Copa do atraso e da gastança 07/01/2014
- O Estado de S.Paulo
Atraso nas obras, rapidez na resposta: a presidente Dilma Rousseff reagiu prontamente aos comentários do presidente da Fifa, Joseph Blatter, sobre a demora na preparação da Copa do Mundo de 2014.
"Amamos o futebol e por isso recebemos esta Copa com orgulho e faremos a Copa das Copas", proclamou a presidente pelo twitter.
"É o país mais atrasado desde que estou na Fifa. E foi o único que teve tanto tempo para se preparar", disse o dirigente em entrevista ao jornal suíço 24 Heures.
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Publicado o comentário, o Ministério do Esporte logo divulgou em nota oficial a promessa de conclusão dos preparativos "a tempo para a Copa" -- garantia desnecessária, se o governo houvesse iniciado muito mais cedo os investimentos necessários.
Presidente da federação desde 1998, Blatter entrou na organização em 1975, há quase 40 anos. Ele se referiu a esse período, quando afirmou nunca ter visto uma preparação com tantos atrasos.
O governo brasileiro, chefiado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, assumiu em 2007 o compromisso de organizar a Copa do Mundo programada para sete anos depois.
Nada, ou quase nada, foi investido nos quatro anos seguintes. O trabalho ficou para a gestão da presidente Dilma Rousseff.
Só em janeiro de 2010, no começo do último ano de seu mandato, o presidente Lula instalou o comitê responsável pela organização do evento.
Ao mesmo tempo, anunciou a destinação de R$ 20 bilhões -- do Tesouro Nacional, do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Nessa altura, as estimativas iniciais de custos já estavam estouradas.
Em agosto do ano passado, estavam prontos seis dos estádios previstos e continuavam as obras em outros seis.
A projeção do investimento havia passado dos R$ 2,8 bilhões anunciados em 2007 para R$ 8 bilhões, com aumento de 285%.
O novo valor superava a soma das verbas aplicadas em 12 estádios alemães e em 10 sul-africanos (equivalentes a R$ 6,9 bilhões) para as Copas de 2006 e de 2010.
O planejamento deficiente e a má gestão produziram mais que o enorme atraso no início das obras. Elevaram custos, dificultaram o acompanhamento dos gastos e resultaram em várias irregularidades na elaboração e na execução dos projetos.
Em junho de 2011 o Tribunal de Contas da União (TCU) já reclamava da falta de informações claras e atualizadas sobre as obras de estádios, de mobilidade urbana, de portos e aeroportos e também de programas de segurança e vários outros de natureza organizacional. Em relatórios anteriores, o Tribunal já havia cobrado do Ministério do Esporte informações detalhadas para a montagem do cronograma das auditorias.
Naquela altura, meados de 2011, a Matriz de Responsabilidades da Copa indicava uma previsão de gastos de R$ 23,7 bilhões.
A projeção mais recente incluída no Portal da Transparência, do governo federal, indica investimentos de R$ 25,9 bilhões, provavelmente subestimada, segundo analistas.
Desse total, projetos no valor de R$ 17,2 bilhões foram contratados e apenas R$ 8,6 bilhões (33,2%) foram executados. Dos R$ 6,7 bilhões previstos para aeroportos, foi contratado R$ 1,8 bilhão e desembolsados R$ 899,6 milhões (13,3%). Dos R$ 7,9 bilhões estimados para mobilidade urbana, foram contratados R$ 6,3 bilhões e pagos (executados) R$ 2,6 bilhões (32,9%).
Para facilitar a contratação de obras, o Executivo foi autorizado pelo Congresso, em 2011, a adotar o Regime Diferenciado de Contratações, menos rigoroso que o sistema normal de licitações.
A exceção valeria, inicialmente, para contratos para as Copas das Confederações e do Mundo e para os Jogos Olímpicos. Mas a facilidade foi estendida a projetos do Programa de Aceleração do Crescimento e do Sistema Único de Saúde.
Apesar dessa flexibilidade, a maior parte das obras destinadas à Copa do Mundo continua com grande atraso e os custos finais serão com certeza bem maiores que os estimados inicialmente.
Talvez a Lei de Licitações tornasse um pouco mais lentas as contratações. Mas o problema real estava em outra parte -- na incompetência gerencial do governo.