brasil, com o povo em estado de atenção com o futebol dito profissional, não há mais espaço para artimanhas e retrocessos do gênero tapetão. O jogo se joga no campo.
Como não faço parte do tribunal, sinto-me à vontade para considerar triste e vergonhoso condenar com mão de ferro time que não cometeu crime hediondo contra a ética do Esporte. Estarão sendo sacrificados jogadores que honraram a camisa e torcedores que acreditam na validade do que ocorre nos 90 minutos.
E os estádios... Logo abaixo você confere mais uma reportagem de Jamil Chade com dados estarrecedores. O Brasil ergue, para a Copa, estádios escandalosamente caros, segundo consultoria internacional. Sem que haja bases sólidas para justificar os custos. E com dúvidas sobre o uso que alguns terão depois de julho de 2014. Nós já sabíamos. E daí?